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Porque é que vai ser criada uma União Bancária?

O principal objetivo da União Bancária é o de quebrar o ciclo vicioso de ligação entre bancos e Estados soberanos, o chamado ‘Doom Loop’. A crise na zona euro veio demonstrar que a ligação entre bancos frágeis e Estados com contas públicas desequilibradas expõe os bancos a grandes perdas com a dívida pública que têm nos seus balanços, o que, por sua vez, cria problemas maiores nas finanças públicas caso os bancos precisem de capitais públicos para sobreviverem.

Em Portugal, o BPN foi nacionalizado, mas o BCP, BPI e Banif acabaram, também, por necessitar de apoio do Estado. Mas não foi só em Portugal que estas questões se colocaram. Em muitos países da zona euro, incluindo nas maiores economias, foi preciso resgatar bancos.

Tendo isto presente, e a necessidade de garantir financiamento em condições aceitáveis às economias, os decisores políticos decidiram que era preciso criar regras para garantir a estabilidade do sistema financeiro e, principalmente, devolver-lhe confiança.

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Como vai funcionar?

Em linhas gerais, a União Bancária assenta em três pilares ou alicerces: supervisão única, novas regras de resolução de bancos e a garantia comum dos depositantes. Para isto, foi criado o Mecanismo Único de Supervisão (em inglês “Single Supervisory Mechanism-SSM“) e um mecanismo único de resolução (em inglês “Single Resolution Mechanism-SRM“). Está nos planos, também, um mecanismo único de garantia de depósitos.

O mecanismo único de supervisão já foi criado, e entra em pleno funcionamento a 4 de novembro, e o mecanismo de resolução já foi aprovado. A discussão do esquema de garantia de depósitos ainda está por se fazer e anteveem-se dificuldades nas negociações com alguns Estados-membros, nomeadamente a Alemanha.

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O que é o mecanismo único de supervisão?

O plano inicial era, também, o de que o BCE tivesse a supervisão direta de mais de seis mil bancos. Mas as negociações, especialmente com os supervisores alemães, acabaram por reduzir este lote a cerca de 130, que são os bancos com mais de 30 mil milhões de euros de ativos no seu balanço ou cujos ativos correspondam a cerca de 20% do PIB.

Assim, no lote ficam os maiores bancos franceses, que queriam aderir para dar garantia de estabilidade ao seu sistema financeiro, e de fora os bancos regionais alemães, que a Alemanha queria que ficassem apenas sob sua supervisão direta, pelas alegadas especificidades com que o Bundesbank teria maior capacidade para lidar.

A partir de Frankfurt, e em estreita colaboração com os bancos centrais, como o Banco de Portugal, o BCE passa a ter capacidade de intervenção direta nos bancos. As autoridades nacionais continuam a fazer a supervisão dos bancos mais pequenos, mas o BCE pode intervir em qualquer altura. Por outro lado, os bancos centrais nacionais terão, também, a responsabilidade de implementar as medidas decididas pelo supervisor europeu.

O processo de transição para o mecanismo único de supervisão começou em novembro de 2013 e culmina em novembro de 2014, com o BCE a assumir finalmente a supervisão direta destes bancos.

Para isto, o BCE passou a pente fino a qualidade dos ativos nos balanços dos bancos. A avaliação à qualidade dos ativos (AQR, na sigla inglesa), cujos resultados foram divulgados a 26 de outubro, pretendeu aumentar a transparência da exposição dos bancos, incluindo saber se os ativos e os colaterais (ativos usados pelos bancos como garantias nos empréstimos que pedem) estão devidamente avaliados e se estão feitas as provisões necessárias em caso de problemas.

Depois de analisados os balanços dos bancos, o BCE fez testes de “stress” aos bancos, que revelaram que um total de 25 bancos na zona euro não conservariam os rácios mínimos exigidos num caso de crise grave. Ainda assim, mais de metade desses bancos já tomaram, este ano, medidas de reforço de capital, como é o caso do BCP. É que os dados que serviram de base aos testes de stress eram relativos a 31 de dezembro de 2013.

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Como posso ter a certeza que o BCE irá manter o dinheiro dos europeus seguro?

Certezas nunca existem, mas a ideia é a de que a supervisão direta dos bancos seja mais apertada, mais harmonizada entre os vários países europeus, e que o supervisor máximo, que será o BCE, tenha mais poderes, entre eles o de exigir que os bancos mantenham mais capital como rede de segurança em caso de problemas. O BCE terá, também, capacidade de conceder e revogar licenças bancárias, essenciais para os bancos poderem operar como bancos, e sancionar os que não cumprirem as regras.

