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O que é a lei da cópia privada?

É uma exceção à lei do Direito de Autor. Explica-se do seguinte modo: é a lei que permite que se copie uma obra adquirida legalmente. Por exemplo, copiar a música de um CD original para um CD virgem para ouvir no carro. Esta exceção à lei só se aplica para uso privado. A lei da cópia privada foi atualizada pela última vez em 2004 e regula o disposto no artigo 82º do Código do Direito de Autor: compensação devida pela reprodução ou gravação de obras.

A lei da cópia privada é uma taxa que se aplica sobre os suportes onde é possível gravar conteúdos, tais como cassetes, CDs e DVDs virgens. A lei agora aprovada em Conselho de Ministros vem atualizar a lista destes suportes, passando a contemplar dispositivos modernos tais como os cartões de memória (usados p.ex. nas máquinas fotográficas), as pen USB, as memórias internas dos telemóveis e dos tablet, os computadores e até as caixas dos operadores de televisão por cabo, que possuem um disco rígido onde é possível gravar conteúdos para ver mais tarde.

Os valores da taxa atribuídos a cada dispositivo podem ser consultados neste artigo — aos quais acresce 23% de IVA. O armazenamento remoto “na nuvem” (cloud) não é contemplado, por ainda não existirem mecanismos de controlo.

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Qual é a justificação para esta lei?

Garantir verbas para os autores através das associações que os representam. Segundo a Sociedade Portuguesa de Autores (SPA), esta lei “garante a sobrevivência de obras e de criadores sem os quais os aparelhos de distribuição pouco ou nada teriam para difundir.”

Os associados são autores portugueses mas também muitos estrangeiros, filiados nas associações congéneres com as quais as entidades portuguesas têm protocolos de representação. Só a SPA tem 24 mil associados em Portugal e representa 3 milhões no mundo inteiro. Contudo, a forma exata como este dinheiro é distribuído não é clara — a SPA publicou entretanto um conjunto de perguntas e respostas sobre este assunto.

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E a lei tem alguma coisa a ver com a proteção contra a pirataria?

Não, a cópia ilegal de conteúdos é crime. Entenda-se por cópia ilegal (ou pirataria) toda a cópia que tenha como finalidade a utilização fora da esfera privada. Copiar para vender ou para disponibilizar na internet, por exemplo, continua a ser ilegal.

São muitas as referências que cruzam os termos “cópia privada” e “pirataria”. Para uns, a intenção é a de confundir a opinião pública. Para outros, serve para enfraquecer as posições dos que defendem a lei. Seja como for, a lei da cópia privada não se destina a “legalizar a pirataria” nem tão pouco a servir de compensação por essa possibilidade.

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Então para que serve esta lei?

A taxa que resulta desta atualização da lei será aplicada com base do princípio da compensação equitativa, ou seja, todos os utilizadores-compradores contribuirão para colmatar a “possibilidade de copiar documentos autorais” e, dessa forma, compensar os autores.

O secretário de Estado da Cultura afirma que “não é possível saber pessoa a pessoa o que é que cada um copia”, respondendo às críticas sobre o facto de quem compra uma obra ter de pagar uma taxa para cobrir a hipótese de vir a copiar esse mesmo conteúdo que adquiriu.

Na prática, a aplicação da lei resulta num proveito que pode chegar aos 15 milhões de euros, valor que será distribuído pelos associados dos representantes dos autores.

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E o que é que os artistas pensam desta lei?

As opiniões dividem-se. São públicas as posições de vários artistas e já aqui demos o exemplos de dois: Tim, vocalista dos Xutos & Pontapés é a favor e Zé Pedro, o guitarrista, manifestamente contra.

Tim afirma que “o que está em causa é a possibilidade que a cópia tem de ser armazenada e vendida ou passada a terceiros. Se é possível e mau, vai acontecer (outra lei, esta de Murphy)” e ainda que “a partilha de ficheiros é global e é corrente, não vale a pena esconder o sol com a peneira nem mentir, mais vale assumir e regulamentar.”

Zé Pedro considera a lei “ridícula, abusiva e penalizadora”. O músico esclarece: “Eu compro música na internet e portanto tenho de levá-la numa Pen, CD ou disco externo, não tenho de pagar outra vez por isso.”

Contudo, a maioria dos autores mantém-se em silêncio. Em 2012, aquando da primeira proposta de atualização desta lei (houve outra em 2013), foi levantada a polémica sobre um abaixo-assinado em que, alegadamente, o nome de alguns autores terá sido incluído sem a sua permissão.

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Então quem está a favor?

As associações que representam os autores, tais como a SPA, a AGECOP, a APEL ou a Visapress. Em resumo, todas as entidades que beneficiam com a aplicação da taxa.

Sobre a ida da lei da cópia privada a Conselho de Ministros, o presidente da AGECOP (Associação para a Gestão da Cópia Privada) João David Nunes disse ao Observador que “já não era sem tempo, a lei atual está completamente desatualizada. O mercado evoluiu e a lei não e isso precisa de ser corrigido.” As receitas caíram 90% em oito anos e isso leva a que, em termos práticos, a Associação tenha atualmente para distribuir pelos seus milhares de associados apenas 300 mil euros — a Sociedade Portuguesa de Autores (que preside à direção da AGECOP) tem cerca de 24 mil associados em Portugal e representa 3 milhões no mundo inteiro — entre autores, intérpretes, produtores, órgãos de comunicação social, etc.

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E quem está contra?

As associações de defesa do consumidor como por exemplo a DECO, as associações que representam a indústria — Associação Empresarial dos Setores Elétrico, Eletrodoméstico, Fotográfico e Eletrónico (Agefe) — e a sociedade civil.

O Observador falou com Maria João Nogueira que considera muito importante o papel interventivo da sociedade nos dois adiamentos anteriores (2012 e 2013), nomeadamente através dos blogues e das redes sociais — em especial o Twitter — na pressão política. “Em 2012, quando nos apercebemos [o conjunto de pessoas que se interessou por isto] começámos a chatear os políticos nas redes sociais. A comunicação social quase deixou passar, mas conseguimos passar a mensagem.”

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Em que ponto está a aprovação da lei?

A lei foi aprovada em Conselho de Ministros e segue para a Assembleia da República onde será discutida pelos grupos parlamentares, que aprovarão (ou não) a lei de modo a produzir um diploma legal.

São conhecidas as divergências políticas entre os diferentes partidos e mesmo entre os diferentes deputados que deles fazem parte. Se, por um lado, o ministro da Economia é contra a lei (porque sobrecarrega os consumidores), o secretário de Estado da Cultura é favorável ao encaixe financeiro daí resultante.

Depois, há as questões de princípio: os deputados são também consumidores ativos e alguns acham a lei injusta. Ainda não se sabe se vai ser aplicada disciplina de voto quando o assunto for a votação, mas até esse momento a discussão promete continuar.  O PCP estava a favor, o CDS contra, o Bloco tinha reservas e PS e PSD estavam muito divididos — no passado o assunto já tinha sido levado a plenário pela mão dos socialistas que, confrontados com a falta de apoios, retiraram o projeto sem o submeter a votação.

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A que é que ainda não respondemos?

Se tiver alguma dúvida, coloque: responderemos o melhor que soubermos.