No próximo domingo, não há eleições para câmaras municipais e juntas de freguesias nos 308 concelhos do país. No próximo domingo, há apenas eleições no concelho de Loures. Ou ainda mais exactamente: no próximo domingo, em Loures, há um referendo sobre André Ventura, professor universitário e comentador de futebol. Eis o que podemos concluir da conversa nacional sobre as próximas eleições.

Como chegámos aqui? Aparentemente, porque numa entrevista em Julho, onde explicou que a sua prioridade são os transportes, o candidato do PSD também notou que membros da comunidade cigana de Loures não cumprem a lei. É uma afirmação que pode ser verdadeira ou falsa. Se verdadeira, Loures tem um problema, maior ou menor; se falsa, então André Ventura deveria ter um problema, por difamar cidadãos exemplares. Significativamente, ninguém se atreveu a fazer um fact-checking. A oligarquia preferiu passar logo à rotulagem — racista, xenófobo, populista.

Haverá quem argumente: o problema não é o comportamento de uns quantos munícipes de Loures, mas o modo como André Ventura “explorou” o tema. Vamos entender-nos: não há no que Ventura afirmou qualquer vestígio de “racismo” ou “xenofobia”. O seu ponto de partida não podia, aliás, ser mais claro: “Temos de ser todos tratados como iguais”. As acusações de racismo são obviamente mentira. Então porque apareceram? Porque este Verão, a nossa oligarquia precisava de inventar um Trump de palha, desse por onde desse. À esquerda, para demonstrarem a nova teoria de que Portugal é um Estado do sul dos EUA, onde só o BE nos protege da segregação racial; à direita, para se demarcarem da “direita radical” e demonstrarem que, embora não tendo ainda aderido ao PS, já são inofensivos. Pelo meio, tratava-se de atirar mais um escândalo aos pés de Passos Coelho, para garantir que as autárquicas seriam mesmo o seu fim. Enfim, não foi tanto André Ventura que quis “explorar” os ciganos, mas a nossa oligarquia que cinicamente quis “explorar” André Ventura.

A campanha devia ter liquidado o “candidato dos ciganos”. Mas não liquidou. É que André Ventura não reagiu como previsto, recuando aos tropeções com desmentidos e desculpas. Em debate, provou uma inteligência e uma sofisticação acima dos seus adversários. Não foi preciso mais para fazer dele o herói de cidadãos fartos do concurso de misses do “politicamente correcto”.

Os preconceitos étnicos e culturais existem, e devem ser condenados. Mas os comportamentos criminosos e anti-cívicos também existem, e é preciso que as autoridades sejam capazes de lidar com os indivíduos responsáveis, independentemente do grupo a que pertençam. No Reino Unido, vários gangs dedicados à exploração sexual de raparigas pobres escaparam durante anos à polícia por serem maioritariamente compostos de paquistaneses, e toda a gente, a começar por polícias e assistentes sociais, temer acusações de “racismo”. Como notou André Ventura, a “inclusão” não pode ser sinónimo de dispensa do cumprimento da lei, porque isso não é “inclusão”, mas o seu contrário, a “guetização”. O que sempre definiu os guetos foi precisamente estarem fora da lei comum. Isentar um grupo de deveres é o caminho mais eficaz para lhe negar direitos e o condenar à marginalidade.

Foi a mentir e a decretar tabus que as oligarquias ocidentais abriram as portas ao chamado populismo. Por mim, prefiro que estas questões sejam tratadas por alguém como André Ventura, integrado num partido fundador do regime democrático e intransigente contra a política hipócrita e efectivamente racista dos guetos suburbanos, do que por um demagogo apostado em derrubar o sistema.

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