Enquanto o novo governo aguarda os últimos votos do golpe eleitoral que derrubou a «geringonça» e deu ao PS, finalmente, a sua tão desejada «maioria absoluta», esta irá dar-lhe mão livre para fazer o que quiser com o dinheiro da «bazuca» europeia. Entretanto, a comunicação social não cessa de falar do «Chega», agora promovido a terceiro do parlamento mais numeroso, a propósito de tudo e sobretudo de nada.

Desde a recusa do 1.º ministro indigitado a receber o dito partido depois de ter conquistado a maioria até à recusa da generalidade dos partidos saídos da eleição de 30 de Janeiro passado a nomearem um deputado do «Chega» para vice-presidente da nova Assembleia da República, conforme é da praxe enquanto terceiro partido mais votado, todos os pretextos são bons para desviar a atenção do eleitorado e a comunicação social não perde uma oportunidade para denunciar os maus passos do «Chega».

Vinda a oposição ao dito partido de onde vem, como se os seus adversários fossem «santinhos» que nunca perderam a oportunidade de açambarcar os poderes e privilégios atinentes aos cargos políticos, qualquer pessoa minimamente esclarecida sabe que o tal «Chega» nunca chegará a sítio algum. Como aqui escreveu há dias João Marques de Almeida, um dos novos críticos do PSD, não será o segundo maior partido parlamentar que irá apoiar a candidatura do «Chega» à vice-presidência do parlamento. Entretanto, não há meio de comunicação que não publicite as últimas tropelias do dito «Chega»… como aconteceu com o próprio «Observador».

Ora, para a política a sério, todo esse falatório não passa de ruído de fundo. Com efeito, se o próprio PSD tem dificuldade em se situar partidariamente, o «Chega» pulverizar-se-á muito antes de chegar a ter qualquer peso no parlamento nem as suas pretensas propostas políticas levarão a parte alguma, obviamente, como a castração química ou a segregação dos ciganos… Graves como são, qualquer pessoa com os pés na terra sabe que tais questões não se tratam desse modo. O Professor Bacelar de Vasconcelos, antigo governador civil do PS em Braga, sabe melhor do que ninguém que a relação dos habitantes locais e dos próprios partidos políticos com as chamadas «minorias étnicas» é tudo menos linear.

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Até hoje, é essa a função desempenhada pelo discurso do «Chega» e por algumas demonstrações públicas que pouco ou nada têm de político no sentido forte do termo. Apenas uma ideologia mais. Dito isso, o uso que os grandes partidos fazem do poder é de natureza diversa da concepção que o «Chega» tem da política mas não é menos pernicioso para o país. Com efeito, o discurso que o «Chega» declama em nome do seu público não deixa de ser equivalente ao da maioria dos discursos partidários. Também estes são assumidos em nome do «povo» conforme tem sucedido abusivamente durante a pandemia por parte do PS. Em última instância, qual é o partido que espera ganhar votos sem prometer benefícios a uma ou mais partes da população, sejam essas promessas óbvias ou inviáveis?

O maior beneficiário da irrupção do «Chega» e do cerco ideológico que lhe foi imposto pela comunicação social próxima do poder tem sido, como é óbvio, o PS. A queda do PCP e sobretudo a do BE é que fizeram a escassa «maioria» de 42%, como a de Sócrates já fora de apenas 45%, graças aos alçapões do sistema eleitoral. Na realidade, apesar da falta de jeito natural de Rui Rio, o PSD não perdeu votos. Ganhou bastantes (cerca de cem mil) e mais ganharia se não tivesse recusado a oferta de aliança feita pelo CDS. Juntos, poderiam ter impedido o «absolutismo» do PS e aumentar o «peso» da aliança PSD+CDS… até à próxima bancarrota.

Ao contrário da Iniciativa Liberal (IL), que além de ter uma base social pequena mas consistente, possui também um projecto sócio-económico, o «Chega» não tem qualquer papel a desempenhar na recuperação das perdas provocadas pela pandemia e pelo sistemático endividamento socialista, bem como a perda de mercados provocada pelo fechamento, parcial que seja, das potências importadoras europeias como a Espanha e a própria Grã-Bretanha, para não mencionar a França e a Alemanha… O Chega, sem ofensa, nem sabe o que estes países representam. Em vez disso, a IL é totalmente diferente.

Por sua vez, o PS teve oportunidade de demonstrar nestes últimos anos que só conhece o turismo, a habitação e as obras públicas… enquanto lá fora a inflação e os juros disparam. Pelo seu lado, o «Chega« é-lhe precioso como ruído de fundo pseudo-político alimentado quotidianamente pela comunicação social, grande parte da qual está cada vez mais seduzida desta vez pela ideologia «woke». Por seu turno, esta última serve de irritante para alimentar o «Chega». Em suma, a pior das combinações.