O tempo é de férias e com certeza poucos querem ser incomodados com o problema que está por resolver e que se agrava. Apesar da austeridade de “cortes-cativações” no Estado, apesar do crescimento muito dinâmico da economia, apesar da extraordinária redução do desemprego e, ainda mais importante, da criação de emprego, o endividamento continua a aumentar. O maior alerta vem do lado das famílias.

Os últimos números da dívida pública divulgados pelo Banco de Portugal colocam esse valor no limiar dos 250 mil milhões de euros, quase uma vez e meia o que produzimos anualmente, 25 mil euros por cada português. Claro que este ano, se tudo correr como se prevê, o peso da dívida pública no PIB (Produto Interno Bruto) vai diminuir. Em Junho o aumento da dívida (na óptica de Maastricht, que é avaliada por Bruxelas) foi de 3,8%. Se se mantiver com esta taxa e se o crescimento da economia ficar em 2,8% e a inflação em 1,5% será possível dizer que se conseguiu mais um feito histórico, o de reduzir o peso da dívida no PIB. Está garantida a sustentabilidade? Depende do que for o crescimento da economia nos anos que se seguem. É um bom começo, mas se não começarmos a amortizar seriamente a dívida estamos nas mãos do destino, da próxima crise que é sempre certa.

O panorama é menos animador nas famílias. A confiança regressou e com ela o endividamento. Os empréstimos concedidos às famílias para consumo e outros fins estão com uma taxa de crescimento anual de 5%. O que significa que está a crescer bastante acima do rendimento disponível. Podemos sempre desvalorizar este indicador devido à baixa dimensão agregada dessa dívida, quando comparada nomeadamente com a dívida contraída para a compra de casa. Os empréstimos concedidos para aquisição de habitação continuam a cair.

Moderar esta tendência das famílias para se endividarem devia ser um objectivo da política económica. Corresponde a evitar males futuros. Ninguém tem hoje garantias de que os empregos criados são duradouros, dependentes que estão dos serviços e especialmente do sector do turismo. Por muito que se queira fazer crer que a precariedade no emprego diminui, quem trabalha no sector privado sabe que hoje tem emprego mas amanhã não sabe se o terá. Uma perspectiva válida para qualquer sector de actividade.

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É sempre desagradável assumir o papel daquela pessoa que estraga a festa. Mas se muitos dos alertas dados no passado tivessem sido ouvidos, hoje teríamos menos problemas. Na grande farra da dívida do início deste século XXI tudo parecia possível e ninguém queria ouvir nada. Desvalorizavam-se os avisos sobre a possibilidade de queda do preço das casas assim como se explicava que não existia nenhum problema com a dívida das famílias porque tinham os bens – neste caso as casas. Esta última “racionalização” foi frequentemente feita por responsáveis pela nossa política económica.

Também a compra de acções com empréstimos bancários era apresentada como a decisão mais racional do mundo: o preço das acções subia, pagava-se o empréstimo e ainda se ganhava dinheiro. Pessoas, que pouco ou nada percebiam de mercado de capitais, envolveram-se nesta brincadeira financeira quando bastava aplicarem uma regra básica: não se compram activos com cotações variáveis assumindo responsabilidades que são fixas.

A dívida não vai desaparecer. A dívida pública poderá ser reestruturada mas os credores farão com que paguemos um preço por isso. A dívida das famílias poderá também ser reduzida mas alguém pagará por isso, no limite todos nós que pagamos impostos. Exactamente como agora estamos a pagar os excessos de endividamento da primeira década do século XXI. O problema que temos com os nossos bancos não é mais do que isso, dívida que não foi paga – uns porque não puderam outros porque puderam não pagar e ficaram com o dinheiro – e que agora tem de ser amortizada com os nossos impostos.