O melhor artigo que li recentemente sobre o PSD foi o do Dr. Carlos Abreu Amorim neste jornal. Está tudo ao contrário. Já que o Dr. Rui Rio entende que deve ir ficando, mal, aproveitem o tempo, menos mal, para discutir ideias e estratégia para voltarem a governar Portugal em 2026.

Para já, quanto à sucessão na liderança, estamos a assistir a um processo que insiste na versão partidária habitual, a dos caciques, apoios nominais de eminências pardas sem uma ideia que valha um chavo, sindicatos de votos, benesses para distribuir, empregos prometidos, enfim, tudo aquilo que afasta dos partidos e da intervenção política participativa a esmagadora maioria dos cidadãos que têm vida própria e profissão que os torna independentes.

A avaliação de causas que determinam os resultados eleitorais é sempre difícil. No caso das de janeiro de 2022 haverá, como sempre, um conjunto de fatores em que sobressai a capacidade do PS, no Governo, ter distribuído uns brindes aos seu clientes habituais, ter capitalizado com o medo de uma hipotética presença do Chega num Governo de coligação à direita e ter conseguido, com mestria e sorte, manter a diabolização do PSD de Passos Coelho.

Mestria, porque desde 2015 tem usado a comunicação social e circunstantes num corrupio de acusações, manipulações e mentiras que branquearam a verdade sobre quem pediu e acordou o Memorando de Entendimento para Assistência Financeira, a Tróika, em 2011. Foi o PS que solicitou a ajuda externa e foi o PS que, através da Tróika, condicionou a atividade do Governo, entre 2011 e 2014, até à altura em que foi possível dar o Memorando por cumprido. Basta ver como se usou a afirmação de que era intenção de Passos Coelho ir “para além da Tróika”, anúncio da vontade de fazer melhor e reformar mais profunda e duradoiramente, como se fosse uma determinação em castigar os Portugueses. E a coisa colou.

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Sorte, porque para lá da mestria na manipulação da informação e na criação de uma realidade alternativa que demonizou o PSD, o PS lidou com um PSD que aceitou e ampliou as falsidades. O PSD, com a suas últimas direções, fez mais para destruir o seu legado político de que oposição. Aceitou o “barrete” de que tinham sido austeros, sem desmascarar eficazmente a austeridade de Centeno e Suc. Ofereceu-se aos partidos de esquerda e entrou na competição de culpar “o Passos”, “os Passistas” e o XIX Governo de todos os males que Costa, o PS e a “geringonça” tentavam consertar. Já ninguém quer saber que as reduções de salários e congelamentos de carreiras da administração pública começaram com o Eng. José Sócrates. Escondeu-se que as reduções de pensões aconteceram, ainda assim de forma pouco acentuada, nos que tinham pensões mais altas. É tabu referir que os preços pagos pelos consumidores de medicamentos nunca tinham descido tanto como com o Governo de Passos Coelho ou que o número de isentos de taxas moderadoras no SNS nunca tinha sido tão alto ou que a vacinação contra a gripe gratuita a partir dos 65 anos surgiu com o Governo que nos libertou da Tróika, o do PSD-CDS. Isto para não falar da inversão na tendência de variação do PIB e do desemprego já em 2014. Comentadores, jornalistas, adversários e “companheiros”, todos alinharam na “culpa do Passos”, com a conivência da direção do PSD. Em vez de terem orgulho no seu passado, os “notáveis” de agora repudiaram os que objetivamente se sacrificaram, pessoal e politicamente, entre 2011 e 2015. E, no entanto, foram Passos Coelho e Paulo Portas quem ganhou em 2015.

A tendência autofágica dos partidos é muito curiosa. No PSD já o tinham feito com Cavaco Silva e fizeram mal. Só citam Sá Carneiro, como se fosse um Mao Ze Dong da social-democracia lusitana, porque o senhor já morreu, acredito que assassinado. No CDS fazem o mesmo com Adelino Amaro da Costa, grande referência funerária do passado perdido, e não convirá esquecer que houve quem se tenha apressado a tirar a fotografia do Prof. Freitas do Amaral. A tendência para a asneirada é universal.

O Dr. Passos Coelho não pretenderá ser o Xi Jinping, com pensamento equiparado a lei, da Nova Direita Portuguesa. Nem vale a pena estar a suspirar pelo regresso do desejado. Voltará se quiser, quando quiser e como quiser. Tem estatuto, idade e autoridade para o fazer.

