O Manuel Acácio surpreendeu-me esta manhã, desafiando-me para falar no Fórum da TSF sobre José Sócrates. “É bom ou mau que o debate político esteja centrado em torno dele?”, perguntava-me. Passei uns minutos largos a pensar no que lhe diria, mas agora que pensei e lhe contei, achei por bem vir explicar porque acho que sim, que é bom.

José Sócrates, em si mesmo, não é uma questão, nem sequer acho que seja o político que estejamos a discutir. Ainda bem: o que é realmente importante (e não um sintoma da pobreza do debate público, como ouvi esta manhã) é falarmos das políticas escolhidas por José Sócrates na resposta à crise financeira, das políticas de José Sócrates para mudar a estrutura da economia portuguesa.

E é importante porquê? Porque quando chegarmos a 2015 os portugueses devem ter uma opinião formada sobre uma escolha fundamental: para a legislatura que se segue, devemos seguir uma política prudente, tendo em conta o tamanho da nossa dívida pública, a enorme incerteza na zona euro, os problemas (ainda) estruturais da nossa economia? Ou devemos optar por uma política mais expansionista, com um Estado mais interventivo, com pressão sobre a Europa para abrir espaço a eventuais soluções comunitárias?

É por isso que muitos perguntam hoje o que pensa António Costa sobre o que fez José Sócrates. E também aqui há novidades recentes que merecem atenção.

  1. António Costa é, diga-se em seu favor, bastante mais claro do que foi o seu antecessor sobre este tema. De Seguro, descobrimos apenas três anos depois que era muito crítico do que fez Sócrates naqueles anos finais. Foi pena, porque teríamos percebido melhor ao que vinha.
  2. Costa disse já que Sócrates errou, por exemplo, insistindo nas grandes obras, também na “autossuficiência” e ausência de compromissos políticos. Mas nestes últimos dias o novo PS deu-nos dois elementos novos que merecem reflexão: um discurso de Ferro Rodrigues sobre o esforço do ex-primeiro-ministro para evitar o resgate; e a moção do próprio Costa, que elogia a política expansionista seguida de 2008 a 2010, criticando a seguida por Passos Coelho desde então.
  3. Ferro primeiro: é verdade – e justo dizer – que Sócrates fez tudo para evitar o resgate, mas essa é uma falsa questão. A real e que importa rever é se, antes disso, Sócrates aplicou as políticas certas, e na justa medida, tendo em conta as circunstâncias e possibilidades do país. E isto é determinante, porque em 2015 vamos ter ainda mais limitações do que tínhamos naquela altura.
  4. Agora Costa: dizer que as políticas expansionistas foram boas e que as de Passos foram péssimas é, no mínimo, um risco político. É um erro pelo menos de subavaliação: as que foram aplicadas por Passos Coelho tiveram a enorme limitação criada pelo resgate que chegou em 2011. Elas não podem ser avaliadas sem o contexto – embora a medida deva, depois, ser discutida.

É por tudo isto que é importante que troquemos umas palavras sobre as políticas de Sócrates, sobretudo agora e durante o longo ano de 2015. Não tenho dúvidas de que assim o faremos, coletivamente, até que António Costa cumpra a sua promessa de apresentar uma estratégia orçamental para a legislatura que se segue. Depois disso, será a vez de discutirmos as políticas dele. Mas sempre a olhar para o retrovisor, para irmos escolhendo o nosso caminho conscientes do que já percorremos até aqui.

P.S. Um acrescento: à atual maioria não bastará fazer uma campanha a falar de Sócrates. Como, e bem, dizia o Pedro Adão e Silva no Fórum da TSF, falar do passado sem apresentar um plano de futuro só serve de estratégia para evitar uma derrota maior. Essa é a outra parte da discussão que devemos ter: as políticas de Passos – as de hoje e as de amanhã.

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