Foi em 19 de junho de 1975 que a Fonte Luminosa entrou para a história da democracia em Portugal. Nesse dia, o Partido Socialista liderado por Mário Soares teve a coragem de fazer frente à onda comunista que estava a tomar conta do país. Por isso, durante o comício nesse espaço, exigiu a demissão do primeiro-ministro Vasco Gonçalves e reafirmou a confiança no povo português. Afinal, os portugueses tinham mostrado na eleição de 25 de abril de 1975 que não desejavam um regime semelhante ao modelo soviético. Um duro golpe que o PCP de Álvaro Cunhal se recusava a aceitar. Daí a «muralha de aço» que construíra para apoiar o «companheiro Vasco» na luta pela instauração da ditadura do proletariado.

Os desenvolvimentos seguintes, designadamente o 25 de novembro de 1975, deram razão a Mário Soares e o país continuou o seu caminho para a instauração da democracia. Um processo difícil, sempre dificultado pela oposição do PCP e dos seus aliados, e que teve como marcos fundamentais a entrada em vigor da Constituição, em abril de 1976, e a revisão constitucional de 1982 que permitiu o fim da democracia tutelada pelos militares e a posterior entrada na Comunidade Económica Europeia. Uma adesão que conduziria à revisão constitucional de 1989 e à revogação do princípio da irreversibilidade das nacionalizações. O golpe final nas pretensões do PCP.

Foi no dia 1 de maio de 2020 que a Fonte Luminosa saiu da história da democracia portuguesa. Foi nessa data que o Partido Socialista liderado por António Costa capitulou face às exigências do PCP. Uma prova de que não há geringonças – com ou sem acordo assinado – grátis,

No mesmo relvado onde 45 anos se lutara pela liberdade, os portugueses assistiram à ocupação do espaço pela CGTP, o braço sindical do PCP. Uma ocupação pacífica, ao contrário do que se passou nos campos do Alentejo na fase da incorretamente designada «Reforma Agrária».

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Uma ocupação autorizada pelo Governo de António Costa durante a vigência do estado de emergência decretado por Marcelo Rebelo de Sousa e aprovado pela Assembleia da República. Uma afronta aos portugueses que, confinados em casa, perceberam que Orwell tinha razão quando afirmava que «todos somos iguais, mas alguns são mais iguais que outros». Por isso, enquanto a larga maioria dos cidadãos estava proibida de sair do concelho de residência, a CGTP dispunha do poder de passar «guias de marcha» de forma a garantir a ocupação geométrica da Alameda. Um desenho novo que os drones das transmissões televisivas se encarregaram de inscrever nos olhos e no cérebro dos portugueses. Um atestado de vida para aqueles que se continuam a considerar deserdados do abril totalitário com que tinham sonhado.

A Fonte Luminosa e a Alameda D. Afonso Henriques não têm culpa do sucedido. Limitam-se a assistir às atitudes dos homens. O seu lugar na História decorre da ação desses homens. Daqueles que sabem estar à altura das circunstâncias e de outros que se demitem dessa função.

A sua condição não lhes permite perceber a lógica que preside aos ajuntamentos. Se lógica houver em muitas decisões governamentais. Como aquela de permitir ocupar a Alameda e a Fonte e, dois dias depois, impedir os cidadãos de saírem do concelho de residência para irem celebrar o dia com a mãe que os trouxe ao mundo.

John Locke ensinou que as maiorias nem sempre tinham razão e, por isso, apesar de terem o direito de governar não podiam destruir as minorias. Na conjuntura atual, os portugueses estão a perceber que as minorias já se arvoram o direito de impor a sua vontade às maiorias.

Quanto à Fonte Luminosa, limita-se a esperar que alguém lhe devolva a luz. Aquela sem a qual não se fica na História.