Em 1955, o Reino Unido decidiu retirar-se das negociações com seis países (França, Alemanha, Itália, Bélgica e Luxemburgo) que pretendiam formar um mercado comum através da criação da Comunidade Económica Europeia. Apesar desta desagradável retirada, o facto é que os restantes 6 países, fundaram com a assinatura do Tratado de Roma, aquilo que – com vários tratados posteriores- é hoje a União Europeia.

Não demorou muito que o Reino Unido mudasse de ideias. Depois de longas negociações, o Reino Unido pediu a adesão em 1963. A França, presidida pelo General De Gaulle vetou a candidatura. Quatro anos depois, em 1967, apresentou uma nova candidatura. O General De Gaulle vetou de novo. Apenas em 1971, já o General não se poderia opor, pois repousava para a eternidade na sua campa em Colombay- Les Deux Eglises, os seis membros da CEE aprovaram a adesão.

Mas, se o Reino Unido, muito ganhou com a adesão (os ingleses são muto pragmáticos) também viu especialmente afectadas as suas ligações com os países da Commonwealth. Entre estes há que realçar a desilusão australiana, uma espécie de exemplo que vale para outros, que cortou quase todos os laços especiais com a Grã-Bretanha, restando apenas a bandeira, que ainda inclui a Union Jack britânica e a manutenção simbólica da rainha inglesa como soberana da Austrália. E percebe-se: todas as importações extracomunitárias britânicas, passavam a ser taxadas de acordo com as tarifas europeias. Com esta perda de competitividade, os bens alimentares e matérias primas, que a Austrália e outros países da Commonwealth exportavam para o Reino Unido, foram gradualmente substituídos por produtos franceses, italianos e alemães.

Tem sido sempre objecto de controvérsia, o facto de Winston Churchill, ter sido ou não, adepto da integração da Grã-Bretanha naquilo que o próprio designou por Estados Unidos da Europa. A união dos países da Europa continental, foi sem dúvida um desígnio de Churchill, depois de abandonar as suas funções governativas na sequência das eleições de 1945, que deram a vitória aos trabalhistas. No seu célebre discurso de 19 de Setembro de 1946 na Universidade de Zurique, Churchill evidenciou – para evitar a repetição da dolorosa experiência do Tratado de Versailles na sequência da derrota alemã na I Guerra, que ditou condições insuportáveis aos vencidos – que os franceses, vencedores, tinham de compreender que o seu ressentimento face à Alemanha não poderia comprometer a reconstrução de uma Europa forte e habitável. Mas sem equívocos, Churchill não deixou de adiantar que “ o povo alemão tem agora uma derradeira oportunidade e se se deixar levar pelo comunismo, tal como se deixou levar pelo nazismo, isso ditará o fim da nossa clemência e erradicá-lo-emos”.

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As razões de Churchill, para a não adesão da Grã-Bretanha, eram sobretudo de natureza geopolítica e datadas no tempo em que foram proferidas. Pouco têm a ver com o actual take control back de Boris Johnson. Basta atentar nos termos do discurso de Zurique, no qual referiu que os Três Grandes (altura em que a Grã-Bretanha ainda podia reivindicar tal estatuto) ficariam fora da nova estrutura europeia, tornando-se seus patrocinadores. Ora um patrocinador, não participa, parece óbvio. Os então patrocinadores dos Estados Unidos da Europa, seriam, segundo Churchill, os Estados Unidos da América, a Comunidade Britânica de Nações (atente-se bem na designação usada por Churchill, para referir a Grã-Bretanha) e a Rússia soviética, embora Churchill nunca tenha explicado, como conseguiria que os Estados Unidos e a Rússia, se interessassem por esse papel de patrocinadores da união da Europa. Seja como for, para Félix Klos (Unir a Europa, 2016) como para muitos outros biógrafos de Winston, as razões para a não participação britânica na união europeia eram sobretudo duas: “A primeira era que a Grã-Bretanha não podia contemplar a ideia de uma aliança com os seus vizinhos europeus, para ir depois acabar num divórcio com o seu império e com a Commonwealth. A segunda era o facto de Churchill ter os olhos postos na América e não na Europa, para garantir a segurança da Grã-Bretanha no mundo do pós-guerra.

Ora, a primeira razão já faleceu quando o Reino Unido aderiu em 1 de Janeiro de 1973 e o tempo não volta para trás. A segunda, não se compadece, com a realidade actual de divórcio dos Estados Unidos quanto à segurança europeia, Grã-Bretanha incluída. Ainda assim, o Brexit vai ocorrer no dia 31 de Janeiro de 2020, por vontade de 52% dos que votaram no referendo de 2016.  Recorde-se que a adesão de 1973, aprovada no Parlamento, ela própria foi polémica, a ponto de obrigar a que posteriormente por referendo – aliás o primeiro referendo da história dos britânicos – estes tenham decidido em 1975, nessa altura com uma esmagadora maioria de 67%, permanecer na Comunidade Europeia.

Não deixa de ser curioso, e merece reflexão, a razão pela qual 67% da Grã-Bretanha da época da indústria pesada do Norte, das minas galesas, da ruralidade tradicionalista, conservadora e isolacionista, entendeu em 1975 que o seu interesse era pertencer à Comunidade Europeia e 40 anos depois, 52% da Grã-Bretanha, agora cosmopolita e multiétnica, entende abandonar a União.

Consumada a saída, começam outros problemas. Se a médio prazo, a Irlanda do Norte irá certamente integrar-se na República da Irlanda e automaticamente voltar à União, da qual nem sequer vai chegar de facto a sair, já com a Escócia o problema é bem diferente. Ainda que o Parlamento Britânico autorize novo referendo, e desse referendo saia a decisão de abandonar o Reino Unido, não se vê como poderá a Escócia integrar a União Europeia. O Kosovo – e bem, na nossa modesta opinião, porque é um Estado falhado e artificial – ainda não é reconhecido por cinco países da UE: Chipre, Eslováquia, Espanha, Grécia e Roménia. Quatro destes países podem ser pressionáveis e aceitar a Escócia. A Espanha, nunca aceitará a entrada na União de um Estado com origem numa secessão, seja esta por referendo ou por qualquer outra via. E como a adesão só opera, com consentimento unânime dos Estados membros, o melhor é a Escócia esperar sentada, pois enquanto houver Espanha, não entrará na União Europeia.