Muito se tem falado (e nada se tem feito) sobre a falta de atratividade do SNS para os profissionais de saúde, nomeadamente os médicos.

A estrutura da carreira, que condiciona inúmeras dificuldades de progressão, que já por si é pouco apelativa, associado a uma estrutura remuneratória pouco aliciante, e que se tem vindo a agravar, comparativamente a outras profissões, nos últimos anos, bem como as condições de trabalho cada vez mais difíceis, com infraestruturas gastas, envelhecidas, disfuncionais, equipamentos que tardam em ser renovados, em acompanhar o ritmo da inovação, a par de pouco ou nenhum incentivo formal à formação e à investigação, acrescido de lideranças muitas vezes incompetentes, são os fatores maioritariamente apontados, de forma repetida e insistente, quase apelativa, como as principais razões para tamanho desinteresse por algo que foi, durante muitas décadas, o sonho de muitos jovens: ser médico (do SNS)!

Infelizmente, a situação agrava-se e adensa-se a um ritmo assustador. E as soluções tardam ou nem há qualquer intenção séria e real de as procurar, quanto mais implementar.

Pior, a situação “alastra-se”, nomeadamente às estruturas dirigentes das instituições dependentes do Ministério da Saúde, colocando sérios riscos à sua governação e, consequentemente, à eficácia e eficiência de todo o sistema.

Foi publicado a 13 de julho o Aviso nº 13989/2022, da Presidência do Conselho de Ministros. Trata-se da abertura da repetição do procedimento concursal para seleção do presidente do INEM. Esta necessidade de repetição resulta, alegadamente, da falta de concorrentes com a qualificação mínima exigida em concurso.

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E esta não é a primeira repetição de um concurso desta natureza, tendo já acontecido recentemente o mesmo para outras instituições. Nos últimos meses isso aconteceu para o cargo de Subinspetor-Geral da Inspeção Geral Atividades em Saúde (IGAS); em dois concursos diferentes para cargos de Subdiretor-Geral da Direção-Geral da Saúde (DGS); no concurso para o cargo de Presidente do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge; e no concurso para o cargo de Presidente da Administração Regional de Saúde (ARS) do Norte (Note-se que para os conselhos de administração dos hospitais não há, sequer, concurso. É por convite direto. Quantos serão recusados?).

Tal repetição só tem lugar, conforme o Regulamento de Tramitação dos Procedimentos de Recrutamento e Seleção dos Cargos de Direção Superior na Administração Pública, publicado através do Despacho nº 6061/2020, de 4 de junho, na ausência de candidatos em número suficiente (artigos 8º e 9º). Sendo que esse número mínimo é de apenas 3 candidatos!

Isto representa uma manifesta falta de interesse (ou confiança?) no sistema.

Isto desacredita e impõe, necessariamente, reflexão, sobre o processo de seleção dos dirigentes de topo da administração pública e questiona, com o devido respeito pelas honrosas exceções, o seu mérito e real valor, para além das razões, que devem ser esmiuçadas, de falta de candidatos.

Será a remuneração que não é adequada face à responsabilidade? Será a falta de autonomia de gestão, tal como se queixam os gestores hospitalares? Será a presença, quiçá demasiado intrusiva, do poder político, que além de reservar a si a escolha do dirigente de topo (de entre uma lista de 3 candidatos), exerce, eventualmente, pressões na gestão diária destas instituições? Ou meramente porque se a escolha, em última instância é política, não haverá razões para alguém, “fora das graças” do partido no poder, sequer tentar?

Com isto, estaremos nós a ser geridos pelos “menos maus” de entre os candidatos que teimam (e já são poucos) em apresentar-se a concurso, ao invés de pelos melhores que o País produziu e tem? Pelo elemento que cumpriu os requisitos mínimos obrigatórios e depois foi o “eleito” pelo membro do Governo que tutela a instituição em apreço? É isso que nós queremos para gerir no dia-a-dia os nossos impostos? É isso que os portugueses merecem?

Urge mudar o sistema. Da base ao topo. Tornando-o atrativo para todos os níveis, transparente e com escolhas de dirigentes assentes, unicamente, no mérito!