As pessoas e a sociedade em geral estigmatizam outros quando os julgam, não com base nas suas qualidades, mas com base numa marca ou num rótulo que é atribuído a um grupo temido ou desfavorecido. A tendência para estigmatizar é algo presente na natureza humana como forma de responder às pessoas que aparentam ser ou se comportam de forma diferente. A estigmatização é construída sobre o medo que tais pessoas, ditas diferentes, possam agir de forma ameaçadora ou imprevisível e é fortemente reduzida quando se torna claro que as pessoas estigmatizadas dificilmente adotarão tais comportamentos.

A opinião pública tem medo da doença mental e estigmatiza quem é afetado por ela. As razões para isto são complexas, mas entre elas estará a ideia que, quem sofre de uma doença mental pode não controlar o seu próprio comportamento e atuar de forma não previsível e até mesmo violenta. O medo gerado por esta situação faz a população reagir em relação aos doentes mentais de forma cautelosa e discriminatória, isto é, estigmatizando-os.

O estigma da doença mental surge na sequência de várias crenças falsas, como por exemplo:

  • pessoas com doença mental são violentas;
  • pessoas com doença mental são imprevisíveis e diferentes das outras;
  • pessoas com doença mental têm dificuldade em relacionarem-se com outros;
  • pessoas com doença mental não são tratáveis e recuperáveis.

Em última análise, os doentes mentais acabam prejudicados de várias formas: procuram ajuda mais tarde por temerem ser estigmatizados, têm mais dificuldades no acesso ao emprego e, eventualmente ,acabam sendo penalizados por quem decide alocação de recursos e investimentos na saúde, tal como se tem verificado em Portugal, que é dos países da OCDE que menos investe em saúde mental.

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A pandemia afetou de forma sistémica e transversal todos os países e povos, quebrando a ilusão de que parte significativa das pessoas são imunes à doença mental. Na verdade, tal como em relação a outras doenças, qualquer pessoa pode vir a sofrer de uma doença mental. Esta tomada de consciência por parte da opinião pública, de que um de nós pode ser um deles, colocou o tema da saúde mental na ordem do dia e tem permitido que se fale abertamente sobre a questão, particularmente sobre a saúde mental no mundo do trabalho onde tanta resistência tem existido à sua discussão.

Esta é, pois, uma oportunidade para falar abertamente sobre um conjunto de doenças que afetam cerca de um quinto da população portuguesa e reduzir de forma ativa o estigma, informando sobre a real natureza da doença mental, fornecendo dados concretos de que os doentes mentais são mais frequentemente vítimas de violência do que agentes praticantes de atos agressivos, e encorajando todas as pessoas que sofrem silenciosamente a pedir ajuda, tal como acontece em qualquer outro problema de saúde.

Esta ajuda só pode acontecer e ser mais eficaz se, por parte dos decisores políticos, existir também a coragem de investir em estruturas e profissionais e diminuir o atraso de Portugal nesta área. E se a opinião pública, a começar pela comunicação social que usa frequentemente nomes de doenças com conotação fortemente negativa, der o passo em frente que falta.