O novo Governo toma posse amanhã. A partir de amanhã, o país retoma a normalidade depois de uma crise que deixou o anterior Governo com poderes limitados desde meados de outubro de 2021. Foram cinco meses de pousio, com muitas decisões adiadas que deixaram o país tecnicamente parado, numa altura em que o mundo se virou de pernas para o ar.

Se este foi o preço a pagar pela precipitação de uma crise política, esperava-se que, ao menos, os resultados eleitorais confortáveis fossem o mote para termos um Governo capaz de marcar uma nova fase para o país.

Não vou fazer considerações sobre as mudanças de nomes e de estrutura do Governo. Como é muitas vezes repetido nestas ocasiões, é preciso abrir o melão para perceber o que vem lá dentro.

Prefiro falar sobre os melões abertos e que já sabemos que estão estragados. João Costa e Marta Temido são os embaixadores da defunta geringonça que se mantêm vivos neste Governo. Ficámos assim a saber que não há nada de bom a esperar em dois setores fundamentais para o futuro do país. Talvez a opção de António Costa seja estratégica. Os partidos à sua esquerda ficaram gravemente feridos, mas ainda estão vivos. É sabido que o PCP só tem uma estratégia para recuperar algum eleitorado: voltar à rua e ao protesto. Provavelmente é esta a razão por que o Primeiro-ministro decidiu manter na educação e na saúde dois ministros que provaram nos últimos anos pôr a ideologia à frente do interesse das pessoas. Pelo menos satisfazem-se os sindicatos, diminuindo a margem para a contestação.

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Há quem diga que Marta Temido provou a sua competência na gestão da pandemia. É uma avaliação que não resiste à análise dos factos ao longo destes quase dois anos. É certo que a memória é curta e que, em momentos de aflição, as pessoas tendem a valorizar quem está. Mas não podemos esquecer que, ao longo deste tempo, a ministra da Saúde tudo fez para aproveitar a crise pandémica para afastar e denegrir o setor privado e social. A realidade obrigou-a a arrepiar caminho, mas a sua obstinação ideológica contribuiu e muito para agravar a situação de emergência que se vivia no país. Tivesse sido outra a estratégia, concertando todos os meios disponíveis no setor da saúde, e, estou convencida, a contabilidade negra da Covid-19 teria sido diferente. Foram motivos ideológicos que comandaram as decisões políticas de Marta Temido. Os mesmos que presidirão às decisões que irá tomar para fazer face a um Serviço Nacional de Saúde exangue e a precisar de reformas profundas. Desconfio que o piquinho a azedo deste melão vai causar uma profunda intoxicação aos portugueses.

João Costa foi o ministro sombra que acabou com os contratos de associação que permitiam a milhares de alunos por esse país fora usufruírem de um ensino de qualidade fossem quais fossem as suas possibilidades financeiras. Foi também o ministro sombra que, até hoje, defendeu uma punição exemplar a dois alunos de excelência que ousaram desafiar o Estado na sua tentativa de doutrinação aos alunos. O novo ministro, que antes de ser já o era, traz ainda às costas a situação de caos em que se encontram as escolas, a braços com uma crise de falta de professores a que se junta o laxismo e a incompetência na gestão dos docentes existentes: concursos vazios, baixas fraudulentas não fiscalizadas, falta de avaliação, prioridade aos sindicatos em detrimento dos alunos. A este brilhante currículo junta-se ainda uma trágica gestão das escolas durante a pandemia, que agravou as desigualdades e deixou insuficiências graves na aprendizagem de milhares de alunos. João Costa deve achar que esta promoção é merecida pelos serviços prestados. Nós ficamos com a certeza de que, se já tínhamos um problema grave com a educação dos nossos filhos, daqui para a frente as coisas só podem piorar.

É pena que António Costa não aproveite a circunstância histórica desta maioria absoluta para fazer a diferença. Não basta mudar a orgânica do Governo ou garantir a paridade nos nomes escolhidos. Isso dá títulos de jornal nos primeiros dias, mas não garante o futuro do país. A saúde e a educação são setores importantes demais para continuarem cativos de uma geringonça de má memória que julgávamos ter ficado morta e enterrada no dia 30 de janeiro. Ou será que não?