Nos últimos dias o país foi amplamente informado de que várias instituições de ensino superior privado tinham sido mandadas encerrar por não terem obtido acreditação pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, vulgarmente conhecida por A3ES. As notícias foram sendo “libertadas” a conta-gotas ao melhor estilo das centrais de contrainformação e com um objetivo claro: aumentar os estragos.

De onde partiu a informação? Porquê agora em pleno período de candidaturas ao ensino superior se os factos que estão na base dos encerramentos são públicos há muito tempo? Quanto à primeira, é ocioso fazer perguntas, são conhecidas as sedes de poder onde estas decisões são tomadas e há sempre a possibilidade de serem responsáveis que tomam as suas convicções por imperativos de Estado ou apparatchiks a quererem mostrar trabalho. Quanto à segunda, é óbvio o objetivo, desacreditar o setor, afetar a sua imagem e prejudicar o fluxo de candidaturas nesta fase crucial de captação de estudantes.

Não está em causa a legitimidade dos órgãos que tomam estas decisões e se algo as instituições afetadas têm a contestar, existem meios legais, não é este o problema, também a divulgação mediática decorre do exercício livre de uma informação plural que obedece a critérios editoriais que só aos jornalistas compete aferir. Também não é por aqui que queremos ir.

O ponto é outro, com o advento da chamada “geringonça” a campanha contra o ensino privado em geral aprofundou-se à medida que se foi robustecendo a ideologia estatista e a ideia de que o Estado é o tesouro salvífico dos pobres a que tudo tem de se subordinar, que tudo tem de providenciar e que todos temos de reverenciar.

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Passados mais de quarenta anos de democracia e num mundo em profundíssima mudança, a Constituição e a leitura que dela fazem algumas forças políticas e sociais é a mais retrógrada e improdutiva como se as teses do PREC (Processo Revolucionário Em Curso, para quem não se lembre ou nunca tenha sabido) continuassem a ser o farol que ilumina o futuro.

Agarrados à ideia de que as funções do Estado se confundem com os serviços prestados por este, acirram-se contra os privados, na educação, na saúde, nos serviços sociais, enfim, em todos os setores onde o domínio do funcionalismo público fixa votos, interesses e maiorias.

Existe alguma racionalidade na defesa da exclusividade do Estado nestes setores ou para excluir os privados destas atividades? Existe alguma legitimidade para altos responsáveis de serviços públicos a quem se exige imparcialidade no juízo e discrição na decisão emitirem opiniões pessoais ideologicamente alinhadas com os opositores da iniciativa educativa privada confundindo liberdade pessoal com deveres funcionais e com evidente prejuízo para instituições escolares que cumprem todos os requisitos e são um parceiro social e cultural de enorme importância? Existe alguma razoabilidade no ataque planeado, coordenado, meticulosamente realizado a que se tem assistido nos últimos anos relativamente a todo o ensino privado?

A única justificação é a cegueira ideológica, a militância no combate estatista contra a liberdade, a livre iniciativa, a capacidade de escolha, perante a indiferença cúmplice dos que se amedrontam e calam, receosos de serem acusados de liberais, de vendidos ao capital ou de inimigos do Povo, como nos velhos tempos.

A liberdade de ensinar e de aprender é um dos pilares das sociedades democráticas, ao Estado incumbe garantir que todos têm acesso à educação e condições idênticas de sucesso, mas deve deixar-se à liberdade de organização dos cidadãos a possibilidade de criação e gestão de escolas de todos os níveis, salvaguardando as condições exigíveis do ponto de vista técnico e científico.

As escolas privadas em Portugal, tal como as estatais, têm um quadro definido de obrigações a que se não podem furtar para serem acreditadas e poderem funcionar, mas tão importante como isto é serem reconhecidas pelos seus clientes como escolas de qualidade, onde encontram as melhores condições de estudo e crescimento pessoal.

Todos os que operam no privado são os primeiros interessados em que o sistema seja credível e apelativo para que a captação de estudantes seja o mais ampla possível e quando alguma instituição não cumpre ou é encerrada só há razões para considerar que, se o problema é falta de qualidade, se está no bom caminho.

Infelizmente o que devia ser um ato de cidadania académica acaba por se transformar num labéu que se espalha como uma bactéria multirresistente com consequências nefastas para todo o setor, tendo como agentes os profissionais da contrainformação ao serviço de ideologias estatistas, inspirados nos manuais de agitprop cuja atualidade e eficácia são evidentes.

Nas atuais circunstâncias da sociedade portuguesa e do momento político presente, a linha de corte ideológica é o papel e o poder do Estado, ou se endeusa ou se reduz às suas funções fundamentais, ou se valoriza a sociedade civil e a iniciativa privada ou se amordaça a sociedade e se transforma o país numa imensa repartição pública. A escolha compete a cada um de nós.

Membro da direção da Associação do Ensino Superior Privado (APESP)