A PJ está a investigar uma rede de tráfico de ouro, diamantes e droga, mantida por comandos e ex-comandos portugueses, a partir da República Centro Africana, onde as Forças Armadas participam em missões da ONU. Aproveitando o facto de os voos para casa não serem fiscalizados, os militares traziam a mercadoria, que depois escoavam pela Europa. Os ganhos eram transformados em criptomoeda, guardadas em contas de testas-de-ferro. Devem ser soldados que só aprenderam a primeira parte do lema dos Comandos, “mama sume”.

Sim, senhor! Está aqui montada uma bela operação. Depois do que Gouveia e Melo fez com a vacinação, é a segunda vez este ano que somos agradavelmente surpreendidos pela capacidade de organização dos militares portugueses. Se há quem gostasse de ver o Vice-Almirante assumir um cargo político, de certeza que também vai haver quem queira que o cabecilha deste bando vá para o Governo. Pelos valores que se falam nas notícias, dava jeito que viesse para ministro das Finanças.

Entretanto, o Governo reagiu através do ministro dos Negócios Estrangeiros – claramente a pessoa indicada, uma vez que aquilo que os militares andaram a fazer foram precisamente negócios com estrangeiros. Segundo Augusto Santos Silva, a imagem das nossas Forças Armadas não fica manchada. Não tenho tanta certeza. O que sucede é que a mancha passa despercebida no camuflado da farda. Santos Silva não disse muito mais, limitou-se a acrescentar que não trata indícios como se fossem factos apurados. Mas isso nós já sabíamos. Aliás, Santos Silva também não trata factos apurados como se fossem factos apurados. Basta ver como é que, ainda hoje, convive com os factos que já se apuraram sobre José Sócrates.

Agora percebe-se melhor porque é que os Comandos têm aquelas provas de selecção duríssimas. Uma marcha forçada de 80 km, com uma mochila de 30kg às costas, debaixo de um sol abrasador, já é difícil. Se, ainda por cima, os recrutas tiverem de transportar droga e diamantes escondidos no corpo, torna-se tudo mais complicado. Não há dúvida de que estas forças especiais portuguesas são tropas muito bem preparadas. Estão aptas a actuar em qualquer ambiente. Tanto se desenrascam no Casal Ventoso como na Cartier.

No fundo, trata-se de mais um episódio na nossa longa presença militar em África. Em 1415, D. João I toma Ceuta; em 1578, D. Sebastião perde-se em Alcácer Quibir; em 1895, Mouzinho de Albuquerque captura o Gungunhana em Chaimite; em 2021, militares portugueses traficam diamantes e droga em Bangui. Ainda não está feita a reflexão sobre a história portuguesa no Ultramar e agora temos de lidar com a questão do Ultragamar.

É pena Leopoldo de Almeida já não estar vivo, senão pedia-se ao escultor para acrescentar uma figura no Padrão dos Descobrimentos. Ficava assim: à frente, mantinha-se o Infante D. Henrique de caravela na mão, logo atrás, D. Afonso V de joelhos e apoiado na espada, depois, Vasco da Gama, seguido de um comando a vender-lhe maconha da boa.

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