Não consigo vislumbrar grandes formas de sair deste inferno em que vivemos. Mas há pelo menos três, senão mais.

A vacinação não se cumprirá, não teremos imunidade de grupo tão cedo e este ano, 2021, parece impossível por problemas de abastecimento e, certamente irão surgir também, por problemas do lado da procura quando e se tivermos massa crítica suficiente para vacinar. Em termos normais, apenas no segundo trimestre de 2022, e feitas contas, conseguiríamos cumprir, tivéssemos abastecimento, o plano de vacinação.

Dito isto, e perdido por um, perdido por mil, existem certamente três formas de sair disto. Dolorosas, mas possíveis.

A primeira parece ser já um clássico para ver e estudar. Fechar entradas e saídas na totalidade. São os casos da Nova Zelândia e da Austrália, neste momento com zero vacinados. Dir-se-á que é mais simples, mas no nosso caso não sendo tão simples é, apesar de tudo, fazível a um custo elevado, elevadíssimo. Fechamos a fronteira com Espanha e todas as fronteiras aéreas. Só podemos voar de e para as nossas ilhas. Estamos na União Europeia e podemos dizer que não é possível. Bom, temos visto que fechar fronteiras não é assim tão difícil como isso. Cheira um bocadinho a opressão, mas nada de muito complexo, certo?

Com isto fecha o turismo internacional e, é bom que se diga, acantonamo-nos cá dentro. Só entram e saem mercadorias e animais. Pessoas não entram nem saem. E assim ficaremos até secarmos tudo quanto está à nossa volta e até que consigamos vacinar todos. É preciso uma boa dose de sorte para que haja cumprimento e para que haja testagem massiva e rastreamento também massivo.

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Fazemos um haircut, soit disant, à economia de muitos serviços, restaurantes, hotéis e espetáculos e muitos mais. E aceitamos funcionar com um PIB, digamos, inferior em 10 a 20% ao que estávamos habituados. Olhamos para a situação como uma oportunidade para nos reinventarmos. Pode parecer absurdo, mas é uma opção com policiamento, inibição de mobilidade, testagem e rastreamento massivos. E mesmo aligeirando um bocadinho, é possível, com quarentena obrigatória a todos quantos entram. Catorze dias fechados no quarto de um hotel pago por quem quiser vir.

A segunda parece ser a manutenção de algum confinamento e, em paralelo, acelerar a vacinação. Mas como acelerar a vacinação se não temos vacinas? Bom, já ouvi falar nisto e há países a fazê-lo. Nomeadamente, a Hungria. Pode discutir-se o exemplo, mas a verdade é que assinar com a Rússia e a China acordos para trazer as respectivas vacinas poderia ser a forma de acelerar o processo. Embora a Rússia tenha pouca capacidade produtiva, a China tem-na. Ou não fosse a China a fábrica do mundo. Certo é, que a fórmula da Coronavac, vacina chinesa contra a Covid-19, é segura e induziu resposta de anticorpos em 97 por cento dos voluntários saudáveis testados, segundo um estudo publicado na revista The Lancet – e a The Lancet parece-me inquestionável em termos reputacionais. Adicionalmente, a vacina da Russia, a Sputnik V, já tem encomendas de mais de 20 países e a própria Hungria chegou a acordo para a administrar à população. Claro está, que no Kremlin, o exemplo de vacinação veio pelo braço da filha de Putin. A coitada apenas apresentou, em consequência, febre ligeira. E então? 

Vou mais longe. A própria Sérvia, que pretende aderir à União Europeia, encomendou vacinas russas e vacinas chinesas. Em vacinação, vai bem acima da média europeia e destaca-se como um país de grande capacidade de vacinação. A Hungria vai disparar quando estiver em posse das novas encomendas da Sputnik V e da Coronavac.

A terceira e última opção é irmos rapidamente a Israel e começar a importar o oficialmente conhecido como EXO-CD24, um remédio e não uma vacina, sendo que a sua preparação é inalada uma vez por dia, durante alguns minutos, por um período de cinco dias. Em ambiente hospitalar tem dado os melhores resultados e muitos israelitas foram efetiva e comprovadamente curados por intermédio deste medicamento. Acordos de produção em Portugal e antecipação para o nosso país fariam falta. E esta seria uma opção que parece ser viável, ligeiramente arriscada porque se desconhecem estudos que não sejam de fases embrionárias, a poucas pessoas, mas com impacto importante quando aplicada a doentes a braços com um SARS-CoV-2 mais violento.

É claro que não falo na quarta hipótese, porque essa passaria por rapidamente disponibilizar capacidade instalada de fábricas em toda a Europa e fazer acordos firmes de produção das vacinas já aprovadas, pagando para isso, por forma a podermos “mimetizar” por cá, em laboratórios de genéricos ou em fábricas nossas (a Hovione ou a Bial são apenas exemplos) as vacinas aprovadas e em circulação.

Todas as hipóteses são debatíveis e discutíveis. Noutros países têm-no sido. Nunca me apercebi, porém, de que estivesse a ser feito um esforço sério por parte da UE e dos vários governos no sentido de negociarem com as farmacêuticas cujas vacinas estão aprovadas, capacidade instalada extra e produção efetiva (a quarta hipótese). A Alemanha tem uma Hoechst e uma Bayer, por exemplo. Nós temos pouco, mas temos alguma coisa. Se afinal estamos em guerra então estas coisas acontecem em guerra (aconteciam). E em guerra espera-se de todos uma solução ou soluções que sejam fazíveis. Nem que seja fecharmo-nos, irmos à China ou à Rússia buscar mais vacinas (a toma é livre!), fazermos um acordo com Israel ou apostarmos numa via alternativa, a quarta, que pode parecer inusitada no meio de tanto frenesim mas que, em todo o caso, quero crer que se alguém pusesse mãos a sério nela, seria possível/exequível e poderia acelerar a vacinação.