Li com crescente espanto o artigo do deputado do PSD na Assembleia da República, Duarte Pacheco, na edição de 26 de fevereiro do Observador. Curiosamente, comecei por concordar com a primeira frase, em que escreveu que “o Centro Hospitalar do Oeste abrange uma extensa área do norte do distrito de Lisboa e sul do distrito de Leiria, hoje a funcionar principalmente em dois hospitais – Torres Vedras e Caldas da Rainha.”

Perante este primeiro parágrafo, cheguei a acreditar que se poderia seguir uma defesa das regiões do Oeste localizadas em zonas mais afastadas da capital, como é o caso de Caldas da Rainha ou de Óbidos, mas depressa percebi que o centralismo de Duarte Pacheco manda mais do que qualquer outra consideração – e a verdade é que se trata também de um vereador, ainda que sem pasta, da Câmara Municipal de Torres Vedras, eleito pela coligação Afirmar Torres Vedras (PPD/PSD.CDS-PP.PPM), na oposição. Nada contra, a diferença de ideias faz parte da democracia.

O que não faz parte do diálogo e do debate próprios da democracia é desconsiderar quem pensa de forma diferente e dizer inverdades, ou não apresentar qualquer argumento, para além dos que já são conhecidos de todos. Como o tal estudo, que terá sido encomendado à NOVA Information Management School “por unanimidade” da OesteCIM, a comunidade intermunicipal do Oeste, mas que aponta para diversas localizações, baseando-se em apenas dois critérios – o tempo e a distância – e ainda assim com uma diferença de poucos segundos, incluindo inexplicavelmente o concelho de Mafra, que não recorre ao Centro Hospitalar do Oeste.

Não, caro Sr. Duarte Pacheco, não é verdade que tenha existido consenso no seio da Comunidade Intermunicipal do Oeste quanto à decisão de encomendar um estudo para definir a localização do Novo Hospital. Os votos favoráveis de alguns autarcas foram acompanhados de declarações de voto em que expressaram reservas sobre a pertinência do estudo e dos seus critérios. Verificou-se até que um presidente de Câmara antecipou que não iria aderir às conclusões se a localização proposta fosse desfavorável ao seu território, conforme consta da ata 17/2020 da Reunião Extraordinária de 15.10.2020.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Não é também certamente consensual para as populações de Caldas da Rainha e de Óbidos, como não é para a maioria da população de Rio Maior e de diversas freguesias de Alcobaça e Peniche, como provam os mais de 13.500 subscritores de uma petição já entregue na Assembleia da República para que o assunto seja debatido em plenário parlamentar.

Duarte Pacheco escandaliza-se agora com a tomada de posição de Caldas da Rainha e Óbidos em face de uma decisão que é especialmente prejudicial para os dois concelhos. Mas não se ofendeu quando o presidente da Câmara do Bombarral, com base no relatório preliminar do estudo, afirmou pública e taxativamente, antecipando a decisão do governo, que o hospital seria contruído naquele concelho. Ou quando a entrega do estudo ao ministro da Saúde teve lugar em Torres Vedras, sem que antes tenha sido discutido, ou sequer apresentado, nos concelhos a que diz respeito, que foram informados do evento com poucas horas de antecedência.

Tão-pouco se escandalizou quando foi anunciada a criação de um grupo de trabalho constituído por pessoas próximas da equipa que redigiu o estudo e com ligações a Torres Vedras, encarregado de indicar a localização no prazo de poucas semanas.

Sem questionar a seriedade de seja quem for, não seria importante que a decisão fosse tomada por uma comissão técnica realmente independente, esperando também pela conclusão do estudo que, segundo o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, irá ser encomendado para definir a rede hospitalar que queremos ter em 2030? Qual é a pressa, Sr. Vereador da Câmara de Torres Vedras, Duarte Pacheco?

Diz o Sr. com vaidade mal digerida que Torres Vedras é “um concelho com mais população, com maior dinâmica de crescimento populacional, com maior dinamismo económico” – e que poderia ter pressionado para que o novo Centro Hospitalar fosse para lá e não para o Bombarral, como se estivesse a fazer um grande favor não se sabe muito bem a quem, nem porquê. E quem lhe garantiu previamente que vai para o Bombarral, se o estudo é limitado nas conclusões e ainda falta tomar a devida decisão política por parte do Governo? Nós, em Caldas, não precisamos dos seus favores, nem de ninguém, sendo verdade que não temos a proximidade de Torres Vedras em relação a Lisboa, nem a oferta privada de serviços de saúde de que dispõe. Caldas e Óbidos dispõem sim de um terreno equidistante dos núcleos urbanos, maioritariamente de domínio público, com todas as condições para instalar um Hospital de grande dimensão, para servir toda a região Oeste Norte, contíguo à linha do Oeste, ao nó da A8 e a pouco mais de 1 quilómetro da A15 e do IP6.

Para além disso, Caldas e Óbidos acolhem, entre residentes permanentes, sazonais e turistas, cerca de 3 milhões e 500 mil pessoas por ano, decorrentes da capacidade de atração – assente na cultura, na arte e no turismo – que poderá ficar comprometida com o fim de uma unidade hospitalar de proximidade.

Sendo escolhido o terreno de Caldas e Óbidos, a rede hospitalar pública fica a contar com um novo Centro Hospitalar do Oeste em rigorosa equidistância dos hospitais de Leiria, Santarém e Loures, garantindo desta forma cuidados uniformemente distribuídos nesta zona do território nacional.

Não nos venha por isso acusar de irresponsabilidade, Sr. Duarte Pacheco, quando tudo o que diz e escreve não passam de falácias sem qualquer rigor. Fomos eleitos para a Câmara com o movimento de independentes ‘Vamos Mudar’, mas temos tanta legitimidade como os que pertencem a partidos com assento na Assembleia da República, porque, felizmente, o Estado de Direito em Portugal assim o dita.

Duarte Pacheco é vereador sem pasta em Torres Vedras, mas já decidiu o destino do novo Centro Hospitalar do Oeste. Loucura no Oeste, como lhe chama, é querer retirar mais equipamentos aos concelhos mais distantes de Lisboa, ignorando a obrigação do Estado de promover a coesão nacional e o desenvolvimento socioeconómico das regiões.

Caldas é a única cidade de média dimensão da Região Oeste, com mais de 30 mil habitantes, que não dispõe de qualquer outra oferta de cuidados hospitalares. Perdeu nos últimos 10 anos praticamente todos os serviços de justiça, do Tribunal de Comarca à vara de direito comercial, as execuções e parte da jurisdição do Tribunal de Família e Menores. Se ficar sem a sua única unidade hospitalar, corre o risco de se transformar num concelho sem potencial de desenvolvimento.

Não nos venha por isso tentar iludir com narrativas demagógicas que podem convencer os incautos, mas não enganam as pessoas de bom senso que habitam a região do Oeste, a começar por Caldas da Rainha e Óbidos. Caldas nasceu há 500 anos da criação de um hospital, a partir das águas termais – e não vai desistir de lutar para manter nesta cidade e neste concelho o Hospital que tem desde a primeira hora da sua existência e que lhe deu origem.

Doa a quem doer.