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Domingo, 11 de abril
15h |
Aterro em Pemba e vou diretamente ter com o padre português Ricardo Marques, com quem tinha combinado encontro na véspera. Recebe-me com um aperto de mão, a que anuí por simpatia, mas sentindo que estava a fazer algo de muito errado: não dava um passou-bem há mais de um ano, desde que começou a pandemia. Não podia ter escolhido melhor anfitrião para começar: o missionário português está por cá há seis anos, viveu a chegada dos deslocados desde o início, montou uma rede de voluntários que prestam apoio psicossocial pelos bairros a quem chegou do norte, acompanhou o agudizar da tensão entre o ex-bispo de Pemba, D. Luiz Lisboa, e o governo moçambicano por causa das denúncias internacionais sobre a crise em Cabo Delgado. As igrejas estão fechadas em Moçambique por causa do vírus, mas abre-a para mostrar como teve ali 900 pessoas a dormir em esteiras no chão quando o ciclone Kenneth abalou a região, em 2019. |
18h
Depois da chuvada que caiu durante a tarde, as estradas foram transformadas numa pista para uma espécie de safari aquático. O fotógrafo local que trabalha comigo nestes primeiros dias sobe passeios e entra em contra-mão para evitar as poças gigantes, de onde o carro dificilmente sairia. Parámos para abastecer de combustível, mas o pequeno utilitário nunca mais ficava atestado. Até que o funcionário lá avisou que o depósito devia estar roto. Do outro lado, havia clientes a usar garrafas de plástico para aproveitar o combustível que saía da viatura. |
Segunda, 12 de Abril
8h20 |
Tudo faz impressão no pavilhão gimnodesportivo que acolhe duas centenas de deslocados: a chuva que inudou o recinto durante a noite (falta acabar o teto do edifício), obrigando toda a gente a dormir nas bancadas; a fila das crianças para tomar a papa do pequeno almoço; e, claro, as histórias dramáticas de quem fugiu com a roupa que tinha no corpo e deixou tudo para trás, por medo. Não estava à espera nesta circunstância da naturalidade com que o professor primário me referiu a sua condição de polígamo, logo no início da sua descrição sobre a fuga de Palma. Lá, tinha as duas famílias em bairros afastados. Em Pemba, tem as duas mulheres e respetivos filhos em cantos opostos do pavilhão. |
13h10
Conversa muito dura com o psicólogo Lourenço Julião, no hospital de Pemba, sobre os traumas provocados pelos insurgentes na população. Fala disto com uma intensidade, uma mágoa e uma ira, que é como se acumulasse dentro de si todas as experiências terríveis por que passaram as vítimas com quem tem feito terapia. E alerta para o poder paralisador da incerteza: “Se perguntarem à população de Pemba se têm ou não projetos, pouca gente que vai dizer que está a continuar com projetos. Para quê continuar com obras ou construções, se não conheço o futuro com essas ameaças?”. |
Terça, 13 de Abril
10h20 |
Há um forte sentido de família que leva muita gente em Pemba a acolher familiares deslocados. Há casas onde estão a viver 40 pessoas. Na verdade, não vivem dentro das casas, instalam-se no exterior à volta, a dormir em esteiras no chão, cobertos por lonas por causa da chuva. E sim, a maioria são crianças. |
19h30
Amanhece e anoitece muito cedo. A partir das 17h cai o sol. Depois das 13h, é proibido comprar uma cerveja no supermercado. Os restaurantes estão abertos, mas a cozinha fecha às 19h30 (sem exceções). E o recolher obrigatório vigora a partir das 22h00. |
Quarta, 14 de Abril
11h00 |
Uma hora a caminhar à chuva por vielas estreitas, pontes sem corrimões, sempre a fintar poças e a mergulhar os pés na lama, num bairro onde vivem milhares de pessoas em condições muito difíceis e onde não entra um carro. Fui guiado por dois jovens da paróquia, que me levaram a conhecer uma vítima dos insurgentes, cuja história há-de ser publicada aqui no Observador nos próximos dias. |
14h05
Chego meia hora antes do combinado ao Lar da Esperança, que acolhe os miúdos que fugiram sozinhos de Mocimboa da Praia e de Palma. Fico à porta a fazer tempo, mas o coordenador vem-me buscar. Se tivesse chegado ainda mais cedo, teria testemunhado o momento em que a família se reuniu com três rapazes de Palma, que estiveram três semanas sem saber se a mãe estava viva e vice-versa. |
20h00
Paulo Lima, um português a jantar no mesmo restaurante, funcionário da Gabriel Couto destacado para o complexo de Afungi, conta que à hora a que ocorreu o ataque em Palma costumava ir aos bancos que vimos nas imagens que foram completamente destruídos, pelo que teria sido perfeitamente possível ser apanhado no meio dos tiros. Naquele dia só não foi a Palma, porque estava obrigado a cumprir uma quarentena, pelo que de certa forma sente que foi a Covid-19 que o livrou deste perigo. |
