Se 2020 foi o ano da pandemia e 2021 o ano da vacinação, 2022 vai ser o ano da grande incerteza.

Não há sinal maior das enormes dúvidas que pairam sobre o futuro global do que as decisões dos principais bancos centrais esta semana. A Reserva Federal Americana deixou de considerar o aumento de inflação como temporário, reduziu as compras de ativos em 30 mil milhões de dólares e assume que irá aumentar as taxas de juro diretoras três vezes em 2022. No Reino Unido o Banco de Inglaterra subiu as taxas de juro pela primeira vez em três anos, de 0,1% para 0,25%. Na zona Euro, o BCE manteve a política monetária estável, confirmando, como aliás era largamente antecipado, que irá acabar em março com o programa pandémico de compras de ativos, e anunciando que nessa altura reforçará o seu programa de compras de ativos permanente.

As posições dos diferentes bancos refletem de facto situações do ciclo diferentes. Em novembro, a inflação atingiu 6,8% nos Estados Unidos, o nível mais elevado em quarenta anos. A inflação na zona euro atingiu 4,9% e no Reino Unido 5,1% os valores mais elevados respetivamente em vinte-cinco e dez anos. Para além do mais, a relativa inatividade do BCE face aos outros dois bancos centrais pode explicar-se pelo efeito de base provocado pela subida da taxa de IVA na Alemanha, que subiu três pontos percentuais em janeiro de 2021. Nessa altura, a inflação da zona euro subiu quase um ponto percentual face a dezembro. É expectável que em janeiro de 2022 esse efeito desapareça.

Mas mais do que todas as explicações factuais, o elemento que parece ser determinante para explicar as diferenças entre bancos centrais, é a dificuldade de antecipação sobre o que nos espera em 2022. Os programas de apoio à economia em várias regiões do mundo podem vir a esbarrar com problemas de oferta, tanto por via dos confinamentos relacionados com a covid, que deverão persistir e até intensificar com a nova variante mais contagiosa ómicron, como pela escalado dos preços energéticos. Mas também é difícil antecipar se eventuais futuros confinamentos poderão ser suficientemente abrangentes e rigorosos para terem um efeito negativo sobre a procura. Desde logo, o que parece seguro é que a enorme incerteza sobre a covid e o efeito das vacinas e a expetativa de inflação crescente poderá adiar decisões de consumo e investimento, para além do potencial efeito negativo sobre os setores de serviços e transportes de passageiros.

Nas fronteiras da Europa, a tensão política e económica em várias frentes poderá vir a ter efeitos inesperados. A decisão da Alemanha de não autorizar a entrada em funcionamento do gasoduto Nordstream 2 deverá manter os preços do gás mais elevados do que anteriormente antecipado e poderá potenciar a tensão na fronteira entre a Rússia e a Ucrânia. Na Turquia, é difícil ignorar a enorme instabilidade económica que fez a moeda cair a pique e que poderá ter consequências sobre a vontade da Turquia de continuar a servir de barreira à migração para a UE.

Dizia John Galbraith, “Existem dois tipos de peritos em previsões: aqueles que não sabem e aqueles que não sabem que não sabem”. O melhor que se pode pedir é que os Bancos Centrais se encontrem entre os primeiros. Só assim poderão manter-se suficientemente flexíveis para responder rapidamente aos desafios que o mundo enfrenta em 2022.

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