Teria sido muito fácil e até simplista ter escolhido para título deste artigo um “A mudança na Europa em marcha”. Mas embora a França, Macron e a La République En Marche sejam relevantes e um alento, muito já foi trilhado e a Europa não é apenas as grandes nações.

Este é já o terceiro artigo que aqui publico sobre o processo de mudança política que está a suceder em vários países europeus e que, quero acreditar, vai contribuir para a mudança política, e consequentemente social e económica, da Europa enquanto espaço comum.

Em abril, antes da segunda volta das presidenciais francesas, deixei aqui expresso o que via de positivo em Emmanuel Macron. Confirmou-se então a sua vitória e ainda esta semana voltou a demonstrar os seus ímpetos reformista e europeísta, apresentando um conjunto de propostas concretas para uma melhor Europa.

Entretanto assistimos às eleições alemãs. Em Abril as sondagens indicavam uma sólida manutenção do eleitorado na CDU e no SPD, mas embora tenham sido os mais votados, ambos perderam eleitorado, sendo a derrota do SPD bem mais pesada. Confirmou-se pela negativa a entrada, com uma votação relevante, no parlamento da AfD, mas pela positiva o regresso dos liberais do FDP. A maioria do Bundestag permanece pró-europeu e nem o jogo de equilíbrios internos fará a Alemanha deixar de ser um dos alicerces do projecto Europeu. Pode acontecer que aumentem o nível de exigência para com os outros países, nomeadamente ao nível das finanças e na Zona Euro, o que não deve ser confundido com eurocepticismo.

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No rescaldo das eleições alemãs ouvi, inclusive do nosso ministro dos Negócios Estrangeiros, que com as eleições alemãs estava encerrado o ciclo eleitoral europeu, na perspectiva de quem governa os países, imagino eu, pois é o que condiciona a constituição do Conselho Europeu. Errado. A Áustria a 15 de Outubro e a República Checa 6 dias depois irão ter eleições. E podem haver mudanças, tendo por base a constância das sondagens. Na Áustria o Chanceler pode passar do SPÖ para o ÖVP, ou seja, dos socialistas (PES) para os populares (PPE). E na República Checa pode passar do CSSD para o ANO, ou seja, dos socialistas (PES) para os liberais (ALDE).

O que significa que a confirmarem-se estas mudanças o Conselho Europeu ganha uma nova configuração, um novo equilíbrio de forças. Não muda felizmente a convicção no projecto Europeu, que praticamente todos partilham, mas o apoio a uma necessária reforma da Europa, das suas instituições, a que Macron tem dado um impulso político e mediático forte e que a “família” liberal europeia (ALDE) tem vindo a defender com intensidade, sobretudo por Guy Verhofstadt no Parlamento Europeu, ganha mais força.

A confirmarem-se estas mudanças, os socialistas ficarão com apenas cinco líderes de governos no Conselho Europeu, o Partido Popular Europeu recupera para os nove (sem contar com Donald Tusk e Jean-Claude Juncker) e os Liberais alcançam os oito, confirmando assim serem a força política europeia que mais tem crescido na Europa. Se a estes se juntar, nem que seja na vontade de reformar a Europa, Emmanuel Macron, quem acredita numa Europa como espaço comum, de partilha de liberdades e valores, não pode deixar de estar confiante que a democracia e a tolerância irão prevalecer na Europa, não permitindo que extremismos condicionem as nossas vidas.

Por muito que alguns tentem construir narrativas, são ultrapassados pela realidade e derrubados pelos factos. Nenhum extremismo, seja à direita ou à esquerda, tem dimensão ou a tem ganho em termos europeus. E mesmo em cada um dos países a relevância é questionável. Até na Grécia, onde a extrema esquerda venceu, fazendo com que algumas vozes por cá decretassem a mudança na Europa, o governo local confrontado com a realidade rapidamente moderou o seu socialismo.

Se em cada acto eleitoral na Europa devemos estar atentos e preocupados, também o devemos fazer ao longo dos tempos. Seja nas decisões que cada Governo vai tomando, mas também naquilo que vai acontecendo nas instituições europeias. Seja no âmbito das finanças e economia, em questões de migrações ou segurança, entre outras.

Por isso devemos estar preocupados, não apenas com potenciais resultados eleitorais, mas com derivas durante governações. Se não deixa de ser bom sinal ver a suavização do governo de Tsipras, abandonando um discurso extremista, populista e anti-europeu, é preocupante assistir às derivas populistas, anti-democráticas e de limitação das liberdades, de governos que integram famílias europeias de forte pendor europeísta, como acontece na Hungria e na Polónia, com partidos do PPE.

Sou de uma geração que ainda se lembra de estar em filas para transitar entre Elvas e Badajoz, algo que me é tão difícil de explicar aos meus filhos como que quando tinha a idade deles só tinha 2 canais de televisão. O projecto Europeu enquanto espaço comum de liberdades e oportunidades, mas também de desafios e responsabilidades, deverá sempre apontar para um projecto sustentável de vida dos cidadãos. Daqueles que nasceram europeus e daqueles que reconhecem na Europa como o local onde podem viver em paz. A Europa é um futuro que devemos preservar. Um puzzle em permanente evolução, só possível com cada uma das suas peças devidamente sustentada e alinhada.

Esta mudança que tem vindo a ser efectivada em várias peças do puzzle europeu, como referi no primeiro artigo, começou a norte e leste. Já chegou ao centro da Europa. Acredito que a sul, nomeadamente Portugal, chegará também.

Fundador Iniciativa Liberal