A comunidade é o espaço onde tudo pode ser ocasião para aprender! Aprender em todas as dimensões do currículo de qualquer disciplina, de forma inclusiva, e onde todos podem desenvolver as suas competências. Uma educação global tem de assentar num modelo centrado na comunidade, num compromisso com as suas raízes locais, sensíveis aos problemas sociais, culturais, artísticos, ambientais, de forma participada, promovendo a formação para a aprendizagem ao longo da vida.

Considerando que os miúdos passam a maior parte do tempo fechados, na maioria das vezes demasiadamente ligados às tecnologias, é muito importante que saiam (e não significa que as tecnologias não sejam relevantes). Saiam para olhar e construir uma visão crítica e próxima, aprendendo com o outro. E também para mostrar, partilhando com a comunidade o que fazem na escola, expondo os trabalhos “fora de portas”. Os alunos adoram ver os seus trabalhos nos museus, nas montras das lojas da vila, ou nas janelas dos edifícios públicos. Gostam de mostrar à família e aos amigos o que fizeram, e isso é para eles um fator de motivação e aprendizagem muito importante porque os valoriza e os faz crescer, não somente individual como coletivamente, num trabalho em equipa, que constrói a sua personalidade, o pensamento crítico, a participação cívica e o sentido de pertença à comunidade. Vejo-os a valorizar os conhecimentos, a crescerem em sensibilidade estética, em autonomia, e mais felizes.

Considero que a arte poderá ser uma forma inigualável para concretizar esta ligação escola-comunidade. Dando uma aula no museu ou levando o museu à escola. É maravilhoso quando vemos os alunos a apropriarem-se do espaço, realizarem uma atividade e descobrirem que, afinal, um museu é “top”. E também quando veem peças do museu expostas na escola. Levando-os a conhecer o património material e imaterial que é de todos nós. Ou o património natural, fazendo um percurso na natureza, na serra que nos cerca, conhecendo as aldeias de xisto, descobrindo as cascatas, os riachos e o seu percurso até ao mar, a fauna e a flora, tão rica na região. Querendo, poderemos fazer a ligação de um destes temas a qualquer disciplina, trabalhando o currículo fora de portas

Para se ensinar a preservar o património e o meio ambiente é necessário que professores e alunos os conheçam e valorizem. Ora, a escola tende a atuar apenas dentro de quatro paredes, esquecendo que, muitas vezes, é o meio a ditar a forma como os alunos agem, refletem e fazem escolhas. E um dos propósitos da escola não será dar ferramentas aos alunos para que possam vir a fazer escolhas conscientes no seu percurso de vida, bem como passar esse testemunho às futuras gerações, envolvendo a comunidade?

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Podemos partir de projetos, que na escola aparecem em catadupa e que, sendo na sua maioria interessantes, a verdade é que, muitas vezes, a maior dificuldade é os professores terem momentos para parar e pensar na forma de os operacionalizar, articulando-os entre si de forma transdisciplinar, direcionados para os alunos e para a comunidade. No entanto, ao envolvermos a comunidade local, nomeadamente através dos encarregados de educação, o trabalho pode ser facilitado e os ganhos serem muito mais relevantes. O empenhamento das famílias nos projetos das turmas poderá ser uma oportunidade de criar relações de confiança, através da resolução conjunta de problemas, garantindo também que o contexto familiar não se distancia do escolar. Ao invés disso, aproxima-o. E cria memórias.

Exemplo disso foi o projeto de empreendedorismo de uma turma de 6º ano, que criou um chocolate recheado de azeite e em que os encarregados de educação se envolveram imenso. Um projeto que marcou os alunos pelas aprendizagens adquiridas, ao estudarem o percurso da oliveira ao azeite, o seu uso em produtos medicinais, culinários, na cosmética, focando as tradições, as questões ambientais e a sustentabilidade. Adquiriram conhecimentos de História e Geografia de Portugal, Ciências, Português, Educação Musical, Matemática, Educação Visual, utilizaram as Tecnologias de Informação e Comunicação, e desenvolveram outras competências trabalhando em equipa e apresentando e promovendo publicamente o produto do seu trabalho. Foi gratificante pelo envolvimento dos alunos, dos professores, das famílias e de outros membros da comunidade.

Procuremos uma pedagogia que possa motivar não apenas o gosto pelo conhecimento, como também o enriquecimento a nível humano, em detrimento de uma pedagogia individualista, pouco centrada nas relações interpessoais, inclusivas.

Façamos projetos que implicam a saída da escola e a intervenção no espaço público, nomeadamente através da arte, pois as pedagogias centradas na arte possuem este poder agregador, gerador de um sentido comunitário e incitador da transformação social. Os alunos mostraram que a arte é ativista, solidária, ao ajudarem crianças de Cabo Delgado com os seus trabalhos, envolvendo para isso não só a comunidade local como elementos de outras comunidades de Portugal.

Incentivando os alunos a participar proativamente em causas sociais, promovendo o desenvolvimento de campanhas de ação social e o ativismo em projetos voltados para a cidadania e o bem-estar social, conectando a escola e a comunidade, como em campanhas de ajuda aos sem-abrigo, aos idosos, e de sensibilização para o bem-estar animal, estamos a estimulá-los para o envolvimento no associativismo, no voluntariado.

Acredito que, desta forma, se evidenciará o poder de transformação que a escola pode ter na construção de um mundo melhor.

Professora no Agrupamento de Escolas da Lousã. Finalista do Global Teacher Prize Portugal 2021

‘Caderno de Apontamentos’ é uma coluna que discute temas relacionados com a Educação, através de um autor convidado.