No congresso da Iniciativa Liberal (IL), um orador, de voz trémula, confessa ter “medo de adormecer agarrado ao sonho liberal e acordar agarrado a um partido conservador”. Imagino os pesadelos. É que o homem quer “continuar a acordar num partido que desça a avenida no dia 25 de Abril”. De repente, a voz dele salta do trémulo para a frequência das gémeas Mortágua, e o mero conservadorismo ganha foros de Terceiro Reich: “Não à extrema-direita, fascista, racista, xenófoba e homofóbica!”. A julgar pelo barulho, a sala aprovou.

Vários membros da IL, e um artigo do João Caetano Dias no Observador, garantem-me que semelhantes entusiasmos ou são residuais no partido ou se devem à inexperiência de muitos dos congressistas. Também há quem, também na IL, me garanta que o partido está repleto de fervorosos idênticos ao citado. Não sei. Sei que a IL já desceu a avenida no 25 de Abril, e se teve de o fazer sozinha não foi porque se visse impedida pela “extrema-direita, fascista, racista, xenófoba e homofóbica”: a proibição veio da esquerda em peso, democrática e ecuménica.

Ao invés do que a direcção da IL pensou, e com certeza ainda pensa, a mera intenção de desfilar ao lado de forças comunistas e do actual PS não reivindica “Abril”. Apenas legitima os propósitos dos que tentaram, e quase conseguiram, aproveitar “Abril” para instaurar uma ditadura. E esta tendência da IL para a ilusão, ou para a inocência, não me parece residual nem se esgota nas comemorações do golpe de Estado de 1974.

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