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O que é o ensino artístico especializado?

Os cursos artísticos especializados são cursos de nível básico e/ou secundário que se destinam a alunos com vocação nesta área e que procuram desenvolver a suas aptidões ou talentos artísticos. Podem ser ministrados numa só escola ou em duas distintas. Destina-se a alunos que pretendem uma formação de excelência com o objetivo de exercer uma profissão numa área artística ou aceder ao ensino superior artístico. Há três domínios artísticos: artes visuais e audiovisuais (nível secundário), dança (básico – 1.º; 2.º e 3.º ciclos – e secundário) e música (nível básico – 1.º, 2.º e 3.º ciclos – e secundário).

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Quem ministra este ensino especializado?

Este ensino é ministrado por uma rede de escolas do ensino especializado da música e os alunos podem ir ter as aulas a essas escolas ou os professores dessas escolas vão dar aulas à escola onde o aluno frequenta o ensino regular. Numa das modalidades de ensino os alunos têm todas as aulas (de música e do regular) na escola especializada.

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Em que moldes podem os alunos frequentar este ensino especializado?

Há quatro regimes de frequência no ensino artístico especializado: o integrado, o articulado, a iniciação e o supletivo. Em regime integrado, são ministradas na mesma escola especializada as disciplinas do currículo regular e as componentes específicas da educação artística. Já no regime articulado, a escola especializada do ensino artístico oferece apenas as disciplinas das componentes específicas da educação artística, enquanto as disciplinas do currículo geral são da responsabilidade das escolas dos ensinos básico ou secundário. E, nesse caso, ou o aluno vai ter as aulas de educação artística a outra escola ou os professores dessa escola vão dar as aulas à escola de ensino geral. Tanto no caso do ensino articulado, como do integrado, os alunos do 5.º e do 6.º anos são dispensados de duas disciplinas do percurso regular: educação musical e educação tecnológica. O regime de iniciação aplica-se aos alunos do 1.º ciclo de ensino (um tempo de instrumento e dois tempos de formação musical). Já no supletivo os alunos frequentam as disciplinas de ensino artístico especializado da música numa escola de ensino artístico especializado da música, independentemente das habilitações que possuem. Ou seja, além do currículo normal, os alunos vão fazer o curso de música de forma complementar.

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As famílias pagam alguma coisa para os alunos frequentarem estas aulas?

No caso do ensino artístico integrado e do articulado, o Ministério da Educação e Ciência assegura o financiamento a 100% do custo a alunos, no caso dos conservatórios ou academias de música com quem estabeleceu contratos de patrocínio. Já nos regimes de iniciação e supletivo, as famílias contam com um apoio do Estado e assumem um co-pagamento. No caso dos regimes de iniciação de música, por exemplo, o Estado até aqui pagava, no caso das escolas com contrato de patrocínio, 550 euros por aluno, por ano, quando a disciplina de instrumento fosse dada a um ou dois alunos e pagava 350 euros quando o ensino do instrumento fosse ministrado a mais do que dois alunos ao mesmo tempo. Por sua vez, a escola poderia pedir até 550 ou até 350 euros às famílias de co-pagamento, respetivamente. Agora, com as novas regras, o Estado pagará sempre 350 euros independentemente do número de alunos em classe e às famílias pode ser pedido um valor até 700 euros se estas preferirem que os filhos tenham na mesma aulas sozinhos ou com mais outro aluno. Em classes maiores, a verba pedida aos pais passa para os 350 euros. No caso do ensino supletivo básico (2.º e 3.º ciclos), o Ministério da Educação comparticipa até 1.200 euros (até ao ano passado comparticipava até 1.750 euros) e às famílias pode ser pedido até 1.200 euros anuais, ou mais 20% para fazer face à quebra do financiamento do Estado.

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O Governo cortou no financiamento às escolas de ensino artístico especializado?

Em termos globais, não. Para os três anos abrangidos pelas candidaturas a financiamento [2015/16, 2016/17 e 2017/18] está disponível um montante global de 165 milhões de euros, ou seja, 55 milhões por ano, exatamente o mesmo valor que era suportado nos anos anteriores pelos fundos europeus e pelo Orçamento do Estado e que agora vem apenas do Orçamento do Estado. Entretanto, no dia 21 de setembro, e após protestos e uma reunião com as associações do setor, o Governo decidiu atribuir um reforço anual de quatro milhões de euros ao ensino artístico. Este ano, estas escolas e estes alunos contarão assim com um financiamento de 59 milhões de euros.

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Então afinal o que mudou no financiamento destes cursos?

