Assistimos hoje a um ataque intempestivo à direção do CDS-PP, encabeçado pelo putativo candidato Adolfo Mesquita Nunes (o responsável pelo programa eleitoral do CDS-PP às legislativas, que guiou ordeiramente o partido a um resultado eleitoral de 4% pouco tempo após a sua saída da direção) e secundada por outros atores políticos que, em maior ou menor medida, se sentem lesados pelo resultado eleitoral do congresso do CDS-PP em Aveiro, apesar de legitimamente sufragado pelas bases do partido.

Deve dizer-se putativo candidato, porque Adolfo Mesquita Nunes parece que só se candidata se a eleição for já, a meio do mandato dos atuais órgãos do partido. Se não for agora presumimos que não se “chegará à frente”, até porque, em 2022, Nuno Melo já terá mais disponibilidade para salvar um partido. Mas 2022 não importa para os aderentes a este comboio em marcha. “As eleições têm que ser agora”, dizem, sem freio, já a sair dos carris.

Mas afinal qual é a crise? – pergunta o leitor mais avisado e atento, certo de que a única crise que vive hoje se deve à pandemia.

A crise das eleições nos Açores, onde o CDS-PP formou pela primeira vez Governo Regional? Seguramente que não, pese embora existam dúvidas se com Adolfo Mesquita Nunes o acordo que permite à direita lá governar sobreviveria.

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A crise nas presidenciais, onde o CDS-PP apoiou o candidato vencedor (como, aliás, os atuais críticos da decisão apoiaram no mandato anterior e tinham já apoiado, após o repto de Assunção Cristas, para um segundo mandato)? Dificilmente, apesar do contorcionismo político sucessivo começar a permitir adivinhar um padrão.

Será, então, já que não houve nenhum desaire eleitoral, a crise da saída da direção de Filipe Lobo d’Ávila e do seu grupo “Juntos pelo Futuro”? Creio que não, pois essa integração ocorreu após as eleições em congresso, depois de a atual direção, encabeçada por Francisco Rodrigues dos Santos, ter vencido sem esses apoios em urna.

Dirão alguns que Abel Matos Santos, da “Tendência Esperança em Movimento” (TEM), e a pseudo-tendência “CDS XXI” terão, igualmente, apoiado a atual direção, na medida em que o primeiro a integrou e os últimos desistiram de uma moção a seu favor (note-se que foram 12, as moções apresentadas).

Porém, o primeiro já demonstrou não apoiar a solução de Adolfo Mesquita Nunes e os outros – pelo menos o seu homem do leme – terão rumado a terras distantes (por respeito a Adolfo Mesquita Nunes, não se irá aqui referir esse lugar sem ser como suporte a promessas de uma putativa candidatura, mas é impossível não perguntar: onde está então o elefante?).

Importa também lembrar que qualquer partido dispõe de mecanismos de cooptação perfeitamente aptos a dar resposta a demissões – como, de resto, é frequente suceder em qualquer direção, não sendo o CDS exceção. Não contraria também isso a tese da crise insofismável, por mais conveniente que seja para alguns?

Sobram, portanto, as afamadas sondagens (as piores, vá). Estas, misturadas numa proveta com a estranha tese propalada por alguns apoiantes desse tortuoso caminho, de que é necessário um congresso de natureza extraordinária (leia-se, extemporânea) para que haja “clarificação dentro do partido”, servem como desculpa para a criação de uma crise artificial.

Por esta altura, as questões multiplicam-se para o tal leitor atento e prudente, tão impressionado com a velocidade do comboio que receia alguém ter deixado a lógica ficar no apeadeiro.

Um congresso presencial como o do PCP, mas num contexto de pandemia ainda pior? Ou um congresso em formato digital, daqueles que até são bastante caros, para esbulhar o partido de verba para as autárquicas? E que “clarificação dentro do partido“ tão necessária será essa, quando as alternativas já foram a votação há tão pouco tempo atrás e, ao dia de hoje, são precisamente as mesmas?

Sim, porque num incompreensível exercício de retórica, Adolfo Mesquita Nunes vem clamar com desassombro que fazem falta ao CDS nomes como os de Cecília Meireles, Telmo Correia e João Almeida, entre outros apoiantes sobejamente conhecidos da candidatura, que já no congresso de Aveiro não logrou obter a confiança dos militantes.

Estranho mundo da política este, em que para Adolfo Mesquita Nunes fazem falta ao CDS-PP os deputados do CDS-PP em funções! A tese será, que aqueles que diariamente representam o partido no fórum mais solene da Assembleia da República têm que regressar. Como é que alguém faz falta ou regressa a um partido onde exerce atualmente funções de representação? Se há algo que carece de clarificação dentro do partido, será isto. Mas isso basta um Conselho Nacional para clarificar.