Amanhã é dia de eleições decisivas para a região autónoma da Catalunha. Resta saber se serão efectivamente decisivas. O mais provável é que não, nem num sentido nem noutro. Só a variável da abstenção, que está abaixo de 20%, bem como a dos eleitores ainda hesitantes, poderão trazer algumas alterações significativas às estimativas feitas até ontem. Por conseguinte, salvo resultados totalmente imprevistos, o conjunto dos partidos constitucionalistas não chegará à maioria parlamentar (68 eleitos), apesar da possibilidade técnica de Ciutadans ser o partido mais votado sob a liderança carismática de Inés Arrimadas, conforme admite um estudo longitudinal muito sólido de «El País».

Quanto ao bloco dos três partidos separatistas, segundo uma sondagem proibida na Catalunha mas publicada hoje em Andorra de forma a permitir que os «cidadãos tenham acesso à mesma informação possuída pelas elites» poderá chegar ou não a uma escassa maioria. Se não chegar, ainda tem a possibilidade de receber o apoio da marca local de Podemos, embora até agora esta não tenha anunciado o seu futuro comportamento. E resta saber se esses três (ou quatro) partidos conseguirão entender-se entre soberanistas de esquerda e de direita no «parlament». É tudo menos líquido!

De qualquer forma, no caso de os separatistas voltarem a ter uma vitória e de persistirem numa «declaração unilateral de independência», o governo central assim como o Senado não terão outro remédio senão opor-se a isso, impondo de novo, mais tarde ou mais cedo, a aplicação do Artigo 155 invocado no seguimento da pretensa proclamação da «República da Catalunha» por parte do anterior «President da Generalitat», Carles Puigdemont, o qual tem aliás muito poucas «chances» de voltar ao cargo. Assim seria posto termo a nova aventura unilateral mas a Catalunha voltaria à estaca zero.

É indiscutível que o governo Rajoy fez muito mal em tentar reprimir pela força o referendo ilegal realizado no passado 1.º de Outubro – e ainda por cima não conseguir controlar os efeitos da repressão nos «media» – em vez de o ignorar, como o PP havia feito com idêntica tentativa por parte do anterior «president» da Catalunha, Artur Mas, em Dezembro de 2012, referendo este que foi previsivelmente favorável à «independência» catalã mas que não passou daí. O legalismo invocado por Rajoy e pelo seu partido esconde sobretudo mesquinhos cálculos eleitorais que devem ter começado por aumentar o apoio dos eleitores espanhóis mais centralistas ao PP mas que, entretanto, têm vindo a afastar dele o eleitorado mais favorável ao federalismo, como mostram as últimas sondagens eleitorais em Espanha.

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É pois de augurar que, independentemente do resultado final das eleições de amanhã e de quem acabe por tomar o poder no «parlament» catalão, o governo central do PP, aliás minoritário, não pode permitir que se repita a cena a que a Catalunha tem estado a assistir enquanto a sua sociedade se divide rigorosamente ao meio e a economia se ressente cada vez mais, incluindo o «boom» turístico, numa altura de crescimento excepcional na UE. Por pequena que seja, já que os separatistas perderão votos e possivelmente alguns lugares no «parlament», enquanto os constitucionalistas ganharão votos e talvez alguns lugares, a alteração de forças na Catalunha não pode deixar de ser seguida imediatamente pelo parlamento de Madrid e pelo governo minoritário. De outro modo, as ilusões soberanistas não desaparecerão e voltarão à superfície de cada vez que haja uma crise qualquer.

O relativo êxito de Ciutadans na Catalunha e na própria Espanha, bem como o do PSOE e da sua marca catalã, reduzindo a força eleitoral tanto do PP como do Podemos, deverão desembocar numa revisão profunda do estatuto das regiões autónomas, aliás já prometida em Madrid, no sentido de um maior federalismo no quadro de um crescente federalismo europeu da mesma índole, ambos a referendar pelos respectivos eleitorados. Assim, uma Europa das regiões, com a sua personalidade já hoje reconhecida, ganharia ao mesmo tempo uma visibilidade e um peso susceptíveis de responder às reivindicações autonomistas e mesmo soberanistas que nunca deixarão de existir num continente tão antigo, dividido e carregado de ideologias como é a Europa.

Não será um caminho curto nem imediato mas mostraria, superada a crise actual, as possibilidades europeias efectivas da subsidiariedade, bem como de um federalismo susceptível de superar enganosas exigências soberanistas, como aquelas que o Brexit tem vindo a revelar cada dia que passa para mal do «reino desunido». Por paradoxal que isso pareça, a Europa pode e deve ser o caminho mais curto para a União e não é por acaso que o alegado «soberanismo de esquerda», representado na Catalunha pela CUP e em Portugal pelos apoiantes do actual governo socialista, está disposto a aliar-se com o «diabo» para destruir a UE e reconduzir-nos ao isolacionismo.