Este ano as escolas privadas de ensino artístico do Norte, Centro e Alentejo com contrato de patrocínio assinado com o Estado — os contratos de patrocínio têm por fim estimular e apoiar o ensino em domínios não abrangidos ou restritamente abrangidos pelo ensino oficial, nomeadamente a criação de cursos com planos próprios e a inovação pedagógica — deixaram de ser financiadas por fundos europeus e passaram, à semelhança do que já acontecia antes de 2010 e do que sempre aconteceu com as escolas de Lisboa e Vale do Tejo e Algarve, a ser financiadas através de verbas do Orçamento do Estado. Além desta mudança, o Ministério da Educação e Ciência (MEC) uniformizou o valor pago por estudante, por ano, no ensino básico articulado: 2.600 euros para todos os colégios de norte a sul do país. É que estas academias andaram estes quatro anos com problemas de financiamento, pois o modelo de formação destas escolas não tinha muito a ver com o modelo desenvolvido e apoiado pelo Programa Operacional Potencial Humano (POPH). “O modelo de financiamento do POPH só financiava 36 semanas de aulas e, por exemplo, não era elegível despesa com pianistas que acompanhassem os alunos. Havia uma série de situações que são específicas e que não encaixavam nas regras do POPH” explicou João Correia, presidente da Associação Portuguesa de Instituições de Ensino de Música (Ensemble).

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Mas as escolas estão a receber mais ou menos dinheiro pelos alunos?

Aqui a resposta é: depende. Umas perderam verbas, outras ganharam. Tal como o Ministério de Nuno Crato já disse, e bem, “decorrente da mudança do modelo de financiamento para esta oferta educativa, registou-se um aumento do valor do custo/aluno face aos valores médios praticados com o anterior modelo nas escolas localizadas em regiões abrangidas por fundos comunitários, as quais representam mais de 85% dos alunos financiados”.

João Correia, presidente da Ensemble, disse ao Observador que os colégios do Norte, Centro e Alentejo estavam a receber, em média, 2.200 euros anuais por aluno nestes últimos quatro anos, através de fundos europeus. Mas nos conservatórios e academias de ensino artístico especializado de Lisboa, Vale do Tejo e Algarve, o valores suportados pelo Orçamento do Estado variavam entre os 2.400 e os 3.500 euros, pelo que houve escolas com cortes substanciais.

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E foi só o valor pago por aluno que foi ajustado?

Não. Além da uniformização do pagamento por aluno no básico articulado e na redução da comparticipação nas iniciações e nos supletivos (como se pode ler mais acima), o Ministério cortou no total de alunos financiados, precisamente para conseguir uniformizar os montantes pagos. “O número de vagas disponíveis comunidade intermunicipal a comunidade intermunicipal neste concurso era inferior ao número de alunos que existiam nas escolas no ano anterior. Percebemos isso com alguma facilidade em zonas onde só há uma escola ou duas ou três com este tipo de contratos”, afirmou João Pereira. Em 2014/15 mais de 27 mil alunos frequentavam uma das quatro modalidades de ensino artístico especializado.

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Quantos alunos vão ficar sem acesso a este ensino especializado?

O Ministério da Educação admitiu que “este esforço financeiro, em tal percentagem, implicou alguns ajustes no número de alunos abrangidos por contrato”, mas a Associação Portuguesa de Instituições de Ensino de Música (Ensemble) avança com números, falando numa quebra do número de alunos financiados na ordem dos 7.000 em todo o país, contando com todas as modalidades de ensino (exceto a do integrado, onde não houve cortes). A quebra mais acentuada verificou-se nas iniciações. Segundo os agentes do setor, como a Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (AEEP), os cortes nesta modalidade rondam os 70 a 80% face a 2014/15. João Pereira, da Ensemble, avança que se passou de 5.000 alunos apoiados para perto de 1.000. Já no ensino básico articulado a redução ronda os 13% e no básico supletivo anda perto dos 60%. No complementar supletivo (ensino secundário) o corte foi de cerca de 40% e apenas no complementar articulado (secundário) se registou um aumento de 40%. “Mas estamos a falar de um número reduzido: de 350 alunos passou para 500”, conclui João Pereira.

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Quais as consequências?

Além das consequências para os alunos, na medida em que as escolas particulares e cooperativas vão ter de deixar de fora muitos alunos para os quais não vão receber financiamento do Estado, será provável que algumas escolas despeçam docentes.

Para já, as escolas estão sem saber o que fazer. Disso mesmo deu conta ao Observador Fátima Nunes, da direção pedagógica da Academia Amadores de Música. “Tínhamos 143 alunos a frequentar o articulado no ano passado. Este ano temos financiamento para 125 e ainda não sabemos muito bem como vamos fazer, nem sabemos quando vamos começar as aulas. Temos a escola em jogo, os vencimentos em jogo.”

Já João Pereira, que dirige também a Academia de Música e Dança do Fundão, tem “55 alunos para entrar no 5.º ano de escolaridade, que corresponde ao número de alunos que saiu do 9.º ano e tenho apenas 24 financiados. Os que ficaram seriados nos primeiros 24 lugares na prova entram”. “Ou se reforça o financiamento deste tipo de ensino ou então não há milagres e o que vai acontecer é tirar de um lado para meter noutro. Não vai ser possível satisfazer toda a gente”, afirmou.

Para já as escolas aguardam os resultados definitivos do concurso, sendo que as aulas já tiveram início em alguns estabelecimentos de ensino e todas vão estar em marcha a partir de segunda-feira.

“O concurso tinha tudo para correr bem e correu mal”, afirma Rodrigo Queiroz e Melo, que preferia que se tivesse encontrado uma solução onde houvesse uma norma travão como a de “ninguém se poder candidatar a um financiamento superior ao que tinha tido no ano anterior”, ficando ao critério de cada colégio ou academia decidir quantos alunos seriam acompanhados.