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Nem vegan nem vegetariano. Em vez disso, flexitariano: com menos rigidez e mais liberdade com responsabilidade. |
Hoje celebra-se o Dia Mundial do Veganismo. E a propósito dessa data e das dúvidas que constantemente surgem sobre os vários tipos de vegetarianismo, aproveito para tentar explicar alguns mitos alimentares associados ao tema. |
O que comem os vegan? Ou será mais fácil falar do que não comem?
Claramente não comem produtos de origem animal (carne e pescado), como acontece no caso da alimentação omnívora. Mas ser vegan — o que implica uma alimentação baseada em produtos de origem vegetal — é um estilo de vida que vai para além da alimentação. Por questões principalmente éticas, os defensores deste regime não comem nada de origem animal, não usam produtos que contenham compostos de origem animal (como cosméticos, roupa ou outros objetos) e, claro, não assistem a espetáculos com animais. |
Este enquadramento torna-se importante para percebermos então que os vegan não consomem qualquer subproduto animal: nem lacticínios – leite, queijo, manteiga, natas, iogurte – nem ovos, nem sequer mel. E é principalmente aqui que se faz a separação entre os vegan e os vegetarianos, uma vez que estes últimos aceitam incluir estes alimentos. |
Existem três tipos de vegetarianismo e todos eles podem incluir mel: |
- ovo-lacto-vegetariano (que inclui ovos e lacticínios)
- ovo-vegetariano (que inclui ovos)
- lacto-vegetariano (que inclui lacticínios), e em todos podem incluir mel.
- A Associação Vegetariana Portuguesa considera que a corrente mais abrangente — que dá pelo nome de flexitarianismo (uma alimentação de base vegetariana que inclui pontualmente carne ou peixe) — não deveria ser considerada como um tipo de vegetarianismo. No entanto, esta corrente tem tido cada vez mais adesão na população mundial (Portugal não é exceção) e na comunidade cientifica. Os flexitarianos parecem reconhecer a carne como uma boa fonte de proteína e micronutrientes (vitaminas e minerais) mas pretendem reduzir o consumo por questões de saúde e sustentabilidade, entre outros motivos.
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Quantos vegetarianos, vegan e flexitarianos existem em Portugal?
De acordo com os dados do estudo The Green Revolution, da consultora Lantern, o número de vegetarianos em Portugal em 2021 era de cerca de 180 mil pessoas, os vegan ascendiam a 43 mil e os flexitarianos chegaram aos 9,3% da população (eram 7,4% em 2019) perfazendo cerca de 800 mil indivíduos. Este estudo incluiu todos estes tipos de alimentação debaixo da alçada veggie (o que corresponde a 11,9% da população portuguesa adulta). |
Mas há mais: aumentou também o interesse da comunidade científica no tema. A dieta flexitariana tem neste momento mais de sesssenta artigos no pubmed, uma base de dados científica de acesso livre. |
A alimentação vegetariana torna-nos mais saudáveis?
É irrefutável que existem benefícios para a saúde. A comunidade cientifica concorda em vários, principalmente nas doenças não transmissíveis, tendo por base que as dietas vegetarianas incluam alta ingestão de vegetais, frutas, grãos integrais, leguminosas, produtos de soja, nozes e sementes (todos ricos em fibras e fitoquímicos). Entre os principais benefícios estão: |
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Os vegetarianos ingerem menos calorias?
A resposta será NÃO, de acordo com um estudo transversal com 71.751 indivíduos (idade média de 59 anos) do Adventist Health Study 2. Mas já os flexitarianos consomem em média cerca de 1700Kcal/dia, menos 300kcal que os vegetarianos e não vegetarianos. |
Uma alimentação vegetariana é sempre saudável?
Um dieta vegetariana consiste predominantemente no consumo de cereais, vegetais, tubérculos, frutas, leguminosas, frutos secos, sementes e todos os subprodutos que podem vir destes alimentos. Ou seja, existem muitos produtos vegetarianos processados.
