A demissão de José Azeredo Lopes é o desenlace final de uma das tradições mais presentes deste governo: a descentralização de responsabilidades. Foi assim com o Infarmed, em que António Costa disse uma coisa e o ministro da Saúde fez outra; foi assim nos incêndios de 2017, culpando a ANPC quando foi o PS a encher a Proteção Civil de indicações políticas; e foi assim no caso de Tancos, em que o ministro da Defesa “não sabia” algo que o seu chefe de gabinete admite ter sabido.

Neste governo, a responsabilidade é consecutivamente descentralizada. Do executivo para as agências governamentais, de ministros para chefes de gabinete e, se necessário, de Costa para os seus ministros. Interrogo-me, sinceramente, a quem apontariam o dedo em caso de crise financeira – ao porteiro? – na medida em que o primeiro-ministro parece ser o último a saber tudo o que não envolva boas notícias. É mais um último-ministro do que um chefe de governo.

Mas é importante, depois de mais uma tentativa de descentralizar responsabilidades, que não concentremos excessivamente a crítica. António Costa é o rosto e o maestro do desafino, mas a orquestra tem outros solistas de péssima prestação. O que se torna ainda mais notório após a saída de Azeredo é o problema deste governo com áreas que envolvem soberania nacional e autoridade do Estado.

Hoje, Portugal tem um ministro da Administração Interna que faz campanha eleitoral em áreas ardidas, um ministro das Finanças que não se mexe um centímetro para corrigir a opacidade do Eurogrupo e um ministro dos Negócios Estrangeiros que desconsiderou o compromisso com a NATO ao preferir a Rússia ao Reino Unido no caso Skripal. Azeredo Lopes era inapto para o seu cargo, evidentemente. No entanto, não estava sozinho no ramalhete.

Para um governo que tem a sorte de uma conjuntura sorridente, o que facilita a gestão do plano interno, exigia-se mais na preservação da imagem externa do país. E, como admitiu a eurodeputada Ana Gomes, o caso de Tancos danificou-a tragicamente.

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