A meritocracria é um mito? A resposta a esta questão irá variar consoante o país em que a ouvirmos. Idealmente, todos gostaríamos de acreditar que o lugar de onde vimos não deve condicionar o destino onde queremos chegar.

Em Portugal, no entanto, falta muito para que isso aconteça: Por cá, são necessárias aproximadamente 5 gerações para que crianças nascidas em famílias com rendimentos mais baixos alcancem o rendimento médio, ao passo que a média da OCDE é de duas gerações. Este indicador já diz bastante – mas não o suficiente – sobe o nosso Elevador Social – a metáfora relativa à igualdade de oportunidades, com base apenas num fator: o do mérito.

É necessário, ainda assim, ter em conta que, para ter um Elevador Social a funcionar devidamente, três pilares devem funcionar em devida sintonia: Educação, empresas e o poder governativo. Será apenas quando os três se complementarem, apenas com base no interesse e bem-comum, que iremos assistir à materialização da meritocracia.

Começando pelas escolas, onde precisamente se inicia o caminho meritocrático, mas também onde vemos mais falhas no princípio da igualdade, nomeadamente no acesso ao ensino, onde facilmente se separam os pobres dos ricos. Provas não faltam de que as pessoas dos 10 a 15% da classe mais pobre demoram muito mais tempo a progredir na sua vida ativa. Veja-se: Portugal é dos principais países da OCDE onde o contexto socioeconómico das crianças mais condiciona o seu sucesso escolar: A taxa de reprovação é de 52% nos alunos de comunidades desfavorecidas, 5x superior à dos colegas num contexto social mais favorecido. Posteriormente, 55% dos filhos de trabalhadores manuais tornam-se eles próprios trabalhadores manuais – a média da OCDE é de 37%.

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Do desafio escolar passamos para um outro: a transição entre a vida académica e o mundo laboral. Já no universo laboral, verificamos que as profissões que mais formamos não são as que o país mais necessita. Aqui, a responsabilidade é partilhada e pede soluções, conjuntas, para nos tornamos mais qualificados e competitivos, incentivando à criação de mais profissionais com qualificações ao nível da tecnologia, visto que a digitalização é um processo já em curso à escala global e ao qual nenhuma outra área conseguirá distanciar-se.

Chegamos à última etapa – o do poder decisivo. Somos um país com histórico conhecido de privilégios e preferências pouco discretas, nas quais existem círculos sociais mais favorecidos que outros, algo que, em plena democracia, seria impensável — basta pensar que um professor em final de carreira recebe tanto como um juiz no seu primeiro ano de magistratura.

Aproveito ainda para deixar uma nota positiva no meio das várias lacunas que faltam corrigir para termos um Elevador Social a funcionar em pleno: a igualdade, pilar de uma sociedade moderna e do qual não nos faltam motivos de orgulho – temos cada vez mais empresas, públicas e privadas, a fazerem-se representar equitativamente nos seus quadros operacionais e de gestão. Sobre este tema, falta-nos apenas a capacidade para estender o conceito da igualdade às pessoas com deficiência, com vista a um tecido laboral mais justo e equilibrado, mas igualmente competente.