O objetivo da ciência não é produzir verdades indiscutíveis, mas discutíveis.
Bruno Latour

Seguir a ciência? Com um ano e meio de pandemia já sabemos o que isso significa?

Começar por dizer que o vírus nem chegava cá? Que não faltava nada nos hospitais? Colocar semáforos em praias? Arranjar umas alfaces na horta do vizinho? Libertar presos? Trocar umas compotas pelo Natal? Que as máscaras, que primeiro nem serviam, passavam a obrigatórias para entrarem num local mascarados e uma vez lá dentro se tirarem? Que já quaisquer máscaras, sejam de pano ou papel, servem? Negar apoio a sócios-gerentes? Avançar massivamente para Sevilha? Criar leis de discutível legalidade? Etc., etc.

Ó meus amigos… Quem tiver algo a apontar a isto, só pode ser um bandalho de um negacionista, capaz de dizer que o coronavírus não mata.

Com as alterações climáticas passa-se o mesmo. Não ouviram até já dizer que se trata da nova pandemia? Carta branca para seguir uma ciência imune à dúvida, a de governar pelo “quero, posso e mando” (leia-se legislando, proibindo, taxando ao invés de apoiar, fomentar, envolver…), enxovalhando enquanto terraplanista quem se opuser à nossa… política.

“Nunca a ciência foi tão importante a determinar a necessidade de uma mudança completa do modelo social e económico”, dizia Matos Fernandes há uns dias num encontro de ciência e tecnologia em Lisboa. Errado. Acontece que a ciência não pode dizer o que deve ser feito, porque é, supostamente, neutra no que a políticas e valores diz respeito. Fazer algo/tomar medidas, tal como oferecer máscaras ou multar quem as não tem, não é ciência, é política.

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Sr. Ministro, deixe lá de instrumentalizar a ciência para fins políticos e propaganda. Deixe à ciência o que é da ciência: produzir conhecimento que enriqueça o debate, tão necessário para boas decisões políticas. E preocupe-se em usar esse conhecimento nas medidas que propõe. Isto porque toda e qualquer medida tem impacto na vida das pessoas e estas têm leis para as proteger, porque há balanços económicos necessários de se esmiuçar, porque justiça social é imperativa, até porque o seu cargo depende da vontade das pessoas, e, sim, mesmo o impacto ambiental tem que ser pesado.

Disse na carta que escreveu a Greta Thunberg que queria liderar a cruzada climática. É bonito, quando quem paga a candeia e sua luz são os bolsos dos outros, dos Portugueses. Que até já pagam da eletricidade e combustíveis mais caros da Europa (energia, fundamental para produzir, que é outro dos nossos problemas coletivos). E que, ao contrário de si, muitos pagam essas e outras coisas com esforço. E, ainda, que têm legítimas expectativas sobre muitos outros assuntos – é preciso lembrar que há escolas onde chove lá dentro? Onde a comida é intragável? Que temos pobres, sem-abrigo até? Que muita gente perdeu os seus negócios? Que a precariedade laboral abunda? Que há terrinhas a centenas de quilómetros de um hospital? Etc.,etc.

Escudar-se em ciência climática para justificar a sua obsessão com o fim das vacas, as minas de lítio, a biomassa ou os eucaliptos, o hidrogénio e o rol de subsídios, etc.? Não chega. Há muito e multidisciplinar conhecimento necessário, e muitas leis, direitos e até boas práticas a observar, para que uma qualquer opção seja uma boa opção. Não o queremos ouvir a si sobre ciência. Queremos ouvir justificações, estudos feitos, impactos económicos, sociais e ambientais, queremos processos transparentes e participado. Porque isto é política, a sua missão é política e isso é devido aos eleitores que lhe dão o cargo e aos contribuintes que suportam as políticas.

Um exercício simples? Comece por explicar à menina Greta, que ainda agora lançou um comunicado conjunto sobre a importância da conservação da natureza para um correto rumo da ação climática, o que se passou na Torre Bela. É a ciência que manda decapar uma floresta, matar mais de 500 animais, prometer auditorias para calar críticos, disfarçar desconhecimento sobre matéria aprovada? Ou são os cartazes do PAN a sua fonte científica? Ou a ciência está na aprovação da APA? Explique-lhe, ou chame-a cá e mostre-lhe, que afinal um deserto de painéis solares, a troco da ciência dos negócios de milhões, valendo umas manipulações, uns subsídios, e toneladas de lixo daqui a uns anos, é muito mais interessante que florestas, animais, caça, turismo, uso múltiplo, desenvolvimento sustentável que se dizia o futuro do ambiente, do interior do país, etc. Depois passe para os Portugueses, porque a esses, explicações são mesmo um dever seu.