Quando, já há 15 dias, Pedro Nuno Santos comunicou que: “A TAP devolve dinheiro aos portugueses todos os dias com os negócios que faz”, talvez devesse ter explicado que não é a todos os portugueses que o dinheiro é devolvido, e que uns compatriotas recebem mais (um balúrdio) do que outros (zero). Mas a realidade é que ele avisou. Portanto, que ninguém se finja escandalizado ao descobrir que a TAP deu 500 mil euros a uma administradora que saiu da empresa e que, entretanto, foi nomeada Secretária de Estado do Tesouro. Agora, resta confiar na palavra do Ministro das Infraestruturas e esperar pacientemente que seja a nossa vez de embolsar uma maquia.

Há quem ache estranho que, saindo a administradora a meio do mandato, tenha ainda assim recebido o valor total das remunerações. Não é economicamente racional, isto de pagar por trabalho que não é efectuado. Pelo menos, é o que me garante o departamento financeiro do Observador, sempre que proponho que me paguem mais crónicas do que as que escrevo. Enfim, picuinhices de contabilista.

Mas, de facto, normalmente não faz sentido pagar para não trabalhar. Sucede que estamos a falar da TAP, uma empresa cuja gestão ruinosa faz pensar que é perfeitamente sensato recompensar uma administradora por não administrar. Se, de cada vez que administra, causa prejuízo, sai mais barato dar-lhe meio milhão para estar quieta. Na realidade, isto até nos saiu barato. Se calhar, até valia mais gastar 3 ou 4 milhões para correr com o Conselho de Administração inteiro e deixar aquilo vazio, em auto-gestão. Em princípio, o vazio não anda de BMW novo, nem tem PT casado com alguém que precisa de emprego.

Às tantas, os mails que a Administração da TAP mandou aos trabalhadores, a perguntar se iam aderir à greve, também eram para oferecer dinheiro a quem não trabalha. Deve ser um costume da empresa.

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A comunicação social tem-se referido aos 500 mil euros como “indemnização”, mas seria mais rigoroso chamar-lhe “resgate”, que é o que se paga a quem sequestra um lugar no Conselho de Administração. Parece mesmo que o povo português recebeu uma nota escrita com letras recortadas de jornais, a dizer: “oU Me pagam 500.000 eM NotAS dE 10 euROs, OU aPAreçO amanhã pArA TRABALhar!!! eSTou a FALaR a sériO, voU mESMO DespacHAR aSSuntOs!” Há pessoas que vão a uma festa e saem de lá com restos comida. Depois há um tipo muito especial de abusador que nem sequer vai à festa, mas pede para lhe mandarem comida. Vai acondicionada em TAPperwares.

A TAP, através do Presidente da República, já fez saber que não só a indemnização é legítima, como até devia ser 3 vezes maior. Depois de “foram só 400” casos de pedofilia, Marcelo vem agora com “foram só 500” mil euros de despesa. A secretária de Estado até nos fez uma atençãozinha. Aliás, a pista está no nome: inde-mni-zação. É mni, quando podia ser mxi.

Dada a famigerada dificuldade em chegar à fala com a TAP, vou aproveitar este biscate que Marcelo está a fazer na companhia aérea para lhe pedir que altere o meu lugar no voo para Bilbau que vou fazer em Janeiro. Queria marcar uma coxia numa saída de emergência, mas o site está sempre em baixo. Se o Sr. Presidente me fizer o obséquio, fico-lhe eternamente agradecido. Eu e as minhas pernas.

Entretanto, surge agora a hipótese de Alexandra Reis não ter saído voluntariamente, mas sim por vontade da TAP. O que é ainda mais estranho. Porque é que a TAP, uma empresa em dificuldades económicas, incorreria em tal despesa para se ver livre de uma administradora que, pelos vistos, é competente o suficiente para ter ido logo para a NAV e depois para o Governo? Ou, afinal, ela é tão incompetente que até a TAP – a TAP, por amor de Deus! – torce o nariz? Não é costume António Costa nomear incompetentes para o seu Governo.

Por falar no Primeiro-Ministro, há quem compare estes 500 mil euros aos 300 mil euros que o secretário de estado adjunto do PM, escolhido pela sua competência e ligação próxima a António Costa, atirou para o lixo em Caminha. É que, em ambos os casos, há dinheiro público a ser pago por trabalho que não é feito.

Quer dizer, para dizer a verdade, ninguém compara. Fui só eu que quis trazer este caso à colação. Tenho pensado muito nele, sempre com estupefacção. Não pela idiotice ou venalidade, essas encontram-se em todo o lado. O espanto é pelo Primeiro-Ministro, de entre vários jovens socialistas com sangue na guelra, ter escolhido pessoalmente este bronco ou vigarista para estar tão próximo de si. Porquê, António Costa? A curiosidade está-me a matar. Estou quase, quase a filiar-me no PS, só para alguém lá dentro me explicar.

Mas não espanta muito mais gente. Na entrevista à Visão, quando Costa, enfadado, concede falar de casos, indica apenas o de Manuel Pizarro. Como se todos os outros fossem da mesma natureza, um atraso de um dia numa declaração administrativa, em vez de, como o de Caminha, um golpe/erro absurdo (riscar o que não interessa) cometido por um íntimo do PM. Mas, como Costa estava a ser entrevistado por dois experientes jornalistas que acharam por bem não perguntar se não é diferente o caso Pizarro do caso Miguel “Anjinho ou Aldrabão” Alves, deve ser embirração minha. O PM bem tinha dito que os casos e casinhos não o tinham feito perder um segundo. O que eu não sabia é que ele se estava a referir ao tempo que os entrevistadores lhe tinham tomado com o tema.

Regressemos à indemnização. Numa altura em que tem cada vez menos rotas nas mãos, a companhia revela-se uma mãos-rotas. Já havia a expressão “trabalhar para aquecer”, usada quando alguém trabalha e não recebe. Agora, temos “não trabalhar para aquecer”, quando alguém não faz nada e nós é que ficamos a arder. Há uns anos, a TAP lançou uma campanha publicitária chamada “De braços abertos”, que tinha uma música da Mariza, Paulo Flores e Roberta Sá. Talvez seja altura de actualizar a assinatura de companhia. Em vez “de braços abertos”, faz mais sentido “mãos ao ar!”

PS – Já depois de ter escrito a crónica, foi noticiado que Pedro Nuno Santos e Fernando Medina pediram esclarecimentos à TAP sobre a indemnização de Alexandra Reis. A notícia não explica se o esclarecimento requerido é uma forma de censura ou um pedido de informação para saber de que forma é que eles também poderão ter direito a meio milhão por, tal como a sua colega de Governo, não trabalharem na TAP.