Hoje, hora de almoço, apitam as notificações dos telemóveis: toda a comunicação social anuncia que foram mais X mortos e Y novos doentes oncológicos, perdão Covid-19, que doenças oncológicas ou cardíacas, apesar de ceifaram muito mais vidas, não têm interesse mediático, não nos fazem temer pela própria vida.

Medo normal em episódios pandémicos já o tinham os Indianos, inscrevendo no AtharvaVeda a tuberculose e a lepra, ou os Sumérios que temiam Namtar, o deus das pestilências, Chalchiutotolin na versão asteca, tal como os Japoneses temiam os demónios Oni, responsáveis por muitas doenças, ou a feroz deusa Xi Wang Mu, na antiga China, assim como no Antigo Testamento, encontramos Levítico a expor um conjunto de regras contra a lepra e impurezas em geral, ou, na Europa medieva, a devoção a São Roque de Montpellier por alturas da Peste Negra ou até no mundo árabe as Hadith que mencionam a peste.

São momentos que ameaçam a civilização: o medo da morte não nos larga, as instituições deixam de funcionar convenientemente, cortam-se os hábitos e costumes porque a morte pode espreitar em qualquer vizinho, coisas antes intoleráveis passam a ser aceites desde que permitam salvar vidas, o triunfo do caos sobre a ordem estabelecida. Terreno fértil, portanto, para manipulações, autoritarismo, demagogia, para construção de narrativas em que o mito se sobrepõe à razão. E assim tem sido, desde os castigos bíblicos às perseguições medievas a judeus, passando pela crónica de Fernão Lopes sobre o cerco de Lisboa, contando como as forças divinas estavam do nosso lado, tendo a peste atacado as tropas espanholas, sem que um único português tenha contraído a doença.

Tememos algo desconhecido como seja um vírus novo (mais ainda quando há dois anos circulavam vídeos falsos de pessoas a tombar no meio da rua), tememos coisas como aranhas que sabemos não nos fazerem mal (sim, tal como este vírus a crianças, por exemplo, e mesmo quanto aos mais velhos parecemos ignorar que a generalidade das mortes se deve às debilidades – o SARS-COV2 foi a gota de água como um vírus gripal também seria), reagimos ao medo (desde os tempos da savana africana) fugindo ou lutando… Pelo que o medo tem muito de ignorante, ilógico e violento. Com efeito, o medo é, assim, uma ferramenta muito forte para turvar mentes e mudar comportamentos. O medo exacerbado expõe-nos aos riscos de regredimos a animais irracionais, tribais e agressivos, transformando-nos em armas de arremesso que políticos não recusam.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Passados quase dois anos de pandemia, parece que a doença continua desconhecida, que nada aprendemos, que a receita tem sido infalível. É certo que muitos aspetos exigirão anos de estudo. Todavia, parece haver vontade em que continuemos todos às escuras como há dois anos. Dois anos de declarações patéticas, de mentiras em reuniões ditas científicas, de equipas trocadas para alinhar a “ciência” às vontades políticas, etc. Medrosos, manipulados, submissos. Ganham com isso políticos com carta branca e profissionais da catástrofe que, por esta altura, vão recuperando os seus lugares na comunicação social para educar as pessoas como quem educa um cão (não se espantem, foi mesmo um destes imbecis a fazer o paralelismo) e intimidar e silenciar qualquer voz dissonante: quem achar que não é a libertação de Armando Vara que vai salvar o Natal ou a proibição de circular entre concelhos ao fim de semana que vai achatar a curva? Só pode ser um malandro Negacionista.

Por entre restrições à liberdade, regados com desigualdades e privilégios, lá continuaremos sob uma ditadura sanitária – que ignora até que o excesso pode ser nocivo: por exemplo na Gripe Espanhola os mais velhos eram pouco afetados, havendo quem sugira que tal se deveu à exposição uns anos antes à Gripe Russa… O prato do dia é conhecido: crianças de máscara na escola, tentativas de imposição de invenções inúteis (APP, Certificado Digital), a persistente caça aos assintomáticos (a exaustiva tarefa de perseguir quem não está doente, porque temos que caçar um vírus; saberá o leitor que mais de metade das nossas células não são nossas? alguns “especialistas” parecem não saber…), à vacinação cega para expurgar este agente (mesmo quando já não faltam evidências da inutilidade destas vacinas para travar contágios; é até engraçado como aspetos vistos como negacionismo, como a sazonalidade ou a co-morbilidade, são agora usados para manter a doutrina vacinal), aos portugueses apelidados ora de heróis, ora de irresponsáveis, por políticos que querem fazer passar uma ideia patética de controlo sobre a natureza que ora corre bem por eles, ou mal por não lhes obedecer.

Então mas não vem aí mais uma vaga de Covid? É o Inverno, estúpido. Talvez não tão duro como Janeiro passado – o frio, que bateu recordes, não deve ser tanto, as infraestruturas já estão montadas, a familiaridade dos médicos com a doença é maior, os mais vulneráveis já foram atingidos, talvez a vacina (mas só talvez) seja mais útil que um chá de limão… Mas já sabemos que vai atacar os mais vulneráveis e que muitos outros a irão contrair e recuperar. E depois, independentemente de substituirmos o Natal por uma troca de compotas, vai praticamente desaparecer, para voltar em força no inverno seguinte, como normal e expectável em coronavírus e gripes. Vamos habituar-nos a isso ou a estragar Natal atrás de Natal? Terá isto um fim? Bom, lembro-me de, já há uns tempos, José Manuel Fernandes citar uma passagem do filme de Spielberg “o Império do Sol” para evidenciar que o difícil nestas coisas é, além de começar, acabar.

A narrativa catastrofista foi abraçada e agora não há marcha-atrás porque ninguém quer dar o braço a torcer, reconhecer falhas, admitir que a realidade é mais complexa que as abordagens adotadas (qualquer um comprova como na Suécia morreram todos, um genocídio como tantos apregoaram). Não, isto está para durar… Até que ou a sociedade se farte ou surja outra preocupação mundial que a amedronte. E até lá? Cada nova vaga, cada nova bazuca? Ou que se lixe a vida – literalmente a vida de quem não tem saúde mas não tem Covid, ou a vida de quem fica na miséria, que também mata – de todos para tentar travar o vento com os dedos das mãos?