Crescem rumores sobre a saúde mental de Donald Trump e a consequente incapacidade deste para o exercício do cargo de presidente dos EUA. A personalidade instável, e o seu comportamento errático e imprevisível, têm levantado fortes dúvidas sobre a sua saúde psíquica. Entretanto, surgiram informações na imprensa, provenientes de membros do staff do presidente, que revelam que este apresenta uma tendência para alterações súbitas do humor, aborrece-se facilmente, tem acessos de raiva quando não consegue prosseguir os seus objetivos, é imprevisível, manipulável e sugestionável. Nos últimos dias vários psiquiatras norte americanos vieram discutir publicamente este tema, aumentado as suspeitas sobre a normalidade da personalidade de Trump.

Os recentes acontecimentos políticos reforçam as dúvidas sobre a capacidade do presidente para o exercício do cargo. Por exemplo, foi noticiado que Trump terá entregue informação classificada ao ministro dos negócios estrangeiros russo Sergei Lavrov e ao embaixador russo nos EUA Sergei Kislyak durante um encontro na sala oval. Além disso, num ato aparentemente impulsivo e emocional, o atual presidente demitiu o diretor do FBI James Comey que se encontrava a liderar uma investigação sobre as ligações da Rússia aos membros da campanha de Trump.

Na última cimeira da Nato, em Bruxelas, pudemos observar Trump, numa atitude intempestiva e quase infantil, a empurrar o ex-primeiro ministro do Montenegro, Milo Dukanovic, para ficar à frente na foto de grupo. Este comportamento, desadequado e pouco cordial, revela traços narcísicos da personalidade de Trump, dado que o objetivo era estar no centro das atenções e ser admirado. De resto, o psicólogo norte americano John D. Gartner asseverou que o seu comportamento público é suficiente para afirmar que sofre de um “narcisismo maligno”. Acrescentou ainda que, na sua opinião, Trump é mentalmente doente e temperamentalmente incapaz para ser presidente.

Perante estes dados levantam-se várias dúvidas. Será que Trump tem uma doença psiquiátrica? Será que dispõe de condições de saúde psíquica para o cargo que desempenha? E o que devem fazer os psiquiatras quando um indivíduo, apesar de eleito democraticamente, aparenta reunir critérios para um diagnóstico de doença psiquiátrica?

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Sobre este tema, existe um dilema ético importante. O código de ética da Associação Americana de Psiquiatria proíbe que se faça qualquer diagnóstico a um individuo, sem que este tinha sido observado pessoalmente por um psiquiatra, estando ainda vedada a divulgação pública do diagnóstico psiquiátrico, sem o consentimento do próprio. Em 1973, esta associação incluiu, no seu código de ética, a chamada “Golwater Rule”. O caso remonta a 1964, altura em que a revista Fact elaborou uma sondagem junto de psiquiatras, no sentido de saber se o então candidato à presidência Barry Goldwater tinha condições suficientes de saúde mental para o exercício do cargo. A maioria dos cerca de 2000 psiquiatras que participaram no inquérito responderam que não. O candidato reagiu e, apesar de ter perdido a eleição, processou a revista, tendo ganho a ação judicial.

O atual código de ética impede que os psiquiatras se pronunciem sobre a saúde mental de figuras públicas. Mas será que os psiquiatras deverão manter-se silenciados perante o caso de Donald Trump quando essa pessoa, pelo poder conferido pelo cargo que exerce, pode causar danos coletivos irreparáveis? Com base neste argumento, vários psiquiatras, como é o caso de Bandy Lee da universidade de Yale, têm levantado a possibilidade de se discutir abertamente a saúde mental do presidente, já que este tem acesso a armas nucleares e, através de um comportamento patológico, pode colocar em risco a vida de milhões de pessoas em todo o mundo. A psiquiatra Nassir Ghaemi defendeu ainda que, em democracia, a sociedade tem o direito de saber informações sobre a saúde mental dos seus líderes.

Se é verdade que ninguém está a cima da lei, também é verdade que ninguém está livre de sofrer de uma doença mental, nem o próprio presidente dos EUA. Embora este tema seja bastante complexo, existe uma pressão crescente para que Trump siga o exemplo de Richard Nixon, e venha a ser forçado a resignar. Mas, do meu ponto de vista, dificilmente resignará por razões de saúde mental, já que o próprio não irá admitir essa possibilidade. Além disso, a eventual patologia psiquiátrica em causa poderá não ser, por si só, suficiente para a sua destituição. Todavia, tudo leva a crer que serão os erros sucessivamente cometidos pela sua instabilidade e a incapacidade para o cargo que irão terminar com o seu mandato; ou seja, tudo aponta para que o seu mandato presidencial não venha a ser totalmente cumprido.

Médico Psiquiatra