Talvez já tenha visto versões de “carnes vegetarianas” nos supermercados, com aspeto de carne picada — não são mais do que produtos altamente processados, sem valor nutricional, e que não fazem parte de uma alimentação saudável. Aliás, uma alimentação vegetariana pode ter por base pão, massas, cereais com bebida vegetal, batatas fritas com molhos e isso, como se sabe, não é saudável. Numa alimentação vegetariana temos que saber alimentar-nos corretamente, para que esta seja saudável, dando prioridade a uma boa proporção de vegetais, frutas, frutos secos e nunca esquecendo os alimentos que fornecem a proteína, como leguminosas e fontes de soja. |
Será possível ser vegan saudável sem tomar suplementos?
Há necessidades nutricionais especificas que não podem ser preenchidas numa alimentação vegan. Estamos a falar da vitamina B12, que vem de todos os produtos animais e é essencial na absorção de ferro. Estes dois parâmetros são essenciais, o que significa que quando em carência estamos a pôr em risco a nossa saúde. Mas também podemos dizer que o aporte em ómega-3 na alimentação vegan não é o melhor, porque a qualidade e absorção do ómega-3 da linhaça não é igual à do peixe.
Já um ovo-vegetariano ou ovo-lacto-vegetariano ou flexitariano que tenha uma alimentação completa, variada e equilibrada, tendo como objetivo abarcar todos os nutrientes, poderá não ter necessidade de suplementação. No entanto, essa avaliação deve ser sempre feita por um nutricionista. |
Existe depois a questão intrínseca de cada indivíduo, que se prende com maiores necessidades de ferro (ou outro micronutriente). Algumas pessoas têm mais dificuldade em absorver ferro e em fazer reservas deste, sob a forma de ferritina. Por isso nem todas as pessoas podem fazer restrições alimentares, mesmo que pareçam saudáveis. |
Uma pessoa que faz restrições alimentares, de alimentos saudáveis, deve monitorizar os valores de vitaminas e minerais específicos afetados por essa restrição. Só assim poderá perceber os que deve suplementar ou voltar a incluir na sua alimentação. Voltando à questão da vitamina B12, por exemplo, esta fica armazenada no nosso fígado por dois a quatro anos, mas a partir do momento em que as reservas se esgotam (comum após uma dieta vegan por mais de três anos), verifica-se uma carência desta vitamina que pode ter implicações anémicas e neurológicas, afetando todo o bom funcionamento do organismo. |
Os vegetarianos comem mais… vegetais?
Bom, este é um tópico sensível. Teoricamente diríamos que sim, mas na realidade pode não ser exatamente assim (e já vi não ser assim em consultório). Comer pão, massa, leguminosas e outros cereais continua a ser uma alimentação vegan… |
Os legumes cozinhados, as saladas, os vegetais (até dentro das sobremesas ou de hambúrgueres vegetarianos), são opções do vegetarianismo saudável. A propósito disso, eeixo aqui uma inspiração de um bolo que faço com regularidade e todos gostam cá em casa. |
Verdadeiro ou falso? A couve-flor pode ser responsável por sentir-me inchado e com flatulência. |
Verdadeiro. A couve-flor é dos vegetais que mais fermenta. Faz parte também de um grupo de vegetais muito importantes, chamados crucíferas, com efeito anticancerígeno comprovado. Mas para aqueles que estão com distúrbios intestinais associados a cólicas ou excesso de flatulência fará sentido suspender o consumo até resolver a causa. |
Uma pergunta frequente nas consultas: entre batata, feijão ou grão, o que é melhor do ponto de vista nutricional para enriquecer uma sopa de legumes? |
O ideal será variar entre feijão e grão, mas sempre a boiar, para aumentar a saciedade. As sopas não têm que ser todas sem batata ou sem leguminosas, mas normalmente pedimos para substituir por legumes quando falamos da base da sopa porque “rouba” espaço a outros vegetais que nutricionalmente fazem mais sentido. |
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Da autoria da nutricionista Sandra Gomes da Silva, é um livro que dá todas as ferramentas para quem se quer iniciar no vegetarianismo ou simplesmente começar a ter algumas refeições vegetarinas. Tem bastantes receitas e explicações, que são essenciais para a motivação.
(ed. Oficina do Livro) |
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Mariana Chaves é nutricionista clínica, autora do podcast Aprender a Comer, na Rádio Observador, e do livro Dieta Única (ed. Guerra e Paz, 2016) [ver o perfil completo]. |