O Prémio Sveriges Riksbank em memória de Alfred Nobel de 2015 foi atribuído a Angus Deaton, doutorado pela Universidade de Cambridge e Professor há mais de três décadas na Universidade de Princeton. Deaton começou por ser essencialmente um microeconomista centrado na análise do consumo e do rendimento que, gradualmente, alargou o seu campo de investigação a questões de maior abrangência no domínio da economia política institucional e do estudo da pobreza e do desenvolvimento.

A fundamentação do prémio destaca três contributos distintos, mas todos relacionados com a análise do consumo. O primeiro foi o seu trabalho conjunto com John Muellbauer no âmbito da estimação da procura corporizado no “Almost Ideal Demand System” apresentado na American Economic Review em 1980. O segundo foi o seu contributo para a análise da relação entre consumo e rendimento, prosseguindo linhas de investigação avançadas por economistas como Milton Friedman e Franco Modigliani e focando-se em particular na sua avaliação. O terceiro, e porventura mais saliente, foi a sua investigação sobre a pobreza, a comparação de níveis de vida e o desenvolvimento, com amplo suporte empírico em inquéritos aos agregados familiares.

O trabalho de Angus Deaton com vista ao aperfeiçoamento das comparações de níveis de vida tem-se revelado especialmente importante para um melhor entendimento dos diferentes níveis de desenvolvimento assim como da evolução dos mesmos ao longo do tempo. Neste domínio, e em boa parte devido aos seus contributos, a compreensão das semelhanças e diferenças nos padrões de consumo de bens e serviços entre sociedades e no interior de uma mesma sociedade tem assumido uma relevância crescente tanto a nível da investigação como enquanto guia para as políticas públicas.

Muitas das principais ideias de força do trabalho de Angus Deaton ao longo das últimas décadas encontram-se reunidas de forma (relativamente) acessível no livro The Great Escape: Health, Wealth, and the Origins of Inequality (Princeton University Press, 2013). Nessa obra, de difícil catalogação nos moldes ideológicos tradicionais mas com numerosos contributos de grande valor, Deaton procura explicar o extraordinário processo de fuga à miséria e pobreza generalizada que se desenvolveu ao longo dos últimos três séculos. Os avanços em termos de crescimento económico e qualidade de vida foram extraordinários e sem precedente na longa história da humanidade, tendo também sido acompanhados do aparecimento de desigualdades sem precedentes entre diferentes partes do mundo.

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A abordagem de Angus Deaton aplicada à análise das inovações e dos sucessos (assim como dos insucessos) civilizacionais dos últimos séculos pode ser legitimamente inserida na mesma categoria, em sentido lato, de estudos de economia política institucional com abordagem interdisciplinar desenvolvidos por autores como Mancur Olson, William Easterly ou Elinor Ostrom.

Num tópico particularmente controverso – o da ajuda internacional ao desenvolvimento – Deaton alinha em grande medida com Easterly na crítica enérgica aos efeitos prejudiciais dessa ajuda sobre o desenvolvimento institucional dos países mais pobres. Sem deixar de reconhecer os efeitos positivos de curto prazo que as transferências dos países mais ricos para os mais pobres podem ter em matérias importantes como os cuidados de saúde, Deaton alerta para os graves danos que essas transferências produzem a nível institucional. De facto, ao propiciar o desenvolvimento e perpetuação de estruturas rentistas e de governos opressivos e ineficazes, a ajuda internacional pode constituir-se como um dos principais obstáculos ao desenvolvimento. A respeito destes temas, vale também a pena ler o recente texto de Angus Deaton publicado na Review of Austrian Economics intitulado “On Tyrannical Experts and Expert Tyrants”, motivado precisamente pelo livro The Tyranny of Experts, de William Easterly.

Globalmente considerados, os contributos de Angus Deaton são um exemplo do melhor que a ciência económica contemporânea tem para oferecer, conjugando o individualismo metodológico, uma sólida base conceptual e o trabalho empírico rigoroso e devidamente sustentado.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa