No que respeita a apoios do Estado à economia, com recurso a fundos escassos ou inexistentes, temos de questionar: como vamos ajudar à sobrevivência das empresas com dificuldades? Com que empresas vamos contar quando a crise sanitária estiver controlada (mitigada) e como vamos promover a recuperação económica? Deve existir uma orientação estratégica.

Quanto às empresas, os apoios deverão estar vocacionados para a tesouraria imediata e a estrutura de capital.

Apoio à tesouraria

Para a tesouraria imediata, os subsídios já previstos devem chegar rapidamente:

  • No caso das empresas encerradas (ou obrigadas a encerrar), uma compensação por perdas imediatas, justificada através da quebra da faturação, acrescida dos gastos com o pessoal, já declarados, e que não se encontram a laborar; e
  • Para as empresas com perda de rendimentos, uma compensação direta e imediata em percentagem das quebras.

O cálculo dos apoios deve ser feito automaticamente pelos sistemas usados pelos serviços públicos, sem estar sujeito a novos formulários de pedidos. Os formulários exigem o preenchimento de informação redundante, originam custos de contexto desnecessários e erros que só prejudicam quem mais precisa de apoio imediato.

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Em substância, a informação agora pedida já é comunicada pelas empresas e pelos contabilistas – a faturação, via e-fatura; os dados do pessoal, via Declarações Mensais de Rendimentos (DMR), uma para a Autoridade Tributária e Aduaneira, outra para a Segurança Social. Estas são informações mensais, no caso da faturação com indicação diária.

O apoio à tesouraria pode também consistir em:

  1. Devolver de forma imediata os pedidos de reembolso de IVA, de IRC e IRS que estejam pendentes e pagar em cinco dias os pedidos entretanto efetuados;
  2. Suspender os pagamentos por conta; e
  3. Pagar aos fornecedores em prazo não superior a 30 dias.

Apoios à recapitalização

No que respeita aos apoios mais estruturantes, e de médio prazo, a solução pode passar pela recapitalização das empresas. Algumas já apresentavam estruturas muito débeis, com resultados negativos sucessivos; outras perderam, e vão continuar a perder, capital próprio, em resultado da atual crise. A recapitalização por apoios do Estado pode ser estruturada em instrumentos de dívida, convertíveis em capital próprio, através do cumprimento de métricas, como o volume de negócios, o EBITA e o volume de emprego.

Neste contexto, o Banco de Fomento deve ter um papel determinante ao financiar empresas viáveis, ou em condições de se tornarem viáveis, através da apresentação de planos de negócios que demonstrem a sua capacidade em sustentar as respetivas atividades e que contribuam para a necessária recuperação económica. A solução de financiamentos que sejam convertíveis em subsídios não reembolsáveis, enquanto instrumentos de capital próprio, visam compensar o sucesso.

E como vai o Estado financiar para estes apoios?

Num Estado cujo paradigma da receita corrente está suportada em mais de 90% em impostos, em que IVA, IRC e IRS representam cerca de 80%, em média, e com a crise económica que se vive, não tenhamos ilusões, ou vêm fundos comunitários a título de solidariedade ou a dívida pública vai crescer.

O papel dos contabilistas

Com o atual estado da economia, os contabilistas estão cada vez mais sobrecarregados com obrigações declarativas, requerimentos e prazos que agravam uma situação profissional já pouco sustentável.

Os pedidos de apoio das empresas e dos cidadãos ao Estado tem que ser uma responsabilidade assumida pelos organismos públicos, a quem compete esta função. Se os apoios são considerados por via da faturação, informação comunicada mensalmente, com registos diários, porque são necessários cálculos e declarações de um contabilista certificado?

Se, por outro lado, alguns apoios dizem respeito a compensação por salários, porque não são calculados automaticamente através das informações já recebidas pelas DMR, com preenchimento direto no portal da Segurança Social?

Os contabilistas são mais importantes na recolha e interpretação dos dados reais, elaboração de estimativas e previsões, aconselhamento sobre caminhos alternativos e procura de soluções. Assim os empresários, sobretudo das PME, entendam e queiram usar os seus vastos conhecimentos, e não como meros calculadores de impostos.

Os contabilistas andam desgastados, mal remunerados, pouco reconhecidos e ainda sofrem a culpa nos insucessos das medidas nos apoios às empresas. Os contabilistas podem acrescer muito mais valor às empresas noutras tarefas, que estas, por vezes, nem sabem que necessitam.