Existe apenas um mundo para os (teus) nossos netos
Steven Braekeveldt, CEO Grupo AGEAS Portugal
Por um lado, é muito positivo testemunhar a crescente consciencialização entre os CEO’s, em Portugal, relativamente ao apelo urgente para se preocuparem com as pessoas, o planeta e os lucros de uma forma equilibrada e respeitosa.
Por outro, é triste constatar a ignorância de ainda demasiados CEO’s que dirigem as suas empresas como se a Terra tivesse recursos ilimitados e como se os seus colaboradores fossem um meio para maximizar os lucros.
O desaparecimento de muitos costumes tradicionais, combinado com um mundo em constante mudança, aumenta a responsabilidade do empregador de cuidar de todos (clientes, colaboradores, parceiros, fornecedores, pacientes,…) de uma nova forma. Apesar de existirem ainda muitos gestores que querem manter e defender os valores antigos, a mudança pela qual estamos a passar é tão grande, que não é possível manter esses valores anacrónicos por mais tempo.
O facto de Portugal ser líder na Europa em burnouts e depressões é apenas a ponta do iceberg, sendo assim evidente uma mudança na gestão que se tem revelado demasiado lenta.
Os CEO’s devem reinventar os seus negócios e torná-los mais resilientes com princípios regeneradores, ao invés de continuarem com a cultura dos Doutores ou Engenheiros. Estamos a assistir a uma sociedade em rápida evolução, onde o cuidado combinado com os lucros deveria estar no centro da tomada de decisões.
Vamos deixar muito claro que gerir com um princípio de cuidado não é sinónimo de liderar uma empresa de forma “suave ou sentimental”. Não. Os lucros devem aumentar, ao mesmo tempo que se cuida. Os lucros podem aumentar ao mesmo tempo que se incorporam princípios regenerativos. Os lucros podem aumentar, enquanto se disponibilizam mais produtos e se incluem mais pessoas. Os lucros podem aumentar ao mesmo tempo que se reinventam medidas simples para gerar uma maior resiliência dentro de uma empresa.
Este é um alerta para todos: para os mais velhos, ou mais jovens, de direita, de esquerda, religiosos, agnósticos, ativos, reformados,…
Existe apenas um mundo para os (teus) nossos netos.
As empresas existem para servir as sociedade em que operam
Sofia Santos, Professora de Finanças no ISEG
A maioria de nós aprendeu na universidade que o dever dos Administradores era maximizar o lucro do acionista. O principal dever era o de cuidar dos interesses de quem investia na empresa. E isso não tem mal nenhum, desde que essa maximização não fosse a todo o custo e apenas focada no curto prazo.
O tempo foi passando, várias teorias diferentes da “teoria do acionista” foram surgindo, mas pouca mudança ocorria, o que pode ser consubstanciado pela crescente pegada ecológica que foi criada no planeta e pelo aumento das desigualdades à escala mundial. Entretanto, nos anos 90 surgiu a Teoria da Gestão Humanista que defende que as empresas existem para servir as sociedade em que operam e para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos. Esta abordagem levaria a colaboradores envolvidos, clientes leais, sociedade civil colaborativa e investidores orientados para o longo prazo.
Esta teoria parece estar a ganhar terreno ao nível da regulação europeia, uma vez que a recente proposta de diretiva de Due Diligence de Sustentabilidade Corporativa vai obrigar as grandes empresas a identificar os impactes negativos reais e potenciais e, quando necessário, deverão prevenir, terminar ou mitigar os seus impactes negativos ao nível dos direitos humanos e do ambiente. Reconhece que os Administradores, ao cumprir com o seu dever de agir no melhor interesse da empresa, devem ter em conta os direitos humanos, as alterações climáticas e as consequências ambientais das suas decisões.
O dever de cuidar dos Administradores está assim a tornar-se mais amplo, abrangendo agora também os stakeholders existentes ao longo da sua cadeia de valor. Um desafio que requer uma visão para “além do lucro de curto prazo” e uma consciência em querer deixar uma marca positiva no mundo que nos acolhe.