Querida desconhecida,

antes de tudo: está tudo bem.

Eu sei. Sei que você está cansada, sobrecarregada, angustiada. Sei que você está com alguns medos. Do vírus, do contágio, das consequências que esse período vai causar na sua vida, na falta de perspectiva de retorno da vida de antes. Eu sei. Até porque, somos duas, não é mesmo?

Mas tudo bem. E tudo bem se você chorar no banheiro às vezes. Tudo bem se você chorar na frente de todo mundo. E tudo bem se você não chorar nunca. Vou repetir, caso não tenha ficado claro: tudo bem. Além de “lave as mãos” e “fique em casa”, esse é o único mantra que você precisa repetir. Tudo bem.

A casa não está uma beleza. E não há problema nisso. Lembre-se, a casa não é responsabilidade só sua. E a casa não precisa estar impecável. Habitável já basta. Não se exija demais. Delegue tarefas. Lembre que todos têm que fazer suas partes. Senão você vai continuar fazendo as partes de todo mundo e ficando exausta.

Querida, tudo bem se você não se sentir no auge do seu equilíbrio ou do seu auto-controle. Não se imponha essa obrigação, está tudo de cabeça para baixo. Respire fundo, se isole às vezes. E não deixe que ninguém levante a voz para te chamar de desequilibrada ou de histérica. Eles não têm esse direito. Você está fazendo o melhor que pode. Você basta, sendo o que é.

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Pare de achar que você deveria estar fazendo yoga às 7 da manhã. Ou que você deveria estar fazendo bolos de maçã ou limpando armários antigos. Já bastam as exigências básicas da vida. Faça o que for possível. E, dentro dos opcionais, faça apenas e tão somente o que te der prazer.

Tudo bem se você não estiver linda. Suas olheiras, suas dobrinhas, seus cabelos secando naturalmente. Você nunca tem que se parecer com outra pessoa que não seja você mesma. Ainda mais agora. Pare de olhar para aquelas mulheres impecáveis do instagram. Não se intoxique com vidas que não são a sua. E, se você engordar uns quilinhos na quarentena, tudo bem também. Já já a vida volta ao habitual e as coisas entram nos eixos.

Não se faça perguntas existenciais nessa fase. Não se questione o porquê de ter tido filhos ou o porquê de não ter nenhum. Não se questione se esse casamento faz sentido, nem se questione o porquê de você estar solteira. Não coloque seu emprego em questão. Não coloque a vida em perspectiva agora. Mais para frente talvez. Mas agora está tudo tão estranho, tão atípico. Foque em viver um dia por vez, não mais do que isso.

Não permita que te desrespeitem. Coloque limites. A violência contra a mulher não é apenas física. Pode ser moral, verbal, psicológica. Você não é maluca. Você não é insuportável. Não se convença de nada disso. Não desrespeite ninguém, mas não flexibilize a consideração com a qual você deve que ser tratada.

Estenda a mão às mulheres que te cercam. Familiares, amigas, vizinhas. Fale com elas, pergunte como andam as coisas. Exponha suas vulnerabilidades para que elas se sintam confortáveis para narrar as suas. Mande esse texto, caso ache que faz sentido, para elas saberem que, de um jeito ou de outro, está tudo bem. Bem ou mal, está tudo bem. E lembre-se: você basta, sendo exatamente quem é. Você não precisa ser mais do que isso.