Dez anos depois do susto que nos devia ter despertado, dez anos após o início de um período de sacrifício que o país, no seu todo, levou a cabo, eis que o pântano, o triste fado, o resultado óbvio do socialismo, o que lhe quisermos chamar, volta a cair sobre as nossas cabeças. 2020 foi um ano peculiar que teve a particularidade de pôr a nu o que a maioria ainda se recusa a ver: que Portugal está mais pobre, mais endividado, que continua sem capital e que desistiu da educação. Um país em que as perspectivas de futuro minguaram porque se os cidadãos as tiverem facilmente desesperam. Com a morte do cidadão ucraniano, Ihor Homenyuk, é também um país que perdeu o que lhe restava, a humanidade com que tratávamos os outros.

(há quem vingue na vida como militante do PS. Tal não é ter perspectiva de vida, mas uma forma de servidão. É certo que o fazem de boa vontade, mas a aceitação que para singrar é preciso possuir um cartão de militante de um partido político é já de si uma derrota, um atestado de inexistência).

O que é confrangedor é o quanto o Portugal de 2020 não difere do de 1950. A tal falta de perspectivas, a tal subordinação à narrativa dominante. Não é difícil perceber o quanto um militante ou dirigente do PS em 2020 encaixa na perfeição no militante ou dirigente da União Nacional de há setenta anos. O mesmo tipo de comportamento, os mesmos procedimentos, a mesma negação dos factos, a mesma interpretação do que se aceita, o mesmo afastamento do mundo real, o mesmo atirar das culpas para os outros, a mesma cegueira. Os mesmos erros, a mesma incapacidade em os reconhecer e de os corrigir.

À semelhança de 1950, os rostos de uma eventual mudança foram devidamente afastados. Em 2020, não há outra solução que não seja o dinheiro que se espera de Bruxelas. Não há quem lidere uma alternativa. Um drama político que as eleições presidenciais bem ilustram. Os candidatos são pobres porque repetem a mantra de décadas e o que tenta ir além é um desconhecido incapaz de se revelar. Ana Gomes, esperemos que sem que se aperceba, defende um estado policial; Marisa Matias e João Ferreira concorrem para fazerem um frete aos respectivos partidos, o que já não é mau se tivermos em conta a desgraça nossa do que defendem. André Ventura não passa de um tangas (peço desculpa, mas não encontro outra expressão para ilustrar a fraude política) que atira para o ar frases que ilustram problemas para os quais não tem qualquer solução. Marcelo Rebelo de Sousa é o espelho de um país à deriva que segue ao sabor das oportunidades. Sem dificuldades de maior vai pôr e dispor quando Costa sair, o Parlamento ficar dividido e os governos sem força para confrontar um presidente popular e instalado. A intervenção de Marcelo na questão da polícia é um exemplo do que vamos assistir a partir de 2021. Falta Tiago Mayan Gonçalves com um discurso que está à margem para melhor dos acima referidos, mas que, à semelhança de Henrique Neto há cinco anos, não representa uma alternativa que o país deseje.

O certo é que, como em 1950, gostamos de narrativas, de algo que justifique o fracasso, que o desculpe, que o empurre para a frente, para a próxima geração. 2020 foi mais um ano dessa narrativa. Para a história pouco mais se passou que venha a ser digno de registo.

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