O Dr. Rui Rio fez o que pôde. Esforçou-se e deu tudo o que tinha. Na minha opinião, volto a dizer, não merecia perder, mas era óbvio que não poderia ganhar.

Já se escreveu muito sobre a sociologia do voto e as mudanças de última hora nos quadrados em que se puseram as cruzes. Mas não há como ignorar algumas realidades. O Dr. Rui Rio poderá ter sido beneficiado pelo seu “estilo”, que não aprecio, mas a “forma”, o embrulho e o laço, liquidaram as suas aspirações a PM. Tem um excesso de informalidade, uma postura desafiante que está entre o arrogante e o desrespeitoso, uma forma de se apresentar em arruaça continuada, uma certa falta de polimento no estar, uma soberba incontida que serviu para cativar uma parte do eleitorado mas não chegou para ganhar. Entre piadas sem graça, um alemão insondável e o provinciano “ódio” a Lisboa, nem o charme de uma “esquerda à esquerda” do PS lhe serviu para convencer indecisos. Seria melhor PM do que António Costa? Sem dúvida. O Dr. Rui Rio tem convicções, é honesto, muito trabalhador e até tem o defeito de ser menos “político”. Só que… há horas em que exagera na aparência de displicência e a necessidade de “killer instinct” em campanha eleitoral não se compadece com improvisações e decisões “ad hoc”, nem com usos não profissionais das redes sociais.

Mas Rui Rio é história e deverá ser respeitado e nunca apagado. O PSD tem muito a aprender com o Dr. Rui Rio e nem tudo foram erros, longe disso. A partir do que tem, assumindo que é o segundo maior partido em Portugal, afastando qualquer ideia de que poderá estar moribundo, precisa de se transformar e recuperar quase meio milhão de votos. O PSD precisa de uma gentrificação intelectual, tem de rever o seu lado “pimba” e recuperar consolidação urbana junto daqueles que habitualmente decidem quem ganha eleições. Com ideias, com pessoas, com tudo e todos, numa demografia eleitoral que muda em cada ciclo eleitoral.

O próximo líder? Sei lá, não sabemos. Mas temos de saber. Há que parar de adivinhar. Portugal precisa de conhecer quem será o próximo rosto do PSD e candidato a próximo PM. O PSD tem gente capaz, conhecida e desconhecida, para assumir e conduzir um projeto de oposição que possa ser ganhador nas próximas eleições autárquicas e legislativas. O após Costa não poderá ser do PS. E, adianto-me, o após Marcelo não poderá ser de uma “nova” esquerda, nem do que a “direita” Presidencial tem sido. Não é cedo para começarem a pensar nisso, mesmo que vão dizendo o contrário. A vitória começa na preparação.

Muitos dirão que não tenho o direito de me meter na vida de partidos em que não milito, mas o PSD é demasiado importante para Portugal. É um tema de cidadania. Há uns anos, mordaz como devia ser, o saudoso Vasco Pulido Valente escrevia, a propósito do PSD: “Esta mania de “ganhar” instalou-se no partido com o adorável Cavaco Silva em meados dos anos 80. Mas não passa de uma gabarolice”. Não é verdade que tenha de ser mesmo assim. Não é uma profecia.

PS – A Iniciativa Liberal (IL) querer sentar-se ao “centro” da Assembleia da República, à esquerda do PSD, é só uma parvoíce. Esse desvario posicional mostra incerteza política e ideológica, falta de convicção do partido com o programa económico mais à direita em Portugal. Parece que têm vergonha de ser o que o eleitorado julga que eles seriam. A IL ao centro é uma caricatura do partido que conseguiu, com mérito, angariar oito deputados que não terão sido eleitos com a expetativa de serem centristas. É um engano para quem votou IL. Percebe-se que queiram mostrar-se progressistas, são, e com preocupações sociais que terão à sua maneira, longe da minha e das minhas ideias de como resolvê-las. Convergimos, como é comum no espaço à direita do PS, com a noção de que só com a criação de riqueza e o fim da dependência dos subsídios haverá mais justiça no acesso aos recursos de bem-estar. Divergimos nos conceitos de distribuição de riqueza e de proteção dos menos “capazes”. Não votei IL  mas estava convencido que se sentariam na AR para fazer diferença mais útil. Pois bem, sentem-se onde quiserem centrar-se que o PSD agradece.