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O que são os testes de stress à banca europeia?

Trata-se de um exercício que está a ser realizado pela Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla original) e que, tal como o que foi feito em anos anteriores, procura simular o impacto que teria para a robustez dos bancos europeus um conjunto de cenários de crise económica e financeira. A EBA, um regulador europeu para o setor criado em 2011, vai sujeitar ao exercício 123 bancos de 22 países europeus, uma amostra que representa sempre um mínimo de 50% do setor financeiro de cada país. O objetivo, diz a EBA, é o de “ajudar os supervisores a avaliar a resiliência das instituições financeiras da União Europeia a cenários adversos” nos mercados e na economia.

No cenário mais adverso, simula-se, por exemplo, que o produto interno bruto (PIB) na União Europeia desce 0,7% em 2014 e 1,5% em 2015, subindo apenas 0,1% em 2016, uma evolução muito mais negativa do que o “cenário base” previsto nesta fase pelas autoridades e pelos próprios bancos. É também simulado o impacto de uma taxa de desemprego mais elevada do que aquela que é atualmente prevista e também outros riscos como uma crise no mercado imobiliário.

No caso da banca portuguesa, o cenário adverso testado pelas autoridades prevê que o PIB desça 0,8% em 2014, 2,3% em 2015 e 1,1% em 2016. Ao mesmo tempo, é testado o impacto que teria um aumento (em simultâneo) dos juros da dívida soberana a 10 anos para mais de 7% ao longo dos próximos dois anos e uma subida da taxa de desemprego para 18,2% em 2015 e 17,3% em 2016.

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Testes de stress são o mesmo que o exame do BCE à qualidade dos ativos da banca?

Não, ainda que sejam divulgados no mesmo dia, 26 de outubro de 2014. Os testes de stress à banca europeia são responsabilidade da EBA, mas terão a cooperação do BCE, que contribuirá com as conclusões da avaliação à qualidade dos ativos (AQR, na sigla original de “asset quality review“) que está a realizar desde novembro de 2013. A AQR é uma análise detalhada aos balanços dos 130 maiores bancos da zona euro que ocupou cerca de seis mil supervisores e auditores, com o BCE a trabalhar em conjunto com as autoridades nacionais, como o Banco de Portugal.

Tratando-se de exercícios distintos – a AQR é uma “fotografia” aos balanços atuais dos bancos e o teste de stress é uma simulação de como os bancos resistiriam a um agravamento hipotético da economia no futuro –, no seu conjunto formam a “avaliação completa” (“comprehensive assessment“) que o BCE está a levar a cabo antes de assumir, finalmente, a supervisão dos maiores bancos da região.

Um dado importante é que esta “fotografia” aos balanços dos bancos, que vai servir de base aos testes de stress, foi tirada a 31 de dezembro de 2013. Desde então, muitos bancos têm tomado várias iniciativas para reforçar os capitais próprios, como aumentos de capital e vendas de ativos.

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Que bancos portugueses vão ser testados?

Serão incluídos nos testes de stress e na avaliação à qualidade dos ativos três bancos nacionais: a Caixa Geral de Depósitos (CGD), o Banco Comercial Português (BCP) e o Banco BPI. A apresentação dos dados sobre o Novo Banco foi adiada, pelo que a instituição deixou de contar nas listas.

A 10 de outubro, o BCE justificou a decisão de adiar a informação sobre esta instituição em particular: “como a instituição [Novo Banco] foi amplamente reestruturada, os constrangimentos de ‘timing‘ [calendário] não permitem que a ‘comprehensive assessment‘ seja concluída para publicação a 26 de outubro”.

Nem a EBA nem o BCE indicaram novas datas para a publicação da análise do Novo Banco.

Pode encontrar aqui a lista atualizada das instituições sujeitas aos testes de stress.

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O que vamos ficar a saber sobre os bancos europeus?

