Os governos do mundo parecem finalmente ter despertado para o problema das emissões de gases de efeito estufa e para a urgência de tomar medidas coordenadas. De forma geral os parlamentos, senados e demais órgãos de constituição de políticas ambientais, um pouco por todo o mundo, iniciaram uma corrida, com o objetivo de estar na linha da frente das políticas de combate, mitigação e resiliência às alterações climáticas.

Nestas últimas semanas, devido à pressão sobre os preços dos bens e matérias primas, por influência das medidas climáticas, certamente, mas principalmente, pelos efeitos da guerra na Ucrânia, os planos climáticos de diferentes blocos (Europeu, Estados Unidos, Coreia do Sul, Canadá, Austrália, Japão e Nova Zelândia), têm vindo a ser revistos, uma vez que, por um lado, já estão previstas as suas revisões periódicas, como no caso do pacote legislativo europeu FIT55, mas também porque as políticas de rigor quanto aos processos de descarbonização que estavam previstas estão a falhar, ou seja, por questões óbvias, devido à guerra, não estão a ser cumpridas pelos países.

Soluções de fato ou apenas empurrar os problemas com a barriga?

O que significará, nesta revisão, a necessidade de reinventar tempo e soluções que se mostrem capazes de confirmar a capacidade de o mundo enfrentar com sucesso o combate às alterações climáticas. Infelizmente para o planeta, as políticas de “greenwashing” de que eram acusadas em anos transatos as organizações empresariais e que criaram desconfiança e descredibilizaram os mercados voluntários, estão agora a afetar as negociações do poder legislativo, colocando em risco todos os progressos da credibilidade que tem sido criada até aqui, no caso, dentro dos designados mercados regulados.

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O mês de junho será um mês crítico para a Europa neste tema, uma vez que estamos com a revisão dos objetivos de alguns dos pontos essenciais do FIT55, com destaque para o processo de revisão dos objetivos de países, alterações na legislação sobre uso do solo, criação do novo mecanismo de taxa de fronteira (CBAM EU), revisão do mercado regulado do carbono (EU-ETS) e criação do Social Climate Found (EU-SCF).

Por outro lado, nos Estados Unidos da América, o Senado rejeitou também uma proposta de Lei (Proposta nº S4355 – ou Lei da Concorrência Limpa) que criará um mecanismo similar ao CBAM Europeu, para todo o território norte americano, no entanto, parece-me que no caso, será mais rápido resolver, uma vez que foi apenas o senador do estado da Virgínia que se opôs, afirmando existirem sérias consequências que não estão a ser previstas e consignadas na proposta apresentada, enumerando-as e identificando-as.

Diga-se em abono da verdade – entenda-se, da ciência climática e boas práticas das políticas ambientais – que os argumentos que levaram à não aprovação são bastante pertinentes e não apenas para o contexto e realidade norte americana. São problemas transversais que a União Europeia também enfrentará quando tentar implementar o mecanismo de taxas de fronteira europeu (CBAM EU), uma vez que falta uma abordagem mais corajosa e pragmática do que é a proposta atual para o mecanismo europeu.

Como salvaguarda está o fato de para o próprio mecanismo na Europa se ter previsto uma fase de transição que inclui um período de adaptação que servirá para corrigir erros e ajustar-se à realidade contextual do problema. Mesmo assim, julgo que se estão a deixar passar erros que poderiam ser evitados à partida, mas que, por diversas fragilidades de origem negocial dentro do Parlamento Europeu, estão a ser “empurradas com a barriga”.

Fatores que os norte americanos, me parece, já identificam no seu contexto e foram esses que estiveram, no debate do Senado, na origem da não aprovação da proposta de lei, ou seja, fatores que o senado norte americano está a expor e debater de forma efetiva.

O Parlamento Europeu tem até dia 28 de junho para resolver este impasse, uma vez que está previsto levar à próxima reunião de ministros do ambiente, para aprovação, a revisão do FIT55, precisamente nessa data.

Enquanto isso, decorre no órgão técnico nomeado dentro da ONU a corrida contra o tempo, para apresentar na próxima COP27 o projeto da criação do novo mecanismo que substituirá o Mecanismo Limpo de Quioto, constituindo assim os pressupostos necessários para dar regulação, transparência e consenso ao mercado voluntário, naquele que já é conhecido como “A6.4ER”.

Nada será como antes

Independentemente dos vencedores, nesta corrida dos pacotes legislativos mais efetivos e capazes de lidar com o problema internamente e auxiliar a identificar os produtores e países poluidores, penalizando-os, percebe-se que, finalmente, há um caminho bem definido que por coincidência ou coordenação internacional, dos mercados mais avançados nas questões e leis climáticas, trará uma maior aceleração das descarbonizações em contexto global e por conseguinte, uma nova e definitiva realidade.

Aparentemente, e digo aparentemente porque precisamos de ver estes pacotes legislativos aprovados, a evolução será para melhor no que toca à previsibilidade de as organizações científicas, empresas e sociedade civil sentirem que tem condições de estabilidade legislativa a longo prazo e que se podem envolver de forma consistente na resolução do problema como um todo. Depois destes pacotes legislativos aprovados nos Estados Unidos e União Europeia, sendo que os restantes países já aqui mencionados estão com processos idênticos, nada será como antes.

Com mecanismos de ajuste de fronteira dos produtos dos exportadores de países terceiros, coordenados, a maioria dos produtores, mesmo de países sem regras climáticas apertadas, será obrigada a cumprir as agendas e boas práticas de descarbonização que a urgência e agenda do problema obrigam. Assim sendo, não importa se internamente esses países são mais poluidores e não querem colocar objetivos mais ambiciosos às suas agendas climáticas, porque o preço a pagar para o não fazerem será todo o seu PIB de exportação para países de mercados regulados.