“As portas do céu e do inferno são adjacentes e idênticas”
Nitos Kazantzakis, A última tentação de Cristo
Tempos de Pandemia não afrouxam agendas políticas. Um conjunto de jovens, e não só, escreveu uma Carta Aberta ao país, e no fim, vinca ao que vem (“precisamos de lutar”, “através do voto, manifestações…”, “junta-te a nós”) sob uma máscara “verde”.
O eco-oportunismo a mostrar as garras…
Caros jovens, acham que o mundo vai mudar com Estados a injetarem fortunas, quando o que os Estados injetarem será um penso rápido para tapar grandes feridas, e até para o penso vão ter que se endividar ainda mais do que já está?
Acham que quanto menos dinheiro há — porque se ele era pouco então agora… — mais se deve gastar? Será preciso explicar que não é só ir levantar ao multibanco e ele dar o que queremos?
Acham que os outros poluem, e vocês não? A empresa que vos faz o telemóvel é má, vocês que compram e usam o telemóvel não têm nada a ver com a poluição?
Não vos ocorre refletir sobre empatia, solidariedade, ética, para com a pobreza, a fome, a miséria humana, dos vossos concidadãos, antes de afirmarem que recuperar não é prioritário? É que de barriga cheia é fácil falar…
Eu sei que muitos de vós são movidos pela bondade, pela preocupação, pela nobreza da causa. Duvidem quando vos dizem que isto é uma simples questão de vontade, quando vos radicalizam para uma luta entre o bem e o mal. Lembrem-se que “de boas intenções está o inferno cheio”. a
Acreditam mesmo que a natureza é um seguro de saúde, uma coisa fofinha e linda que só nos faz bem? Talvez desconheçam o que é a geada estragar culturas, o javali destruir a colheita, um leão matar o nosso familiar, os corpos ensacados nas morgues por causa do coronavirus, um terramoto destruir vidas e casas à nossa volta, ou a psicopatia de alguém infernizar a vida de outrem… São todas elas coisas da natureza… A natureza não são os animais em amena cavaqueira à volta da fogueira dos desenhos animados…
A lição, chega igualmente deste mundo virado do avesso com o novo coronavírus:
Do outro lado do Atlântico, no Panamá, realizou-se o festival Tribal Gathering, anunciado como um “paraíso na terra”.
Ora este terminou no passado dia 15 de março, mas quase um mês e meio depois ainda existem dezenas de festivaleiros que lá ficaram retidos.
Então o paraíso, onde as pessoas aprenderam com as comunidades indígenas como reequilibrar a sociedade e viver em simbiose com a terra, evaporou-se: os participantes começaram a discutir por comida e espaço, mais tarde choveu durante dias e os esgotos entupiram. As pessoas queixam-se da burocracia das autoridades do Panamá e do Reino Unido, de onde muitos são naturais, porque só querem fugir deste paraíso…
Um documentário da Vice sobre o caso mostra os participantes a reclamar sobre como estão “presos no inferno”.
Todos gostam do ambiente – não são só vocês – e todos têm impacto sobre ele – incluindo vocês. Defendam então, que eu também defendo, o ‘desenvolvimento sustentável’. Mas não se esqueçam que é de desenvolvimento que se trata, não de uma batalha religiosa entre anjos e demónios.