Portugal beneficiará de fundos europeus até 2027, num valor nunca antes visto. Os valores disponíveis ultrapassam os 45 mil milhões de euros – uma parte do PT2020 ainda em pagamento e execução (aproximadamente 4 mil milhões de euros), 23 mil milhões de euros provindos do Portugal 2030 e cerca de 18 mil milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) em execução. É muito dinheiro, e com menos de uma década para a execução. Certamente todos os setores de atividade vão sentir, de uma forma ou de outra, a chegada deste volume de dinheiro à economia.

Os fundos europeus permitem alavancar investimentos públicos e privados que estejam alinhados com as agendas temáticas da União Europeia. Esta, enquanto bloco político e económico, posiciona-se também a nível global e tem as suas agendas orientadas para a competitividade externa com os demais players globais (EUA, China), mas sem esquecer a coesão interna da Europa, numa procura incessante de aproximação dos níveis de desenvolvimento das respetivas regiões, nem sempre conseguida.

Alicerçados no quadro legal e na informação disponibilizada pela Agência Desenvolvimento e Coesão, exploramos o PT2030 para o qual foram estabelecidas cinco prioridades (ou objetivos estratégicos), devendo os projetos a apresentar estar devidamente alinhados desta forma:

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No atinente à territorialização dos fundos, desde 2013 que as NUTS 3 correspondem a territórios com entidades político-administrativas locais, supramunicipais, e cujos titulares dos órgãos são eleitosi – Entidades Intermunicipais compostas por Áreas Metropolitanas e Comunidades Intermunicipais – pelo que se mostra facilitado o desenho das políticas públicas transversais a vários municípios e também a avaliação dos resultados, uma vez que a UE baseia os seus dados em NUTS, e estas têm agora correspondência territorial coincidente com o daquelas entidades com personalidade jurídica.ii Não sendo regiões político-administrativas (nos moldes constitucionalmente previstos), não deixam de ser sub-regiões com poderes administrativos que estão presentemente a ser reforçados pela descentralização administrativa em curso. Estão, pois, presentes na governação multinível, articulando e comprometendo políticas públicas em rede. Quando tentamos explicar a estrangeiros o que são estas Entidades Interadministrativas, quais as suas competências transversais a vários municípios e muito assentes na gestão das redes intermunicipais; com autonomia financeira e administrativa e legitimidade dos titulares dos respetivos órgãos, logo eles tendem a catalogá-las como entidades locais autónomas ou mesmo regionais. Por cá só não são autarquias – embora preencham cabalmente o conceito de autarquia – porque o princípio da tipicidade das autarquias locais, previsto na nossa Constituição, as não prevê, pelo menos sem prévia consulta popular (referendo).

No atinente às referências territoriais, já no Acordo de Parceria que vigorou para o PT2020 se propunha que a concretização dos Investimentos Territoriais Integrados (ITI) decorresse numa escala de NUTS 3, através de Pactos para o desenvolvimento e Coesão Territorial. Ainda assim, alguns parceiros na execução da estratégia 2020 (e certamente também na presente), queixaram-se da necessidade contínua de novos planos estratégicos que acolham as propostas que pretendem ver cofinanciadas. Criticam-se, por vezes, os demasiados estudos e diagnósticos exigidos – praticamente – para cada novo quadro de apoio, os quais podem atrasar a execução.

Pior, mesmo, ocorre quando as estratégias são desenhadas numa ótica de acolhimento dos vários projetos, num sucessivo mapeamento meramente somativo, sem a verdadeira e real articulação das propostas com os objetivos, medidas e metas das entidades beneficiárias. A desarticulação dos projetos apoiados, sem uma estratégia de base devidamente alinhada com a agenda 2030 e também com o PNPOT (Programa Nacional da Política do Ordenamento do Território), levaria a resultados de alcance duvidoso no atinente ao desenvolvimento que cria valor efetivo e sustentável e, bem assim, posicionamento competitivo na UE.

Em todo o caso, e como referimos, pelo menos desde o QREN (Quadro Estratégico de Referência Nacional 2007/2013) que os investimentos cofinanciados por fundos europeus deixaram de o ser numa ótica de dispersão, estando, outrossim, assentes em estratégias intermunicipais e integradas, de desenvolvimento. O mapeamento racional dos equipamentos assim o exigiu, face a uma atomização que galvanizava sempre defensores locais, mas que por vezes não encontrava padrões de eficiência, eficácia e muito menos de economicidade ou mesmo de razoabilidade dos gastos públicos, ainda que suportados em parte pela Europa; já para não falar da sustentabilidade a prazo de muitos dos equipamentos propostos.