Quinta, 15 de Abril
7h45 |
Pequenas regras que só se aprendem aqui: Não se entra num bairro para fazer reportagem sem falar com o chefe do bairro (que responde diretamente ao presidente da câmara). Se o chefe do bairro não está no gabinete, espera-se que chegue ou procura-se autorização do seu número 2. |
14h00
Depois de lhe ter pedido uma audiência, a diretora do departamento de ação social autoriza a técnica que acompanhou o caso dos três rapazes de Palma a falar comigo e a pôr-me em contacto com a família, para ajudar a contar esta história. Vou ter com Albertina Bonifácio, faço-lhe uma entrevista e no fim pergunto-lhe se tem hipótese de me levar a visitar a família. A técnica hesitou, mas lá acedeu. Fez toda a diferença. Nunca ia encontrar a casa. E mesmo que encontrasse, não ia conseguir comunicar com a família. Só a mãe fala português. E não me percebeu, por culpa minha: atendeu o telefone a partir de Palma e eu achei que devia falar mais depressa. Albertina percebeu que não estava a resultar, pegou no telefone em alta voz e justificou: “Ele é português de Portugal”. Lá nos conseguimos entender a seguir, falando mais devagar. |
22h00
Um jornalista e uma analista publicam quase em simultâneo nas redes sociais que Mueda está a ser atacada e há vídeos horríveis de corpos esventrados nas ruas, que não partilham. As comunicações com Mueda estão cortadas, o que impede os familiares de confirmarem se estão bem, e credibiliza a hipótese de um ataque que tenha envolvido a destruição da rede de comunicações. Mueda é a sede do maior quartel militar em Cabo Delgado e é também o distrito em que nasceu o presidente Filipe Nyusi. Depois de grande nervosismo, visível nas redes sociais, o próprio jornalista que tinha anunciado o incidente publicou novo post a indicar que o administrador de distrito desmentia qualquer ataque na vila. E que a rede de comunicações estava em baixo devido a uma avaria na antena comunicada pela Movitel. Deu a entender que tinha sido enganado por uma fonte e pediu desculpa. |
Sexta, 16 de abril
18h |
Sinais de algum nervosismo em Pemba, com a circulação de rumores (não confirmados) de que chefes de bairro estariam a aconselhar os residentes a deixar a zona, ou de que a circulação de táxi-motas tinha sido interditada a partir de uma certa hora por ter sido alegadamente intercetado um condutor com armas. Independentemente dos avanços e recuos do ponto de vista militar, o medo anda por aqui — e não será fácil eliminá-lo. |
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Relatório Costa Pinto
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O Observador revela em exclusivo o conteúdo do "Relatório Costa Pinto", escrito pela comissão que apontou as falhas no BES. Documento defende que o Banco de Portugal podia ter feito mais e melhor.
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Relatório Costa Pinto
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Como o relatório secreto do Banco de Portugal conta a história dos avanços, recuos e desconfianças do Banco de Portugal, que nunca aceitou uma garantia angolana para cobrir o risco do BES Angola.
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Banco de Portugal
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Foi concluído há seis anos. Pedido em todos os inquéritos parlamentares à banca, mas sempre recusado até este ano. O relatório Costa Pinto era "secreto" até dentro do Banco de Portugal.
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Operação Marquês
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Ivo Rosa fundamentou prescrição dos crimes de corrupção com um polémico acórdão do Constitucional que a Relação de Lisboa não é obrigada a seguir. Fiscalistas em choque com definição de fraude fiscal.
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Vichyssoise
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Deputado do PS não tem dúvidas: caso "envergonha e preocupa o PS", mas o partido não se pode "transformar no Supremo Tribunal de Justiça". Próximo Orçamento deve incluir BE, defende.
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Autárquicas 2021
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O rioísmo pesa todos os cenários, incluindo o fim da linha e a ascensão de Moedas, o favorito. Rodrigues dos Santos tem a cabeça a prémio e vai tentar enganar o destino. Sobreviverão mais fortes?
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Empresas
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A pressão aumenta para que as empresas "zombie" conheçam um veredicto. Deve o Governo salvá-las? É das próximas dores de cabeça da economia portuguesa, mas não está nas prioridades do executivo.
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