Quando me preparava para enviar os habituais cartões de Natal para aqueles com quem tenho relações pessoais, sejam de amizade, familiares, profissionais ou outras, deparei-me com uma questão que, penso, deverá ter passado pela cabeça de muitos nesta época que atravessamos.

Devo enviar um cartão desenxabido com uma árvore de Natal cheia de bolinhas e com um senhor velhinho e barrigudo, com um barrete na cabeça, para não ofender ninguém? ou devo enviar um cartão cheio de alma e genuíno no seu significado, com o Menino Jesus e o Presépio, transmitindo o que é verdadeiramente o Natal?

O primeiro cartão distingue-se pela falta de uma essência que traduza um significado real e verdadeiro. Apresenta simplesmente uma árvore cheia de bolas que não é mais do que um enfeite temporário nas nossas casas, que se esvai no dia em que é desfeita, e uma figura cómica saída de uma qualquer ficção.

É uma espécie de folclore secular que não faz jus à nossa memória e que é frequentemente apresentada num cenário de neve e renas que não se identificam com Portugal. Vulgarizou a figura de São Nicolau como um velhinho com fartas barbas brancas e foi associado ao consumo por via da Coca-Cola e de outras empresas que simbolizam o predomínio económico e cultural anglo-saxónico no século XX.

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É um secularismo que afirma o material e desvaloriza os valores, que se baseia nas compras e que menospreza a dádiva, que mostra a troca de presentes do Pai Natal enquanto esconde a caridade do Menino.

O segundo cartão, mesmo que electrónico, traduz a luz viva e permanente do Natal. Natal significa nascimento, e o que se comemora, mesmo que a data não seja certa, é o surgimento de Jesus Cristo, o Messias, sobre o qual há evidência histórica que é aceite mesmo pelos que não se consideram Cristãos.

O Natal simboliza o nascimento da ideia Cristã de amor gratuito pelo próximo, talvez a primeira mensagem que se universalizou na história da humanidade. Este amor pelo próximo manifesta-se na paz, na doença, na dádiva, na caridade, na ajuda aos outros sem nada lhes exigir em troca.

Em Portugal, esta mensagem materializou-se de diferentes maneiras e por diferentes agentes ao longo dos séculos, e continua bem viva em instituições como o Banco Alimentar contra a Fome (declaração de interesse: no qual sou voluntário).

O seu trabalho é um exemplo de caridade que cobre quase todo o país, complementando a vida de milhares de pessoas com o apoio de bens que lhes são essenciais. Esse apoio é gratuito, como o é o amor que Deus nosso Senhor tem por todos nós. E não espera receber nenhum presente em troca.

Cito o Banco Alimentar porque é especial na forma como o faz. É como um regaço que acolhe e estimula os laços que unem uma infinidade de pessoas e de parceiros integrados nas suas comunidades locais, numa rede humana de dádiva e de caridade.

E é como um canal que ao longo de um quarto de século recolheu o que da fonte transborda, aproveitando-o com humildade numa economia circular que precede a que agora se tornou popular. É uma economia circular feita com alma e coração, sempre em nome dos outros, dos que nos estão próximos apesar de muitas vezes nem os vermos.

Este é o meu cartão, o que eu quero mandar a todos nesta época Natalícia.

Mas como qualquer Cristão, tenho muitas falhas. Por diplomacia, acabei por ceder e em vez de um cartão de Natal, enviei dois, um com o Menino Jesus e outro com o Pai Natal, desejando a todos boas escolhas para 2020. Pode ser que uma dessas escolhas seja que os valores do Natal se sobreponham ao materialismo dos presentes.

Um Santo Natal para todos!

O texto reflecte apenas a opinião do autor