Os recursos públicos, ainda que alavancados por fundos europeus, são sempre escassos e exigem grande cuidado no estudo da viabilidade económica das soluções propostas pelos legítimos decisores públicos. E também exigem um cuidado na análise – a jusante – dos respetivos custos de utilização dos equipamentos edificados com apoio europeu, custos energéticos e outros, e bem assim os custos com a sua manutenção futura. Um alinhamento com os ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável) é hoje condição sem a qual não haverá elegibilidade dos projetos ao apoio com fundos europeus.

Por último, refira-se que com a recente publicação da Lei n.º 24-A/2022, de 23 de dezembro, passam a ser 23 as Comunidades Intermunicipais (do Continente). Tal resulta de uma antiga aspiração dos municípios da Península de Setúbal, que se viam “prejudicados” pelas médias de rendimento de Lisboa no acesso a fundos europeus, não beneficiando das mesmas taxas de comparticipação do Alentejo ou do Centro, por exemplo. Neste sentido, procedeu-se à alteração do regime jurídico das autarquias locais e das entidades intermunicipais, criando mais duas Comunidades Intermunicipais (Grande Lisboa e Península de Setúbal), que agora passam a ser 23, mantendo-se as duas áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto. Com esta alteração, também Vila de Rei e Sertã abandonam “imperativamente” a CIM Médio Tejo, passando para a CIM Beira Baixa, e a CIM do Alto Tâmega mudou a denominação para CIM Alto Tâmega e Barroso.

Paralelamente, foram também criadas duas novas NUTS 2 no continente (Oeste e Vale do Tejo e Península de Setúbal), já aprovadas por Bruxelas, passando a ser 9 NUTS 2 (sete no continente e duas nas ilhas). São, contudo, alterações recentes, e que ainda não terão reflexo nas taxas de cofinanciamento dos quadros de apoio a que se refere o presente texto, e as taxas de comparticipação futura dependerão sempre da evolução do rendimento dos territórios que agora são autonomizados em novas NUTS 2.

A questão respeita à Península de Setúbal e ao Oeste e Vale do Tejo, sendo necessário saber como, em 2028, será considerada em termos de desenvolvimento comparado, sendo diferentes as taxas máximas de cofinanciamento caso seja região menos desenvolvida, em transição ou desenvolvida. No presente, os municípios de Setúbal, ao estarem na Área Metropolitana de Lisboa, beneficiavam de taxas de financiamento que não vão além dos 50%, enquanto Torres Vedras, por exemplo, vinha beneficiando de taxas de até 85%, por ter sido “deslocalizada” para o Centro para efeitos de candidaturas a fundos europeus.

Recorde-se que as regras mudaram para o atual quadro comunitário de apoio. A ponderação dos apoios máximos às regiões, atento o seu PIB per capita face à media da UE, são consideradas menos desenvolvidas (PIB < 75 %); em transição (PIB entre 75 % e 100 %), e mais desenvolvidas (PIB > a 100 %). Norte, Centro Alentejo, Madeira e Açores estarão no primeiro grupo, o Algarve estará no segundo e Lisboa no grupo das regiões mais desenvolvidas. Já o Fundo de Coesão apoia os Estados que se encontram abaixo de 90% da média do PIB.

Temos assim um período de tempo em que não vão faltar meios financeiros para alavancar as boas iniciativas e projetos, os quais, obviamente, deverão alinhar-se com os objetivos e metas já aprovados e divulgados. São muitos milhões de oportunidades!

No agendamento das políticas públicas que possam merecer elegibilidade aos apoios comunitários, e na procura de meios para a respetiva implementação, terá de verificar-se igualmente um necessário alinhamento com as “macro agendas” da Europa, a saber:

Os meios financeiros destinados ao cofinanciamento das políticas virão, no PT 2030, de 6 Fundos. As “gavetas” financeiras europeias estão assim divididas:

Os 23 mil milhões provenientes destes Fundos, estarão alocados a 4 PT (Programas Temáticos) e a 7 PO (Programas Operacionais Regionais):

i Ainda que alguns indiretamente, tal como de resto também acontece na eleição dos vogais da junta de freguesia.

ii A Nomenclatura das Unidades Territoriais para fins Estatísticos (NUTS) foi criada pelo Eurostat com as entidades com responsabilidades em produzir estatísticas oficiais dos diferentes Estados da UE.