Por estes dias, António Costa deve andar assediado por uma tentação: provocar eleições antecipadas no próximo ano. Na noite do dia 1 de Outubro, Costa e o PS tentaram convencer o país que as eleições autárquicas eram simultaneamente eleições legislativas. A vitória nas eleições locais daria ao PS e a Costa a legitimidade política nacional que não conquistaram em 2015. Costa de resto não falou de outra coisa durante toda a noite. A obsessão de Costa em legitimar-se politicamente, depois de dois anos com PM e gozando de uma maioria parlamentar estável, mostra um desconforto evidente. O PM continua incomodado com a sua derrota eleitoral de 2015. Obviamente, e ele sabe muito bem, a vitória nas eleições autárquicas não compensa a derrota nas eleições legislativas.

Costa precisa de uma vitória numas eleições legislativas, e se possível com maioria absoluta. Mataria, de uma vez, a derrota que o prossegue e o mito de Sócrates, o único líder socialista a conquistar uma maioria absoluta. Neste momento, só uma questão conta na cabeça de Costa: qual o melhor momento para ganhar as eleições, em 2018 ou em 2019? O PM sabe que a economia nacional, embora a melhorar, continua frágil e muito exposta a choques externos. Olhando para a Europa e o mundo, ninguém acredita que tudo corra bem até Outubro de 2019. Há, em particular, uma ameaça que pode ter consequências negativas para a economia europeia: um “hard Brexit”. As negociações entre a União Europeia e o Reino Unido estão a correr mal e, com um governo britânico fraco e dividido, não há qualquer certeza de que se chegará a um acordo que evite o desastre. Um “hard Brexit” pode prejudicar a economia portuguesa e atrapalhar o resultado eleitoral de Costa. Seria mais seguro ir para eleições antes de Março de 2019.

A política interna será muito diferente depois das eleições de 1 de Outubro. A derrota nas eleições autárquicas foi demasiado grande e o PCP vai radicalizar as suas posições. Os sindicatos e as ruas terão que compensar de algum modo o que os eleitores locais tiraram. Para alcançarem um resultado aceitável nas próximas eleições legislativas, os comunistas só podem seguir uma estratégia: oposição ao governo. A política de apoio ao governo fracassou eleitoralmente. E agora já não há Passos Coelho para justificar o apoio ao governo socialista. A partida de Passos Coelho matou os anos de austeridade como justificação para escolhas políticas. O dia 1 de Outubro enterrou definitivamente os anos de 2011 a 2015.

O PSD vai mudar de líder. Rui Rio deverá ser o senhor que se segue e vai levar o PSD para o centro. Será por isso muito difícil colá-lo à herança de Passos Coelho. Do ponto de vista eleitoral, Costa tem interesse em ir para eleições antes de Rio consolidar a sua liderança, aproveitando a fraqueza dos sociais democratas. Com Rio na liderança do PSD, vai ainda crescer a dúvida nos camaradas da geringonça. Com Passos à frente do PSD, todos sabiam que nunca haveria um bloco central, mas com Rio, tudo muda. O bloco central passa a ser uma possibilidade. E para Costa faz todo o sentido. Colocaria o PS no centro do sistema político português, reduzindo o PSD a um aliado menor, um pouco como o PCP e o BE.

Obviamente, Costa teria que encontrar uma boa justificação para provocar eleições antecipadas e depois convencer os portugueses da justeza da sua decisão. Nada de que a máquina de propaganda socialista não seja capaz. O maior obstáculo à estratégia de eleições antecipadas será o Presidente da República. Rebelo de Sousa não quer eleições antecipadas nem uma maioria absoluta do PS. Mas vai ter que trabalhar muito para evitar uma e a outra. A política dos afectos deixou de ser suficiente. A partir de agora, para Marcelo, começa o tempo das lutas políticas. E não começa bem se não conseguir influenciar a escolha do novo líder do PSD e se limitar a assistir à eleição de Rio, a opção menos desejada por Belém. Chegou o momento de Marcelo enfrentar a questão política fatal: quem serão a partir de agora os seus aliados?

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