No atual contexto educacional, a formação contínua de professores não é apenas uma recomendação, mas uma necessidade urgente para o desenvolvimento das competências digitais que o século XXI exige. As tecnologias digitais deixaram de ser meros recursos de apoio nas salas de aula; tornaram-se elementos transformadores, capazes de redefinir o processo de ensino-aprendizagem. Neste novo cenário, é essencial que os educadores não só dominem esses recursos, mas também que os utilizem de maneira crítica e criativa, transformando as suas aulas em espaços mais interativos, inclusivos e inovadores. Nesse sentido, há que não descurar a sua integração também no processo de formação inicial de professores: apesar de os jovens futuros docentes viverem imersos numa cultura digital, é necessário prepararem-se para um uso pedagógico desses recursos.
Quando falamos de integrar tecnologia na educação, não nos referimos apenas a aprender a manusear diferentes aplicativos. O verdadeiro desafio está em compreender o potencial pedagógico desses recursos e aplicá-los de forma que atendam às necessidades de um mundo em constante mudança. Pensar como a pedagogia pode ser potenciada pela tecnologia, e não o inverso. Por exemplo, numa aula de história, em vez de simplesmente usar um monitor/projetor para exibir um recurso audiovisual, um professor pode utilizar realidade virtual ou aumentada para levar os seus alunos numa “viagem” virtual às antigas civilizações. Imagine a imersão e o entusiasmo que essa experiência poderia gerar e que, aliada a uma planificação integrada nos documentos normativos em vigor, poderá auxiliar os alunos na construção efetiva de conhecimento. Tendo em conta a interação constante entre humanos e não humanos, está nas mãos do professor a exploração pedagógica de todo o potencial que um recurso destes pode ter.
Para responder às novas exigências, seria/é necessário um plano de formação inicial e contínua para professores focado no desenvolvimento de competências pedagógico-digitais. O objetivo deste plano é preparar os docentes para o uso crítico e inovador das tecnologias, assegurando que elas são integradas de maneira eficaz às práticas pedagógicas. Agir assim, além de melhorar a qualidade do processo de ensino e aprendizagem, contribui para alinhar a educação às necessidades da era digital, onde a literacia digital é tão importante quanto a alfabetização tradicional.
A integração da inteligência artificial (IA) nos contextos educativos, tanto formais como não-formais, exige uma reavaliação urgente das metodologias pedagógicas e do papel dos educadores na era digital. A rápida evolução da IA nos últimos anos apresenta desafios consideráveis, especialmente para comunidades mais vulneráveis, destacando a necessidade de garantir que os professores estejam adequadamente preparados para utilizar estas tecnologias de forma eficaz e crítica.
Pensemos em três Domínios de Competências Pedagógico-Digitais. Para garantir uma formação completa, o plano abrangeria três domínios principais de competências: pedagógicas, tecnológicas e de cidadania digital. No âmbito das competências pedagógicas, estas centrar-se-iam na aplicação de metodologias inovadoras assentes em princípios construtivistas. Um bom exemplo é a aprendizagem baseada em projetos (ABP), onde os alunos são desafiados a resolver problemas reais com o apoio de recursos digitais. Imagine-se uma turma de ciências desenvolvendo um projeto de sustentabilidade, utilizando softwares de simulação para planear uma horta escolar inteligente. Ou, por exemplo, o uso de inteligência artificial (IA) para personalizar o ensino: professores podendo recorrer a plataformas como o Smartick (embora em matéria de tecnologia possa ser considerada “antiga”), que ajusta automaticamente a dificuldade das atividades de matemática de acordo com o desempenho de cada aluno.
Ao desenvolver estas competências pedagógicas, integra-se naturalmente o processo de aprendizagem no que às competências pedagógicas diz respeito. Enquanto o professor aprofunda os seus conhecimentos pedagógicos, aprende a pensar as suas estratégias de ensino com exemplos de recursos digitais. Nesse processo, aprofunda as suas competências tecnológicas e aprende a dominar diferentes recursos digitais, desde plataformas de ensino online e recursos específicos para educação (o potencial do Google Classroom e o Microsoft Teams está muito para além do uso que atualmente lhe é dado no contexto escolar) até ao software social que pode adaptar ao contexto escolar (regressando à IA, porque não interagir com uma IA generativa e explorar o contributo que estas podem dar no desenvolvimento do conhecimento?).
O terceiro domínio, as competências de cidadania digital, abordaria temas essenciais como ética digital, privacidade e o impacto social das tecnologias (a própria utilização da referida IA pode servir um propósito tanto científico como ético). A segurança online, por exemplo, tornou-se um tema central. Numa sociedade onde as redes sociais e a internet estão cada vez mais presentes, é fundamental que os professores sejam capazes de orientar os seus alunos a navegar de forma responsável, promovendo discussões sobre ciberbullying ou a importância de proteger dados pessoais.
No final das contas, o grande objetivo formativo tem de assentar na transformação dos professores em facilitadores da aprendizagem digital, capacitando-os para utilizar as tecnologias de forma crítica e criativa (tanto analógicas como digitais). A educação, no tempo presente, exige um novo tipo de professor: aquele que domina pedagogicamente os recursos digitais e os integra de forma inteligente e sensível às necessidades dos alunos.
É necessário promover um diálogo constante entre educadores, decisores políticos e a sociedade sobre as implicações éticas e sociais do uso da IA no ensino. Esse debate público permitirá moldar políticas que garantam a utilização responsável e equitativa da tecnologia, de modo que os seus benefícios sejam amplamente partilhados. A participação ativa de professores e decisores na criação de uma estrutura pedagógica que incorpore a IA de forma ética e inclusiva é vital para assegurar que a educação digital evolua em benefício de todos os estudantes e da sociedade em geral.
Ao investir na formação tanto inicial como contínua dos educadores, baseada em metodologias pedagógicas inovadoras, diversificadas e construtivistas, estamos a preparar o terreno para enfrentar os desafios da educação do futuro. Mais do que nunca, a sala de aula (como referiu já a UNESCO, em 2021: natural, construída e digital) pode e deve ser um ecossistema dinâmico, onde os alunos não são apenas recetores de informações, mas participantes ativos na construção do seu próprio conhecimento. A reinvenção pedagógica na era digital exige uma reflexão constante sobre como equilibrar as vantagens tecnológicas com as necessidades humanas e pedagógicas. E para que isso aconteça, o papel do professor continua em transformação (a história tem mostrado isso mesmo). Mais do que nunca, a educação precisa de se reinventar; o papel do professor foi, é e será central nesta transformação.