A Alemanha e a China emergem claramente como os líderes do pelotão da saída da crise económica. Mas enquanto Beijing demonstra como o uso descomplicado da força lhe serve para impor a sua liderança no mundo, na Alemanha as complicações derivadas da sua história e do seu modelo económico limitam a sua capacidade no campo externo.

As crises são momentos de reavaliação. E, nas crises económicas, o timing de saída da crise interessa: os países são avaliados não só pela sua resistência, mas pela rapidez relativa com que a retoma económica ocorre.

Torna-se hoje claro que Berlim e Beijing estão no pelotão da frente da recuperação económica. Os números dos dois países desta semana ultrapassam as expectativas mais otimistas. A China espera que o seu PIB cresça 2,5% este ano (e não 1,8%, como anteriormente anunciado). O ministro da Economia alemão, Peter Altmaier, disse que a economia do país está “a começar a recuperar mais rapidamente do que ousávamos esperar”. Mais, a recuperação económica dos dois países reforça-se mutuamente, através da estreita cooperação comercial que existe entre os dois.

Em ambos os casos foi a força dos Estados que permitiu uma resposta eficaz na gestão da pandemia e o investimento público, que na Alemanha ultrapassou 40% do PIB, foi crucial no apoio ao tecido empresarial e aos consumidores. Na China, a crise acelera a expectativa de paridade com os EUA para 2028, 2 anos mais cedo que o previsto.

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Em comparação, os Estados Unidos estão a braços com a pior recessão desde os anos 30, com os desempregados a atingir os astronómicos 48 milhões, e em França agrava-se a dívida para níveis comparáveis aos de Itália.

No plano da política externa, o contraste entre a China e a Alemanha mantém-se forte. No encontro de terça-feira em Berlim entre os chefes da diplomacia dos dois países, salta aos olhos. Enquanto a China se mostra cada vez mais assertiva na imposição dos seus interesses, a política externa alemã mantém-se presa por condicionantes históricas e económicas. A Alemanha é a economia do mundo mais orientada para as exportações, com cerca de metade do seu PIB a derivar das exportações. O ministro alemão Heiko Maas tentou mostrar maior assertividade face ao estatuto de Hong Kong e ao acesso da comunidade internacional à província de Xinjiang. Mas sobre a questão crucial de se a Alemanha irá proibir a Huawei de participar na construção da rede 5G no país, o ministro manteve as cartas junto ao peito, deixando claro que não vai seguir a linha dura sobre a China favorecida pelos EUA: “Não é do nosso interesse que a China e a Europa se afastem”.

Ainda assim, há sinais de um ativismo alemão face à politica externa europeia nas últimas semanas. O mesmo Maas, no discurso em Paris ao corpo diplomático francês na segunda-feira passada, anunciou que a presidência da União Europeia que foi assumida pela Alemanha em junho pretende iniciar um novo ciclo na política externa europeia. Depois de semanas de intenso ativismo nas diversas crises na vizinhança europeia – Bielorrússia, Líbia, Líbano, conflito grego-turco no Mediterrâneo —, Maas determina que é fundamental que a Europa construa as condições para que possa, no futuro, tomar livremente as suas decisões de polótica externa, em particular as que se referem à sua vizinhança. Oxalá.