O teste de stress foi concebido para dar aos supervisores, responsáveis políticos e investidores um conjunto de dados padronizados que permitam comparar a resistência de cada banco europeu num cenário de dificuldades. Em termos simples, será possível saber até que ponto cada banco tem capitais próprios suficientes para se manter solvente em caso de perdas inesperadas resultantes de uma quebra inesperada na economia ou novas tensões nos mercados financeiros.

Serão testados três aspetos principais: posição de capital, exposição ao risco e exposição à dívida soberana. “O nível de transparência oferecido pelo teste de stress vai permitir aos participantes do mercado ver, por eles próprios, o grau de vulnerabilidade dos bancos europeus a dificuldades, bem como os mecanismos de resposta previstos pelos supervisores”, afirma a EBA em comunicado emitido em abril.

Tirando partido dos dados reunidos pelo BCE na avaliação à qualidade dos ativos (AQR), será também possível ter uma noção dos níveis de aprovisionamento dos bancos – isto é, quanto dinheiro têm colocado de parte para fazer face a eventuais perdas no crédito –, bem como indicadores acerca da sua exposição a diferentes ativos, como títulos de dívida pública.

A avaliação à qualidade dos ativos, que sai ao mesmo tempo, terá resultados individuais para cada banco e também a apreciação geral do BCE para o setor financeiro.

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O que é preciso para passar nos testes de stress?

A EBA definiu como patamar mínimo para a “nota positiva” nos testes de stress um rácio “core Tier 1″ de 8% no cenário base e de 5,5% no cenário mais adverso. O que significa este rácio? O “core Tier 1″ mede a quantidade de capital da mais alta qualidade de que o banco dispõe face ao valor dos seus ativos ponderados pelo risco. Em termos mais simples, é a “almofada” de ativos plenamente líquidos – ou seja, que o banco pode vender rapidamente em caso de necessidade –, sobretudo ações e dívida, para suprir perdas com as atividades mais arriscadas do banco, como a concessão de alguns tipos de crédito e outros investimentos.

O regulador sublinha, contudo, que “mais do que ser um exercício de passar ou chumbar, o objetivo do teste de stress é apoiar a monitorização e reparação contínua dos balanços dos bancos da União Europeia”. E, neste âmbito, “o trabalho de antecipação que alguns bancos já realizaram antes do teste de stress já é, em si, um resultado positivo”, diz a EBA, numa referência aos aumentos de capital que muitos bancos europeus realizaram nos últimos meses.

Um relatório da consultora Linklaters nota que os bancos europeus têm vindo a reforçar os capitais em antecipação a este exercício, tal como aconteceu nas vésperas dos testes de stress de 2011. Mas isso está a acontecer de forma muito mais intensa, diz a Linklaters, calculando que os bancos emitiram 35% mais capital este ano do que antes dos testes de stress de 2011, os últimos que foram realizados.

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Como vão sair-se os bancos (em Portugal e lá fora)?

O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, mostrou-se, em finais de junho, confiante nos resultados dos bancos portugueses na análise do BCE à qualidade dos ativos e no teste de stress. “Não significa que não possa haver algumas diferenças de cálculos, mas tudo o que está a ser feito, por exemplo, com a capitalização pública e privada, garante que estamos a caminhar para uma situação de estabilidade financeira”, afirmou o governador do Banco de Portugal. Carlos Costa destacou, nessa altura, o “trabalho intenso” que tem vindo a ser feito pelo Banco de Portugal nesta área, “em colaboração com os bancos”.

No início de setembro, o Goldman Sachs fez uma sondagem junto de 125 investidores institucionais e concluiu que, em média, estes apontam para que haja um total de dez bancos a chumbar quando sujeitos ao cenário adverso previsto nos testes de stress. Nesse grupo, segundo o Jornal de Negócios, estava o Banco Comercial Português (BCP) como um dos bancos em que os investidores veem risco de chumbo.

