Já explicámos aqui e aqui as diferenças entre os registos de efeitos secundários feitos em plataformas de acesso a qualquer utilizador e o número de efeitos secundários confirmados pelas autoridades de saúde internacionais, associados à administração de vacinas contra a Covid-19. Ainda assim, continuam a ser várias as publicações que usam esse tipo de dados para espalhar desinformação sobre as vacinas desenvolvidas para tentar debelar a pandemia.
Desta feita, a ligação é para uma página dos America’s Front Line Doctors, já por várias vezes alvo de fact check internacionalmente e apontada como fonte de desinformação sobre a Covid-19 e, cada vez mais, sobre as vacinas criadas para enfrentar a doença causada pelo Sars-Cov2. A MedPage Today já alertou de mais de uma ocasião para o perigo da multiplicação de partilhas da página America’s Front Line Doctors, mas ainda assim a página continua ativa e a produzir conteúdo capaz de iludir quem o lê.
No caso em análise, o texto refere que o número de efeitos secundários registados já seria suficiente para que a administração de vacinas tivesse sido suspensa. O problema, como já esclareceram os fact checks enunciados, é que o facto de terem sido reportados efeitos secundários nas plataformas disponíveis não significa que se trate efetivamente de efeitos causados pelas vacinas. Cada um dos efeitos secundários registados exige maior estudo e avaliação das autoridades de saúde até que se prove que a origem do efeito registado foi a inoculação com qualquer uma das vacinas contra a Covid-19 disponíveis no mercado.
Em Portugal, por exemplo,de acordo com o último relatório da Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, citado pela agência Lusa, até final de maio foram notificadas 6.995 reações adversas, a maior parte (68,3%) referentes à vacina da Pfizer/BioNtech, com 4.782 casos, seguindo-se a da AstraZeneca (Vaxzevria), com 1.509, a da Moderna, com 387, e a da Janssen com 17 casos.
O Infarmed sublinhou, contudo, que “a notificação no âmbito do Sistema Nacional de Farmacovigilância não pressupõe necessariamente a existência de uma relação causal com a vacina administrada” e que a vacinação contra a Covid-19 “é a intervenção de saúde pública mais efetiva para reduzir o número de casos de doença grave e morte originados por esta pandemia”.
O sistema utilizado pelo Infarmed é o mesmo do VAERS, que é a fonte para os dados no artigo do America’s Front Line Doctors. Criado nos Estados Unidos em 1990 para detetar eventuais problemas de segurança relacionados com vacinas aprovadas no país, qualquer pessoa pode enviar uma notificação para o VAERS, mesmo não sendo o doente afetado. É necessário todo um trabalho posterior de análise dos eventos reportados nas várias plataformas até que seja claro que o efeito resultou da inoculação com determinada vacina.
Conclusão
É impossível afirmar que os efeitos secundários reportados no VAERS — ou qualquer outro sistema que funcione tendo por base informações dadas pelos utilizadores — são resultado da administração de vacinas contra a Covid-19. Só com um estudo posterior, feito pelas autoridades de saúde dos vários países, será possível analisar todos os dados reportados através desses portais. Não é, portanto, verdade que o número de reações adversas registadas justificasse a suspensão imediata da inoculação com vacinas contra a Covid-19 em seres humanos.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.