Que António Costa sempre quis ser primeiro-ministro já todos sabemos. Que o diga aliás António José Seguro. Que António Costa o quer ser independentemente da vontade dos eleitores e à margem dos resultados eleitorais de 4 de Outubro ficámos a saber. Com a direita, ou com a esquerda à esquerda do Partido Socialista, não importa. O que é realmente importante é que António Costa seja primeiro-ministro.
Nos últimos dias ficámos a conhecer melhor António Costa. Hoje, assemelha-se mais a uma plebeia endinheirada que sempre quis ser princesa, nem que para isso tenha que forçar um casamento real engravidando do príncipe herdeiro e do irmão mais novo deste, do que de um líder do Partido Socialista.
Não vou perder muito tempo a discutir a legitimidade política de um Governo de esquerdas, ou de um Governo que tem como oposição o indiscutível vencedor das eleições legislativas, porque me parece um raciocínio demasiado óbvio. A questão aliás é mais de matemática e menos de política: quem venceu as eleições deve governar, quem perdeu deve assumir o seu lugar de oposição.
Mas, façamos um exercício diferente: imaginemos que um Governo de esquerdas seria empossado pelo Presidente da República, que o seu programa até seria aprovado na Assembleia da República e que o Orçamento Geral do Estado para 2016 também passaria no voto dos deputados.
Definido o círculo, vamos tentar preenchê-lo com um quadrado: Portugal comprometia-se a cumprir o Tratado Orçamental e todas as regras inerentes à presença do País na moeda única. Mais uma vez, a questão é mais de matemática, ou melhor, de geometria, e menos de política.
Posto isto, surgem várias perguntas: como é que é possível cumprir o programa eleitoral do Partido Socialista, conhecendo à partida de todas circunstâncias inerentes à pertença à zona Euro? Como é que possível cumprir o programa eleitoral do Partido Socialista, combinado com o do Bloco de Esquerda e o da CDU e ao mesmo tempo manter o déficit abaixo dos 3%? Como é que é possível aumentar brutalmente a despesa com certas funções do Estado Social, nomeadamente com salários na função pública, e ao mesmo tempo reduzir a receita fiscal e com a segurança social, e mesmo assim cumprir as metas orçamentais e as regras previstas e assinadas por Portugal no Tratado Orçamental?
Obviamente António Costa, uma espécie de diva política, não perderá tempo a responder a tão chatas e técnicas perguntas. Estas questões, menores, são para os contabilistas como Pedro Passos Coelho, gente sem uma “visão de futuro”. António Costa é um político mais preocupado com os grandes temas do milénio como a fome, a miséria, a emigração e o desemprego. Ora, mais uma vez António Costa enfrenta a maldita da matemática e percebe que não basta gritar chavões que os problemas desaparecem. É preciso liquidez.
Como? Eu explico. Caso o sonhador António Costa até conseguisse chegar a São Bento como é que conseguiria pôr em prática o seu programa, em conjunto (ou não), com as esquerdas à sua esquerda, ou seja, como é que o líder socialista conseguiria liquidez para que o seu Governo tivesse Euros suficientes para acabar em toda a linha com a austeridade?
As respostas são três: primeiro poderia nacionalizar vários sectores da economia como a banca, a energia ou as telecomunicações; segundo, poderia recorrer aos mercados para se poder financiar; terceiro, poderia aumentar os impostos, coisa que entretanto já disse que não iria fazer.
Na primeira alternativa Portugal passaria para o grupo das economias menos abertas e menos desenvolvidas do mundo, e automaticamente eliminaria a segunda alternativa, ou seja, a possibilidade de financiamento junto dos mercados financeiros. António Costa já disse que não iria por aqui, uma vez que pretende cumprir as regras europeias do mercado interno e da economia de mercado.
No segundo cenário, Portugal teria que manter o caminho da redução da despesa, e esperar que os juros da dívida, ou seja, que os custos de financiamento do Estado português se mantivessem em níveis aceitáveis como ainda estão. Sabendo que António Costa pretende aumentar a despesa e reduzir a receita, parece-me óbvio que os juros vão disparar e que Portugal também não poderá ir por aqui por falta de capacidade financeira.
Ora, resta-nos uma última hipótese, por sinal a mais fácil: aumentar os impostos sobre as famílias e as empresas. Contudo, António Costa também já disse que não o iria por aqui.
Perante este labirinto criado pelo Partido Socialista impõe-se que perguntemos de novo, como é que António Costa, coligado ou não, conseguirá cumprir um programa de esquerda, ou um programa “patriótico e de esquerda”, se todas as formas que o Estado tem para se financiar se esgotaram.
Mais uma vez a matemática responde: estamos perante uma equação impossível e só o Partido Socialista, cego e faminto de poder, é que ainda não percebeu isso.
Jurista/fiscalista, tem 26 anos e vive e trabalha em Londres