M., 31 anos, foi promovida recentemente e passou a ganhar mais que o marido, tem vontade de comemorar a promoção mas tem medo de ofendê-lo.

G., 43 anos, diretora numa grande multinacional, nunca consegue sair cedo o bastante para buscar seus filhos na escola, embora passe todo tempo possível com eles.

J., 22 anos, concorreu para a mesma vaga de estágio que o namorado, ela foi selecionada, ele não. Ainda não teve coragem de contar para ele que foi aprovada.

L. 59 anos, advogada apaixonada pelo que faz, sócia de um grande e renomado escritório, se pergunta se não deveria estar com as tardes livres para cuidar dos netos, como muitas de suas amigas fazem.

A, 13 anos, sempre tira notas mais altas na escola do que seu irmão gêmeo e frequentemente esconde suas provas para que ele não se sinta mal.

É uma epidemia. A cada dia que passa ouço uma nova história acerca de uma mulher que começou a se sentir culpada pelo próprio sucesso em vez de celebrar as suas conquistas com satisfação. Tem começado cedo, dentro das escolas e tem acabado tarde, até mesmo depois da aposentadoria.

As justificativas são muitas: não quero que meu marido se sinta diminuído, não quero que meu chefe ache que eu ameaço o cargo dele, não quero que meu pai saiba que estou ganhando mais do que ele, não quero que meus filhos achem que eu ligo mais para o trabalho do que para eles, não quero que minhas amigas se comparem comigo e fiquem frustradas, não quero que meus filhos pensem que eu não tenho tempo para os meus netos.

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Trata-se quase de uma auto sabotagem, uma vez que nenhuma dessas mulheres está infeliz com o seu sucesso- muito pelo contrário- mas sim se sentindo culpada por ele, por uma série de ângulos. As origens dessa culpa estão, obviamente, no pensamento machista que perpetua a ideia de que o homem que alcança o sucesso é digno de respeito e admiração, enquanto a mulher que alcança o sucesso é tida como egocêntrica ou egoísta, por teoricamente colocar seu trabalho na frente do casamento, da família, do planejamento familiar e até mesmo de questões estéticas.

E, assim, milhares de mulheres começam a tentar se convencer de que suas conquistas profissionais não devem ser muito celebradas, nem muito divulgadas e, acima de tudo, nem muito desejadas. Culpam-se por serem boas no que fazem, por tornarem-se essenciais às suas equipes, por serem referências nas suas áreas, por serem bem remuneradas pelo que fazem – lembrando sempre que, por mais bem remunerada que seja uma mulher, seu salário sempre estará aquém do que seria para um homem na mesma posição.

Surge, por vezes, na cabeça dessas mulheres, a falsa ideia de que aquilo nunca foi merecido. A famosa síndrome do impostor, que tenta nos convencer de que só chegamos onde chegamos por um golpe de sorte, pelas portas que nos foram abertas ou por ironia do destino. Nunca por mérito. Um estranho mecanismo que nos faz sentir uma culpa duplicada, seguida da ideia de que talvez o correto fosse tirar nosso time de campo.

Precisamos olhar para o problema da culpa. Precisamos parar com as perguntas do tipo “mas seu marido não reclama que você viaje tanto a trabalho?”, “mas seus filhos não se queixam dos dias em que você chega tarde?”. Cada mulher sabe das próprias escolhas, como cada homem sabe das suas. Precisamos parar de abrir espaço para o que os outros- sobretudo os homens- coloquem nossas escolhas em questão.

Somos as responsáveis pelos nossos sucessos e pelos nossos fracassos. Fomos ensinadas a lidar com os fracassos e a seguir em frente. Já é hora de aprendermos a lidar bem com o nosso sucesso, a termos orgulho dele e certeza do nosso mérito, bem como já é hora de aprendermos a comemorar sem ter medo de quem possa sentir-se ameaçado com a nossa trajetória. Nós merecemos isso, literalmente.