Como dizia D. Manuel Clemente no Portugal e nos Portugueses, há o ser “terra” e o ser “mar” ou “ litoral”. O ser “terra” conserva, passa de geração em geração, dá raízes mas, a partir de um certo ponto apenas mantem, não arranca nem desafia e pode levar à extinção de um dado modo de vida ou de uma forma de ser. O ser ”litoral” implica objectivos muito definidos, com bases fundamentadas (que vêm da “terra”)  obriga a sair do tal ponto seguro para lançar as redes e fazer chegar a mensagem a outras gentes, não temendo não lhes saber dar resposta porque tem a certeza que elas irão aparecer. Tem mais riscos mas, com uma base sólida, horizontes bem definidos e espirito de liderança pode ter e terá um efeito multiplicador. É o grande desafio que este dia de Portugal de 2020 também nos faz.

Se se limitar a querer ser apenas “terra”, Portugal não só contraria uma das razões da sua existência mas ficará a médio prazo “arrumado” num patamar de países cujas escolhas são determinadas por entidades externas que não têm em conta os nossos interesses estratégicos e para o qual apenas alguns irão olhar com simpatia ou alguma curiosidade. O tal “milagre português” que de vez em quando acontece. Mas nada mais. É preciso assim construir e propor aos portugueses o desafio de um Portugal  para o século XXI que só terá de facto sentido se as pessoas o sentirem como seu, livre de fantasmas do passado que alguns insistem em criar, numa óptica atlântica da qual somos o porto natural de ligação com a Europa. Dir-me-ão que para que tal aconteça precisamos das tais elites que não temos e que são essenciais para que essa mudança de paradigma aconteça. Talvez tenham razão. Mas também é verdade que em 877 anos de existência enquanto país foi tantas e tantas vezes a necessidade comum de mudança que nos levou a ser “litoral” enquanto os Velhos do Restelo diziam só ser possível ser “terra”.

Como tão bem escreveu aos jovens nesta Páscoa o cardeal Tolentino, “este não é o momento para desistir de sonhar, mas é sim uma estação para os grandes sonhos. Este não é o tempo para deixar mirrar as nossas visões”. Eu acrescentaria que essas novas visões e esta vontade comum que liberta e quebra dependências só serão conseguidas com uma aposta séria na construção do pensamento crítico e na revisão urgente do papel que se quer estruturante da Escola em Portugal. Porque, como disse José Gil, só suscitando interrogações, se ultrapassa uma existência vivida apenas ao nível de superfície. No Presente e no Futuro que aí vem.

E para que, sabendo ser “terra” consigamos outra vez ser “mar”.

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