Julgo que uma das maiores premências das democracias modernas é a sua abertura à participação da sociedade civil e, em especial, à participação das suas elites. A forma como os sistemas democráticos se deixaram aprisionar pelos aparelhos partidários, fomentou em todo o mundo o carreirismo, a corrupção e as suas reações mais óbvias, como o extremismo revivalista e o populismo.

Os independentes fazem cada vez mais falta à política, porque a legitimam e higienizam e porque, principalmente, dão testemunho de ética e sentido de serviço que tanta falta fazem à regeneração das democracias modernas e à convocação para a política das novas gerações de portugueses.

Um dos melhores exemplos, se não o melhor, em Portugal, da participação independente na política vem do atual Presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira.

Fui dos que não acreditei que Rui Moreira pudesse triunfar no primeiro ato eleitoral a que se propôs. Não obviamente pela sua capacidade, mas essencialmente por não contar com o incontornável apoio de um aparelho partidário.

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A verdade é que por mérito do próprio e por algumas razões peculiares do burgo do Porto, Rui Moreira ganhou. Os aparelhos pareceram ter “acomodado” o inusitado vencedor, ou porque lhe manifestavam apoio e se consolavam com isso, ou porque sentiam que não era pior ter um exemplo de tolerância partidária para “inglês ver”.

Mas Rui Moreira não se limitou a ser eleito e a sua voz, em muitos assuntos dentro e fora do concelho, começou a ser seguida e respeitada. Os aparelhos mexeram-se, tinham que se mexer, perante um fenómeno que ameaçava a sua prevalência e o poder exclusivo que emanava da sua influência e indispensável prescrição.

E estas dinâmicas de autoproteção montadas no sistema partidário e, por extensão, no sistema político, assumem uma gravidade intolerável quando invadem o sistema judicial e judiciário.

Aí todos ficamos em causa. A judicialização da política e o seu reverso são dos perigos mais elementares das civilizações contemporâneas e da forma como evoluem as democracias ocidentais de matriz neo-capitalista.

Claro que o caso Selminho está ferido de morte por ter sido tão exacerbadamente politizado. Apareceu no advento da última campanha eleitoral autárquica. Foi arquivado, com a devida presunção de inocência do Presidente Rui Moreira e volta a aparecer com uma inexplicável acusação, quando falta menos de um ano para o próximo ato eleitoral autárquico.

Sou jurista e conheço, por essa razão, o instituto do ónus da prova. Que vale também para a opinião pública e publicada.

Este é um caso claro de inversão do ónus da prova. Quem tem que explicar tudo a uma opinião pública atónita é o Ministério Público. Quem deve sofrer as consequências, civis e criminais, de manipulação, abuso de poder e tantas mais caso o processo volte a ser arquivado, são os magistrados envolvidos. Como deviam ser os inspetores da autoridade tributária, do SEF, da ASAE e tantos outros, quando estão em causa desmandos irreparáveis feitos sobre cidadãos, ao abrigo do inatacável e impune poder do Estado.

Temos que parar com isto! Responsabilizar as instituições democráticas para um novo caminho. De tolerância, sempre, de transparência também, mas ainda de ética e de responsabilidade social. E o meu ponto é que este desiderato dificilmente se atingirá se, como no famoso livro de Oscar Wilde, não se perceber, através do caso Rui Moreira, “a importância de se chamar Independente”.