António Costa tem uma virtude política: a ousadia. Fez o que ainda nem ninguém tinha feito na política portuguesa: uma aliança com o PCP e com o Bloco de Esquerda. Os motivos não interessam agora. Fez a aliança e alterou as regras da política nacional. Em muitas coisas, para pior, é verdade. Mas como estratégia de poder, tem sucesso. Reduziu o PCP e o BE a seus ajudantes e, com a ajuda do Presidente, ocupou o centro. A verdade é que o PS é dos poucos partidos socialistas que não está em crise na Europa. Compare-se com o PSOE, o PS francês, o PASOK, o SPD alemão e os Trabalhistas. Do outro lado, o PSD e o CDS não estão a responder como deviam à iniciativa de Costa de se aliar às extremas esquerdas.

Antes de mais, reduzem a oposição à economia e às finanças. Serei o último a negar a importância destas questões. Mas é preciso fazer mais. Não basta dizer que a economia cresce pouco, que as contas estão aldrabadas, que a gestão da Caixa foi um desastre. Tudo isso é verdade e importa dizer. Mas é insuficiente. A política é mais do que contas públicas e do que economia. Além disso, as críticas à gestão das finanças públicas dificilmente terão efeitos políticos enquanto o BCE continuar a injectar dinheiro nos mercados. E vai continuar, como se viu na semana que passou. Aliás, enquanto a Itália estiver em dificuldades o BCE não mudará de política. Alguém acredita que Draghi deixará cair a Itália? Nunca. Enquanto o BCE levar a cabo esta política monetária, o discurso do défice e da dívida pública não terá impacto político.

A política é sobretudo uma competição de poder. As esquerdas alteraram essa competição em Portugal, e de um modo profundo. A incapacidade de reação dos partidos de direita não deixa de ser uma surpresa, no sentido em que a coligação das esquerdas foi uma resposta a uma estratégia dos dois partidos de direita. A coligação pré-eleitoral entre o PSD e o CDS empurrou o PS para os braços do PCP e do BE. É estranho que a revolução política de 2015 tenha sido provocada pela direita, mas depois os seus partidos voltaram a 2014, em vez de responder à revolução das esquerdas. Devem responder rapidamente em 2017

Em 2017, politicamente, o que contas são as eleições autárquicas. Tudo o resto é secundário. O PSD e o CDS devem prolongar a aliança de 2015 para 2017. Devem aliar-se em Lisboa e no Porto e explicar essa aliança no contexto de uma visão para Portugal diferente da das esquerdas (e aí a economia já é importante). Mas isso só terá significado político para o futuro se o PSD e o CDS ganharem em Lisboa e no Porto. A vitória eleitoral nas duas maiores cidades portuguesas é a única maneira de inverter a competição política entre a direita e a esquerda. Em política, sobretudo em democracia, nada substitui uma vitória eleitoral.

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Em Lisboa, o PSD deve apoiar a candidatura de Assunção Cristas. É a candidata de direita em melhores condições para ser eleita. Medina não é um candidato forte, basta ver o nervosismo com que anda. E tem um defeito fatal para um político: fica ofendido em público e irrita-se. Por exemplo, Sócrates irritava-se com agressividade, atacando. Medina irrita-se de um modo amuado. É terrível. Outra boa maneira de ver a fraqueza de Medina é através da comparação com Costa, o último candidato do PS em Lisboa. O PSD e o CDS devem aliar-se rapidamente à volta de Cristas e começar a fazer campanha.

No Porto, o PSD e o CDS também devem aliar-se e o candidato natural do centro direita no Porto é Rui Moreira. Não é preciso procurar muito longe. Ele está à vista de todos. Alguém neste país acredita que Rui Moreira é socialista? É óbvio que não é nem nunca foi. Para mim é um mistério Rui Moreira não ser o candidato da direita no Porto. Já sei que muitos leitores estão a pensar nos aparelhos partidários, sobretudo no do PSD.

Em relação a isso, tenho duas coisas a dizer. O momento do país é demasiado importante para as rivalidades e os ódios pessoais dos aparelhos definirem estratégias eleitorais. Os partidos ainda não perceberam o que se está a passar no mundo? Os eleitores estão fartos de tácticas políticas que apenas servem os seus protagonistas. Os partidos devem servir os eleitores. Não devem ser instrumentos de ambições pessoais. Quem reduz a política às suas ambições pessoais, está a mais, deve ir embora. O eleitorado do PSD e do CDS exige uma coisa muito simples: façam tudo para vencer as eleições autárquicas e não deixem guerras de aparelhos levar à derrota.

Em segundo lugar, no PSD, a imposição de estratégias políticas vencedoras aos cálculos do aparelho será o maior teste à liderança de Passos Coelho. Quem foi capaz de cumprir um resgate financeiro, imposto por outros, para bem do país, terá que ser capaz de colocar na ordem o aparelho do seu partido. O PSD não se pode comportar como se não tivesse havido uma revolução política em 2015. Houve. Foi feita pelas esquerdas. A melhor maneira de combater essa revolução é ganhar em Lisboa e no Porto. Só há uma maneira de o fazer. O PSD e o CDS apoiarem Cristas e Moreira. Não será fácil, mas não poderá ser mais difícil do que uma aliança entre o PS, o PCP e o BE.