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Porque foi escolhido o BCE para controlar a supervisão na União Bancária?

Originalmente, a ideia passava por ser a Autoridade Bancária Europeia (EBA, sigla em inglês) a fazer a supervisão. No entanto, problemas de credibilidade surgiram após os primeiros testes de “stress”, como a necessidade de o franco-belga Dexia de recorrer a apoio estatal e de o espanhol Bankia revelar perdas de mais de três mil milhões de euros. Para dar credibilidade ao mecanismo, os decisores políticos decidiram dar esta tarefa ao Banco Central Europeu.

O BCE goza, também, de uma reputação de independência entre os agentes de mercado, que permite que as suas avaliações sejam tomadas em conta e, assim, contribuir de forma decisiva para a estabilidade do sistema.

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E quem vai supervisionar o supervisor?

O BCE está obrigado a apresentar relatórios regulares ao Parlamento Europeu, à Comissão Europeia, ao Conselho da União Europeia, ao Eurogrupo, e aos parlamentos nacionais dos Estados-membros participantes. A sua supervisão vai ser auditada pelo Tribunal de Contas Europeu e legalmente será controlado pelo Tribunal de Justiça Europeu.

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O que é o mecanismo de resolução de bancos?

É através deste mecanismo que se poderão reestruturar os bancos com problemas ou fazer com que a sua falência seja ordenada, de modo a evitar/minimizar os efeitos da sua falência, seja no sistema financeiro, seja o contágio à economia real.

Um dos grandes problemas que a crise revelou foi a incapacidade de muitos países de conseguirem lidar com a falência de bancos ou com problemas em bancos de grande dimensão.

Depois de muito trabalho, foram implementadas regras para reestruturar e/ou fechar bancos. Entre as novas regras está a criação de fundos nacionais, para os quais serão os bancos a contribuir, para financiar as falências de instituições financeiras. A ideia é a de evitar que sejam sempre os contribuintes a serem chamados a pagar a fatura das crises na banca. Agora, em primeira instância, serão os acionistas e os credores a assumir essa responsabilidade, o chamado “bail-in”.

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E o mecanismo único de garantia de depósitos?

O esquema de garantia de depósitos comum, como estava previsto na ideia original, passaria também por um fundo de depósitos como existe a nível nacional (que garante até 100 mil euros em depósitos em caso de falência de um banco), mas comum a todos os países que fazem parte da União Bancária.

Como em todas as outras pernas, a Alemanha já colocou problemas à ideia original e se vier a avançar arrisca-se a ficar coxa. O problema, para a Alemanha, está em garantir que os contribuintes germânicos não andam a pagar problemas de outros países.

Antes da crise, apenas os primeiros 25 mil euros em depósitos em cada conta estavam protegidos pelos Estados europeus. No entanto, em 2008, a Irlanda decidiu estender essa garantia a todos os depósitos nos bancos irlandeses. Os restantes países da zona euro viram-se forçados a seguir um caminho semelhante, decidindo então aumentar esta garantia para 100 mil euros.

A garantia até 100 mil euros não era suposto ser permanente, mas acabou por se tornar em alguns países. Em abril, o Parlamento Europeu aprovou a extensão desta garantia para todos os países. A responsabilidade de criar o terceiro pilar da União Bancária vai ser do próximo Parlamento Europeu, que sairá das eleições de 25 de maio.

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Quais são os próximos passos da União Bancária?

  • Novembro de 2014 O Banco Central Europeu assume a supervisão direta dos maiores bancos a zona euro e a supervisão indireta de mais de seis mil outros bancos.
  • Janeiro de 2015 Recuperação bancária e sistema de resolução começam a ser aplicados, com exceção para as provisões para o “bail in”.
  • Maio/Junho 2015 Sistema de garantia de depósitos começa a funcionar
  • Janeiro de 2016 Directivas de resolução de bancos- “bail-in” entra em vigor de forma plena.
  • Maio 2016 Os detalhes sobre as contribuições dos bancos e os prazos de pagamento da garantia de depósitos que fazem parte do mecanismo único de garantia de depósitos começa a aplicar-se naqueles países que optaram por um ritmo mais lento.
  • 2024 (oito anos depois do início) O fundo de resolução único fica totalmente capitalizado com 55 mil milhões de euros.