Os investidores consultados pelo Goldman apontaram, também, para que os bancos europeus que chumbarem nos testes de stress tenham de reforçar os capitais próprios num total de 51 milhões de euros.

Já a agência Fitch indicou na segunda-feira, 13 de outubro, que “apenas uma pequena minoria” dos bancos irá falhar os testes de stress. E, dentro destes chumbos, vários ficarão a dever-se a falhas técnicas, porque grande parte da falta de capital “já foi resolvida” em 2014, diz a agência de “rating“. Recorde-se que a “fotografia” tirada aos ativos dos bancos diz respeito ao final do ano passado.

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Um chumbo? E agora?

Os bancos que, quando sujeitos aos cenários testados pela EBA e pelo BCE, não corresponderem aos rácios mínimos terão, num máximo de “duas semanas após a divulgação dos resultados, de entregar planos de capitalização a indicar detalhadamente como as insuficiências serão cobertas nos seis a nove meses subsequentes”, diz o BCE. Nove meses se a insuficiência for detetada com a sujeição do banco ao cenário adverso e seis meses caso o banco tenha sentido dificuldades perante o cenário base testado no exercício.

Aqui, o papel da EBA é menor. Havendo chumbos, “as autoridades competentes nacionais e, no caso dos bancos da zona euro, o BCE, são responsáveis por assegurar a qualidade e, portanto, de validar os resultados dos bancos”. Isto para, “no final, determinar e promover qualquer decisão de supervisão necessária”.

Na prática, os bancos terão de apresentar um plano de recapitalização que pode incluir a venda de ativos ou aumentos de capital junto de investidores privados ou de Estados.

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Os testes vão ser (desta vez) um exercício credível?

Esta é a grande questão que está na cabeça de investidores, autoridades e dos próprios bancos. As edições anteriores dos testes de stress, em 2010 e 2011, não foram vistas como exercícios credíveis. Em parte porque vários bancos tiveram “nota” positiva e, dali a meses, tiveram de ser resgatados. Aconteceu na Irlanda, por exemplo, onde alguns bancos não só tiveram de pedir assistência estatal como esses empréstimos levaram a um pedido de resgate por parte do próprio Estado.

A expectativa em torno dos testes de stress de 2014 é maior devido ao facto de serem um passo crucial para que o BCE assuma o papel de principal supervisor da banca europeia, o que acontece no início de novembro. A credibilidade é um fator crucial não só pelas implicações para a reputação do BCE no momento em que assume as novas responsabilidades, mas, também, porque a instituição tem a expectativa de que um exercício credível e transparente aumentará a confiança entre os bancos e estimulará a concessão de crédito na zona euro. Por essa via, os testes de stress podem ser uma ferramenta para dinamizar o crescimento económico e amenizar os receios relacionados com a inflação baixa ou, mesmo, o risco de deflação.

E será necessário que haja chumbos para que o exercício seja visto como credível? A responsável pelo Mecanismo Único de Supervisão, o supervisor que reúne o BCE e os bancos centrais nacionais, Danièle Nouy, acredita que sim. “O presidente do BCE já disse que essa é, de facto, uma condição [para a credibilidade dos testes de stress], portanto concordaria com ele”, afirmou a responsável em entrevista ao Financial Times, em fevereiro. “Parece que é exatamente isso que os mercados esperam [que haja chumbos] de um exercício como este, portanto será esse o caso, provavelmente”, afirmou a responsável, acrescentando que “temos de admitir que alguns bancos não têm futuro”.

E quantos chumbos pode haver? “Não faço ideia de quantos bancos irão chumbar, o que sei é que temos de assegurar o máximo de qualidade”, notou, também, Danièle Nouy.

Para já, pelo menos a agência Fitch parece estar convencida de que os testes de stress “parecem ser suficientemente robustos para estimular a confiança dos consumidores”. Em nota divulgada em abril, a agência de “rating” acredita que o exercício é exigente e que, portanto, será visto pelo mercado como credível.